sábado, 25 de dezembro de 2010

Noite de Natal


O Natal
Odylo Costa, filho

Na palha já velhas
do antigo curral
nasce o Deus menino.
E o reino animal,

seguindo os pastores,
logo se movia
para ver Jesus,
José e Maria.

E os anjos cantavam
por vales e céus
a paz entre os homens
e a glória de Deus:

alegria eterna,
sempre renovada,
notícia perene,
noite iluminada.

(Poesia Completa. Rio de Janeiro : Aeroplano : Fundação Biblioteca Nacional, 2010, p. 341)

FELIZ NATAL A TODOS!

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Noites de um Verão Qualquer, Skank



NOITES DE UM VERÃO QUALQUER
Composição: Samuel Rosa/César Mauricio

Noites de um verão qualquer
Eu me sufoco nesse ar
O corpo venta em preto
O chão devora o espaço ocular

Noites de um verão qualquer
Deixa que ela entenda o traço
Que invente a fuga por nós dois
Que sou seus pés, eu sou também seus braços

Noites de um verão qualquer
Dentro da febre desse abraço
Satélite voltou do céu
Eu sou o resto, sou também o aço

Noites de um verão qualquer
Sob sua pele encontrei abrigo
Pra gente se devorar
Na órbita do seu umbigo

Seguem infinitos metros
Pra perto desse abraço
Eu tento respirar
Desdar o nó que aperta esse laço

Noites de um verão qualquer
Deixa que ela entenda o traço
Que invente a fuga por nós dois
Que sou seus pés, eu sou também seus braços

* * * * *

Começando o verão no clima da estação. Calor, preguiça e um convite a tardes lentas numa rede. Momentos de luz e muito sol. Noites que demoram a chegar e premiam o astro rei com todo seu esplendor. A música é só um pouco da trilha sonora para aqueles momentos de final de tarde. O clipe oficial está disponível aqui.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Crônica: Dia de chuva



DIA DE CHUVA


A chuva contínua, desde a noite do dia anterior, fez com que seu dia começasse de forma pouco interessante. Consumido pela rotina, cansado pelas longas horas das últimas semanas – o que era típico no final de ano -,  amuado pela cobrança no trabalho e pelo aperto de tempo diante dos prazos e metas, a terça-feira começara pouco promissora. Mecanicamente cumpriu o ritual matutino. O rosto espelhava a falta de ânimo; os gestos se arrastavam em câmara lenta; as palavras escapavam-lhe da boca, quase que derramadas, sem qualquer firmeza e contundência. Só em pensar no trânsito daquela manhã, a vontade de  ficar em casa lhe tentou.  

Estoicamente, pensando unicamente no dever, deu início à sua jornada. Não havia motivo real ou concreto para sentir a tristeza lhe dominar. Lembrou das palavras da mãe que costumava dizer que “fulano está triste como dia de chuva”. Dias de chuva eram tristes, macambúzios, sombrios. O tilintar dos pingos não lhe diziam nada, não embutiam a poesia vislumbrada por poetas, nem indicavam um desejo de aconchego no lar ou num cantinho quente e iluminado.  Tolerava os dias de chuva, mas não os queria bem.

A chuva foi o cenário do seu trajeto até o trabalho. Dia cinza de trânsito lento e congestionado. Porém, o calor dera uma trégua e não precisou ligar o ar condicionado do carro, algo pouco usual para o mês de dezembro. Enfim, preferia o sol.

Passou pela portaria do prédio para pegar o jornal e recebeu um envelope pardo do tamanho de meia folha de papel. Pensou ser alguma encomenda de alguém do escritório, mas ao ver seu nome escrito e identificar o remetente, rapidamente seu semblante se transformou. Abriu cuidadosamente o envelope enquanto caminhava pelo hall do prédio, quase tropeçando no cinzeiro perto da porta do elevador. Era um livro! Um livro de poesias e uma pequena mensagem. Leu e releu a mensagem, detendo-se sobre o nome que assinava aquele gesto carinhoso.

O silêncio matutino foi quebrado som de sua voz  agradecendo em voz alta. Falava sozinho. Mesmo sabendo da distância, ele agradeceu com empolgação. Folheou o livro. Deteve-se em um e outro poema. Depois mais um e mais outro. Aquele pequeno envelope pardo havia trazido o sol de que tanto precisava. O sol que sempre se apresentava nestes momentos e que mais uma vez havia espantado a chuva interior.


quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Alfinetadas de Monteiro Lobato

"Fazia dois meses que o governo se preocupava seriamente com o caso do rinoceronte fugido, havendo organizado o belo Departamento Nacional de Caça ao Rinoceronte, com um importante chefe geral do serviço, que ganhava tres contos por mês e mais doze auxiliares com um conto e seiscentos cada um, afora grande numero de datilografas e "encostados". Essa gente perderia o emprego se o animal fosse encontrado, de modo que o telegrama de dona Benta os aborreceu bastante. Em todo caso, como outros telegramas recebidos de outros pontos do país haviam dado pistas falsas, tinham esperança de que o mesmo acontecesse com o telegrama de dona Benta. Por isso vieram. Se tivessem certeza de que o rinoceronte estava mesmo lá, não vê que vinham!"
(Monteiro Lobato. Caçadas de Pedrinho. 2a. ed. São Paulo : Brasiliense, 1950, p. 84. A transcrição respeitou a grafia original da edição consultada.)

Volto ao livro que queriam censurar. De fato este trecho traz um ranço preconceituoso, pois Monteiro Lobato não mede palavras para criticar o funcionário público "encostado", aquele que tradicionalmente pendurava o paletó na cadeira apenas para marcar presença, mas trabalhar que é bom...

A crítica é direta e atual. Basta olhar os jornais de hoje que tratam do fantasioso PAC, do Ministério da Pesca e sua futura titular, a Senadora - futura desempregada - Ideli Salvati (juntamente com Aloizio Mercadante), do dia de ontem, quando o Judiciário brasileiro parou para comemorar o dia da Justiça, e por aí seguimos.

Aliás, acho que o Poder Judiciário não trabalha um mês do ano sem ter um feriado, uma folga ou um ponto facultativo. Janeiro ainda é recesso ou férias forenses; fevereiro ou março tem carnaval; abril tem Páscoa; maio traz o dia do trabalho; junho comemora-se o Corpus Christi; julho, no Estado de São Paulo, para no dia 9 para comemorar a Revolução Constitucionalista; setembro tem a Proclamação da Independência; outubro o dia da padroeira do Brasil; novembro tem finados, Proclamação da República e o dia da consciência negra; dezembro - ufa, cansado de tanto dia para descanso - traz o dia da justiça (8 de dezembro) e o início do recesso, Natal, Ano Novo etc.  E ainda tem o dia do funcionário público que não me lembro quando é. 

Só agosto escapa! O único mês do ano em que não há uma folguinha para juízes, promotores, cartorários e todos os outros com suas jornadas de trabalho de 6 horas, diferente de todos os outros mortais que trabalham 8 horas diárias.

E os juízes e promotores queriam 60 (SESSENTA!!!!) dias de férias por ano, como está sendo discutido no Congresso Nacional! 

Monteiro Lobato tinha razão: emprego público é uma beleza!

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A manchete enganosa e a educação

Foram divulgados os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, em inglês). O exame é realizado a cada três anos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e mede o desempenho de alunos em leitura, matemática e ciências.

O melhor desempenho do Brasil foi em leitura e ficamos na 52a. colocação dentre os 65 países avaliados. Um resultado pífio, vergonhoso. Os dados completos estão disponíveis no Estadão e na Veja. Prestem atenção na classificação por notas e vejam que há países latinoamericanos acima do Brasil na lista.

Mas se algum desavisado lesse a notícia no site do Estadão hoje pela manhã, lá por volta das 7:30 horas,  deveria ficar de pé, cantar o hino nacional, soltar fogos de artifício, ligar para o Palácio do Planalto para parabenizar o presidente, bradar com alegria que é brasileiro com muito orgulho, que temos do que nos ufanar...bem, esta palavra talvez não seja compreendida pelos alunos brasilieiros que fizeram a prova. 

A manchete do Estadão era algo do tipo "Brasil é um dos países que teve melhor desempenho no Pisa". Foi alterada por "Brasil melhora em avaliação internacional, mas continua um dos piores do mundo." Não se trata de torcer contra; trata-se de exigir que o jornal retrate na manchete o que vem no texto abaixo, sem ilusões,  sem enganar o leitor e sem o caráter panfletário ufanista.

A chamada no site da Veja era mais comedida: "Desempenho de alunos brasileiros está bem abaixo do ideal."

Curioso como um jornal deste nível comete um erro tão básico. Aliás, isto tem se repetido com vários meios de comunicação impressos. Basta um pouco de atenção, um olhar mais crítico. Por que isto? Porque quem escreve é produto de má qualidade da educação brasileira.

O Brasil precisa melhorar muito no quesito educação. Nas últimas eleições, ninguém tratou do assunto. Os dois partidos deixaram a desejar neste ponto. O Brasil só não piora porque há milhares de heróis por este país que se esforçam dia e noite para educar e ensinar. Devemos nos orgulhar dos professores apaixonados pela tarefa de educar. 

Quanto ao governo e ao Ministério da Educação, é hora de fazer uma profunda avaliação crítica de como o dinheiro é gasto. Talvez seria o caso de mandar o Ministro Fernando Haddad de volta para a escola.


quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Epígrafe - VI

"Costume dizer que o sentido da vida é o outro. Tudo o que a gente faz é para o outro. Vamos sumir. O que vai restar de nós estará no outro. Se sou um escritor, é a minha obra que o outro vai ter e passar adiante. A lembrança, os afetos, é no outro que sobrevivemos."

Ferreira Gullar (Pessoa - Revista de literatura lusófona, Ano I, Número 1, out/dez 2010, p. 14)

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Poesia: SAUDADE


SAUDADE


A saudade é uma chama
Pode ser fraca, quase invisível
Que queima ao se aproximar
Uma chama imperceptível, por vezes
Adormecida sob as cinzas de um braseiro
Quase desfalecida
Esmaecida
Que ruboriza ao sopro sutil da brisa da memória
Incandescente
Volta a bruxulear e ganha vigor
Arde e queima intensamente

A saudade não deixa que se olvide
Não deixa que a chama apague
Incendeia a memória
Aquece a alma de forma inexplicável
Revigora os sentidos
E dança no silêncio
E ilumina a escuridão.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Cidadãos amedrontados

Terça-feira, meio da manhã, semáforo da Alameda Lorena com Av. 9 de Julho, bairro dos Jardins em São Paulo. Parado no trânsito um homem aguarda dentro de um carro. Despertado da distração por uma pancada forte e certeira no vidro do motorista. Repara num homem de terno, que abre o paletó e lhe mostra um revólver. Faz um gesto para que abra o vidro e entregue o que tem: carteira, relógio, celular, pasta. Poucas palavras são trocadas. As ordens são seguidas. O homem sai andando calmamente no sentido contrário ao fluxo de veículos. O motorista, atônito e nervoso, estava a uma distância inferior a meio quarteirão do escritório.

Os fatos acima são reais e aconteceram com meu sócio. Não havia policiamento no local, nem nas redondezas. Ele foi à Delegacia e gastou quase a tarde inteira para fazer um BO. A delegacia fica no bairro dos Jardins, um dos mais nobres e caros de São Paulo.

A narrativa se repete em qualquer mesa de bar, em qualquer conversa de colegas de trabalho, em qualquer ambiente. A cena lastimável de violência e de insegurança espalha-se por todo o país, em menor ou maior grau. Viramos reféns da bandidagem. Ainda que o Capitão Nascimento insista em afirmar que agora o inimigo é outro, o medo é real e presente. O maior  medo do cidadão é o bandido.

Assisti cenas de bandidos armados na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro vive momentos de terror, de afronta à ordem posta, de intimidação do Estado que tenta aos poucos reconquistar seu poder sobre os cidadãos - todos os cidadãos, inclusive aqueles que ignoram a existência das leis e aqueles que parecem viver à margem da sociedade.

Não vou politizar a questão, nem tampouco defender esta ou aquela linha de pensamento. Porém, é preciso lembrar que o tema segurança pública foi debatido na campanha eleitoral. Tentaram rotular a política de segurança pública do Estado de São Paulo de frágil e ineficiente. Um candidato ao governo do Estado - e que foi derrotado no primeiro turno - insistia em relembrar a tentativa do PCC de parar São Paulo. O PCC conseguiu parar São Paulo por um dia.  E agora, Senador, algo a dizer sobre como acabar com o terror no Rio?

O que os bandidos fazem no Rio é mais grave do que o PCC fez em São Paulo. Vivenciei aqueles dias de pânico coletivo, propagado pela imprensa que se amedrontou diante de informações desencontradas. Naquele dia, em que todos foram embora do escritório com medo - e ficaram parados por horas no trânsito -, eu fiquei até mais de 20 horas trabalhando. Fui para casa sem trânsito; as ruas desertas e nem sinal de bandido ou membro do PCC. Antes de ser um ato de loucura ou coragem, foi um ato racional de preservação da vida. O raciocínio foi simples: se ficasse parado no trânsito, seria um alvo fácil para um arrastão de bandidos. No terceiro andar de um prédio comercial da Av. Paulista, estaria mais seguro. 

No dia seguinte, a Rota foi para as ruas e a cidade voltou ao normal. Bandidos morreram. Alguns talvez inocentes, mas outros não. A dúvida não favoreceu o réu. E acredito que a atitude foi justificada.

Solidarizo-me com a aflição e o medo dos cariocas. Preocupo-me com as pessoas queridas que moram no Rio e vejo cidadãos amedrontados, reféns em suas próprias casas. O direito de ir e vir é tolhido pela omissão do Estado (em todos os níveis) e ficamos enjaulados em casas, apartamentos, condomínios. É hora de agir com firmeza e tomar as medidas necessárias. 

O medo não é privilégio dos cariocas; o medo habita no seio dos paulistanos e paulistas; o medo instalou-se em todas as cidades brasileiras de porte médio e grande. Iniciei este post com um exemplo recente da cidade de São Paulo para não parecer que apontava o dedo, ou que comparava as políticas públicas de segurança. O problema é amplo e geral; o problema é uma preocupação de todos os brasileiros. O Estado precisa agir!

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Monteiro Lobato e preconceito



O Conselho Nacional de Educação recomendou ao MEC que proíba o livro Caçadas de Pedrinho, de autoria de Monteiro Lobato. A trama começou com uma denúncia formulada por um aluno de mestrado da Universidade de Brasília à Secretaria de Promoção de Igualdade Racial, ligada à Presidência. O aluno entendeu que a obra era "racista". Esta Secretaria - que mais parece um dos ministérios engendrados pelo Grande Irmão de 1984 - submeteu a acusação ao crivo dos conselheiros do CNE, e estes sugeriram que o livro fosse retirado do acervo do Programa Nacional Biblioteca na Escola.

Fazer a denúncia é uma prerrogativa de interpretação de qualquer cidadão. Até aí, admito o equívoco. Mais grave, porém, está no fato do CNE ter considerado séria a denúncia e sugerido o banimento de Monteiro Lobato de nossas escolas. Fiquei indignado quando tomei conhecimento da notícia e resolvi fazer minha própria pesquisa. 

Li a maioria das obras de Monteiro Lobato na infância. Não sou racista, nem preconceituoso e jamais  imaginei que tais obras pudessem ser consideradas como ofensivas. Confesso que estas leituras só me trazem boas memórias, de um lugar cheio de fantasia e magia. Fui atrás do livro, por sinal, o mesmo exemplar que li quando criança, capa dura verde escura, com letras em baixo relevo e prateadas, uma primorosa edição da Brasiliense, de 1950, com a ortografia estranha e recheado com algumas ilustrações.

Reli o livro no feriado e redescobri grandes passagens. A leitura foi atenta, à caça de preconceito e termos "racistas". Fiquei frustrado. Fiz uma segunda leitura atrás do trecho específico que foi identificado na denúncia, e que transcrevo abaixo para que avaliem por conta própria:

"Sim, era o unico jeito -  e tia Nastacia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão, pelo mastro de S. Pedro acima, com tal agilidade que parecia nunca ter feito outra coisa na vida senão trepar em mastros."(Caçadas de Pedrinho. São Paulo : Brasiliense, 1950, p. 55 - obs.: transcrito na ortografia original)

Há licença poética no texto. Não vejo racismo. Em outro trecho, Pedrinho exclama: "Avança, macacada!"(p. 12). Mais adiante, uma capivara reunida com o demais bichos da floresta reclama: "- Imbecil! resmungou a capivara, furiosa de tamanha asneira. Não é atôa que os macacos se parecem tanto com os homens. Só dizem bobagens." (p. 24). 

Estes exemplos revelam que o termo "macaco" não é utilizado no livro como termo pejorativo ou racista. 
Não tenho dúvidas, porém, de que o livro não passa pelo crivo do patrulhamento ideológico. Poderia ser denunciado por ambientalistas, afinal, Pedrinho e a turma do Sítio do Picapau Amarelo matam uma onça e depois domesticam um rinoceronte. O livro seria ambientalmente incorrento.

A questão que envolve a criação do Departamento de Caça ao Rinoceronte e a instalação da linha telefônica mais curta do mundo são uma crítica direta ao funcionalismo público, ao gasto público inútil e desnecessário, ao desperdício de dinheiro público. Não é à toa que o livro foi rotulado de comunista quando foi lançado. Era considerado subversivo por incitar a desobediência civil.

Claro que faço esta leitura com um olhar adulto e crítico, e esta releitura me certificou ainda mais da atualidade e importância de Monteiro Lobato. A denúncia é ridícula, preconceituosa, torta, mas um alerta para uma política estatal que busca criar divisões de classes e categorias de brasileiros, ao invés de propagar a igualdade de todos os brasileiros.

Por fim, perguntei à minha filha de 9 anos o que tinha achado do livro, pois o lera no primeiro semestre. Ela havia gostado e me contou a estória. Não houve um traço de preconceito ou aparente racismo nas palavras dela. Leu com os olhos de uma criança e ficou fascinada e divertiu-se como pretendia o escritor.    Quem vê racismo nas obras de Monteiro Lobato, não faz jus ao título de mestre em nenhuma universidade séria deste país. E um Conselho de Educação que rejeita o patrimônio literário nacional, precisa rever seus conceitos - ou as pessoas que são indicadas para o CNE. 

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Microconto - VIII

Ela dormia placidamente. Ele sonhava sorridente. Caminhos desconexos na aparente união.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Microconto - VII


Caminhava a passos largos, apressado. Tão ensimesmado, tão recluso, não teve olhos para notar o largo sorriso que a bela moça lhe oferecia, um sorriso convidativo.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Crônica: Na madrugada


NA MADRUGADA



Acordou desnorteado com a gola do pijama empapuçada de suor apesar do quarto estar fresco. Não sentia as cobertas sobre seu corpo; não conseguia racionar e situar-se. Apalpou a cama ao seu redor sem saber se estava de cabeça para baixo ou próximo da beirada. Esticou o braço direito sobre a cabeça e acertou com força a cabeceira da cama, gemendo com a dor da batida. Tateou a cabeceira numa tentativa de voltar a si. Pelo lado esquerdo a cama parecia infinita, sua mão não alcançava a borda do colchão. Esquecera-se das cobertas que estavam sobre seu corpo. Estava tomado de um sentimento de queda livre, num poço fundo e escuro, porém a queda constante assemelhava-se a de uma folha de papel, suave e pouco amedrontadora.

Suas pernas formigavam e isto lhe causou aflição. Pensou estar soterrado ou preso por algo pesado que prensava suas pernas, impedindo-o de se movimentar. Tentava mexê-las e elas não reagiam. Não se sentou na cama por medo de bater a cabeça. Olhou ao redor na noite escura, buscando uma luz, um ruído, algo que lhe trouxesse de volta a referência que perdera.

Um tímido brilho vinha de um canto do quarto. Era o relógio que estava coberto com a revista que arremessara na noite anterior e cobria as horas. Eram 4:39 da madrugada. Pedro não viu as horas.  Sem os os óculos que repousavam sobre o criado mudo, não enxergaria o número marcado no relógio. Esfregou os olhos e aos poucos voltou a sentir suas pernas. O desespero momentâneo se desfazia de forma inversamente proporcional à lucidez que recobrava.

Passou a mão pelo pescoço e limpou o suor da nuca. Empurrou o lençol e o cobertor para a ponta da cama. Ouviu quando ambos caíram no chão. Respirou aliviado. Sentou-se na cama. Mirava a escuridão sem ver nada. O sonho veio à memória de forma embaçada. Esforçou-se e as imagens ganharam contornos precisos. Repassou em detalhes aqueles momentos que havia assistido há pouco. Era ela. Havia sonhado com ela. O sorriso inesquecível estava ali, diante dele, com todos os sons, com todas as cores, com toda a vivacidade que ela tinha. Tomado por um torpor que lhe aqueceu a alma, Pedro sorriu e quis que o tempo não existisse.

Mas era só um sonho. Deitou-se novamente e chorou em silêncio.


quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Um país dividido

A eleição passou. Este post ia ser escrito antes da eleição, mas não perdeu sua atualidade e tem um olhar retrospectivo. As urnas só confirmaram o que já imaginava e pode ser visualizado no post anterior, com o mapa eleitoral que correlaciona o voto com os indices de analfabetismo. Eis aí a representação visual do que aconteceu: o país votou dividido.

Na eleição de 2006, o ponto que mais me marcou foi a forma como Lula tentou dividir o país. Lula tentou rotular Alckmin como um representante dos ricos, do sul, da elite, dos inimigos dos pobres e oprimidos. O país votou dividido.

O mesmo script foi seguido nesta eleição, porém os ânimos se acirraram com a margem menos folgada de vitória e com uma candidata fabricada em laboratório, uma espécie de versão feminine de Celso Pitta.

Acho lemantável a divisão perpetrada por Lula e pelo PT. O responsável por este discurso separatista e de confronto maniqueísta foi Lula. FHC lembrou bem, em entrevista à Folha de São Paulo, que Lula “dinamitou pontes” em seu governo. Ao invés de unir o país em torno de um proposta, optou-se por dividir o país e instigar uma rivalidade desnecessária e nada positiva. Lula, do alto de sua popularidade, mandou ver e decretou guerra aos inimigos, sugeriu que era necessário "extirpar a oposição" e metralhou uma sucessão de destemperos agressivos e autoritários. 

A divisão do país ficou mais evidente quando o tema ganhou a internet com ofensas aos nordestinos e equivalente revide. Acho que as atitudes estão equivocadas e não se justificam, afinal somos todos brasileiros, somos todos filhos da mesma pátria. Chegou-se ao absurdo de se falar em “raça” nordestina, o que não existe.

Voltemos ao ponto objetivo: a divisão do país. Este mapa traz a votação dos candidatos por município, além de algumas outras análises visuais bem interessantes. 

Nota-se claramente que Dilma venceu de forma esmagadora no Nordeste e no Norte e nas faixas populacionais com menor índice de escolaridade. Serra foi vitorioso no Sul, no Centro-Oeste e no Sudeste, com exceção de Minas Gerais que votou em Dilma. No geral, a vitória foi de Dilma.

Outro aspecto que os números revelam é que Serra venceu na maioria dos municípios vencidos por Marina no 1o. turno, revelando uma nítida transferência de votos.

Há várias extrapolações possíveis e os números contribuem para várias análises. Uma delas demonstra que no Maranhão, Dilma venceu em todos os municípios. No Maranhão, 55% da população é beneficiária do Bolsa Família. O Estado é governado por uma mesma família há muitos anos, família esta que se aliou a Dilma. Um jornal maranhense trazia um artigo assinado pelo Senador José Sarney em que dizia que votar em Dilma era votar em Roseana.

O Bolsa Família é um programa assistencial positivo, porém é preciso questioná-lo. É benéfico dar o benefício por prazo indeterminado? Como auxiliar um beneficiário a sair do programa? Como educar as pessoas para que se capacitem para a vida profissional e saiam do programa? Estas perguntas não foram abordadas na campanha presidencial.

Aliás, poucos temas relevantes foram abordados por ambos os candidatos na reta final da campanha. Culpa de quem? Culpa de nós cidadãos e eleitores que não exigimos posturas mais claras.  Por exemplo: sabemos o que pensa Lula, mas o que pensa Dilma? Ela não falou o suficiente. Foi treinada para repetir um “programa” de governo vazio e generalista, mas que não explica como as questões serão enfrentadas.

Os candidatos prometeram realizar a reforma política, a reforma tributária, melhorar a infraestrutura, melhorar a segurança, melhorar a saúde, melhorar a educação.

As duas primeiras reformas são eternas promessas e se a reforma política tivesse sido levada a cabo, talvez Tiririca não tivesse sido eleito. Duvido que Dilma consiga realizar uma delas. E ainda tem a reforma previdenciária e o ajuste fiscal para diminuir o tamanho da máquina pública. Os desafios que Dilma vai enfrentar são grandes e, como cidadão, não sei o que ela pensa sobre estes temas.

Dilma assumirá com um país dividido. Terá uma maioria na Câmara e no Senado, porém, se o PMDB se revoltar, esta maioria se evapora. Esta divisão criará problemas para Dilma pois vislumbro que o cidadão saberá utilizar melhor os instrumentos de comunicação disponíveis e que foram palco de grandes embates nos meses que antecederam o pleito. Refiro-me à internet, especificamente ao Twitter, ao Facebook e ao Orkut. Ousaria dizer que o Twitter foi o grande vencedor desta eleição.

Política não deve ser assunto para cada dois anos; política deve ser acompanhada sempre. Utilize os canais disponíveis e cobre, fiscalize, escreva para seu deputado e senador, manifeste sua indignação e elogie os bons projetos. O email pode ser uma ótima forma de botar a boca no trombone.

Este blog continuará a importunar nossos dirigentes e a reclamar, quando for o caso. Se couberem elogios, estes também serão feitos. 

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Um mapa eleitoral


Estatísticas são frias; números são frios. Alguns dirão que comportam intepretação, outros dirão que não. Os dados estão lançados nos mapas acima. Esta eleição aprofundou ainda mais a divisão do país, algo nutrido e incentivado pelo partido vencedor. O tema exige análise mais profunda e voltarei ao tema.

Agora, só nos resta respirar fundo e não se calar.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Shimbalaiê



Para quem ainda não conhece Maria Gadú, a música que foi mencionada no post anterior.

SHIMBALAIÊ


Shimbalaiê, quando vejo o sol beijando o mar
Shimbalaiê, toda vez que ele vai repousar (2x)

Natureza deusa do viver
A beleza pura do nascer
Uma flor brilhando à luz do sol
Pescador entre o mar e o anzol

Pensamento tão livre quanto o céu
Imagino um barco de papel
Indo embora pra não mais voltar
Tendo como guia Iemanjá

Shimbalaiê, quando vejo o sol beijando o mar
Shimbalaiê, toda vez que ele vai repousar (2x)

Quanto tempo leva pra aprender
Que uma flor tem vida ao nascer
Essa flor brilhando à luz do sol
Pescador entre o mar e o anzol

Shimbalaiê, quando vejo o sol beijando o mar
Shimbalaiê, toda vez que ele vai repousar (2x)

Ser capitã desse mundo
Poder rodar sem fronteiras
Viver um ano em segundos
Não achar sonhos besteira
Me encantar com um livro, que fale sobre vaidade
Quando mentir for preciso, poder falar a verdade

Shimbalaiê, quando vejo o sol beijando o mar
Shimbalaiê, toda vez que ele vai repousar (4x)

O prazer da poesia




Formulou a pergunta com um ar de surpresa e desconfiança:

"Você costuma ler poesia?"

A resposta afirmativa não deixou o interlocutor sem jeito, mas sinceramente surpreso,  talvez por achar que a leitura de poesia esteja restrito aos alunos de escolas infantis e jovens adolescentes na fase da descoberta dos sentimentos, como aquelas mocinhas que suspiram diante de poemas açucarados.

Eu leio poesia e de vez em quando tento escrever poesia. Encontro na leitura de versos  de meus poetas favoritos um raro momento de reflexão, de contemplação, deixando de lado o trabalho e as preocupações banais e cotidianas da vida. Mergulho no verso e deixo a razão de lado por alguns instantes. Experiência que é igualmente prazerosa ao escrever.

A poesia é uma fonte de prazer. Ferreira Gullar, em recente entrevista, afirma que escrever poesia é uma aventura prazerosa. 

A poesia é a forma mais livre de escrita. O poeta enfileira as palavras traduzindo sua imagem abstrata em algo concreto e compreensível, mas deixando ao leitor a interpretação, que recorre a imagens pessoais criadas pela experiência pessoal.

Um lindo dia pode ser descrito de forma distinta e significar algo quase ilimitado, pois cada leitor o descreverá com base numa análise subjetiva.  Não tenho a pretensão de teorizar sobre o prazer que a poesia produz, pois é algo que se comprova na prática.

Corra as folhas de um livro de poesia, deixe que seus olhos sejam atraídos por palavras que lhe fisguem a atenção e invadam o emocional. Um momento basta para que aquelas palavras permitam ao leitor transcender o mundo real e meditar sobre o que o poeta descreve. O prazer intelectual é marcante. Algo semelhante ao que ocorre quando uma música se repete milhares de vezes em nossa cabeça e passamos a cantarolá-la o dia todo; ou quando uma pintura ou uma foto nos prendem a atenção de forma inexplicável.  Eis a beleza, eis a grandeza a nos arrebatar.

A música é a poesia cantada. Dou um exemplo com estes versos extraídos da música Shimbalaiê, da jovem Maria Gadú:

Shimbalaiê, quando vejo o sol beijando o mar
Shimbalaiê, toda vez que ele vai repousar

A palavra traduz o momento de um pôr do sol no horizonte tendo o mar como cenário. Não é preciso dizer nada mais. O leitor pode deixar o tempo passar contemplando o espetáculo natural; ou pode ser transportado pela imaginação ouvindo os versos e que remetem a uma prazerosa experiência passada.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Poesia: La Reina, de Pablo Neruda



LA REINA

Yo te he nombrado reina.
Hay más altas que tú, más altas.
Hay más puras que tú, más puras.
Hay más bellas que tú, hay más bellas.
Pero tú eres la reina.


Cuando vas por las calles
nadie te reconoce.
Nadie ve tu corona de cristal, nadie mira
la alfombra de oro rojo
que pisas donde pasas,
la alfombra que no existe.


Y cuando asomas
suenan todos los ríos
en mi cuerpo, sacuden
el cielo las campanas,
y un himno llena el mundo.


Sólo tú y yo,
sólo tú y yo, amor mío,
lo escuchamos.

(Los versos del capitán. Barcelona : Random House Mondadori, 2003, p. 16)

O amor é temática recorrente em Neruda. Seus Vinte Poemas de Amor (15 e 20) são uma prova magistral da sensibilidade com que união de palavras resulta em algo novo e indescritível. La Reina (A Rainha) é um exemplo de como palavras simples, repetidas em tom melódico, descrevem o olhar apaixonado que é lançado sobre sua amada.

Quando vais pelas ruas 
Ninguém te reconhece

mas o "eu" apaixonado te avista de longe e os sinos tocam, os rios borbulham e a música enche o mundo. Somente eu e você somos capazes de escutar isto tudo. O casal apaixonado, o homem apaixonado escolheu sua rainha.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Hélio Bicudo, a democracia e a liberdade



Desnecessário acrescentar qualquer comentário. A grandeza de espírito revela-se na atitude crítica de Hélio Bicudo. Ao invés de seguir cegamente um líder que atirou na lata do lixo a ideologia e seus princípios - se é que algum dia compreendeu esta expressão -, Hélio Bicudo saiu do PT por discordar do encampamento do Estado pela máquina partidária.

E termina sua fala com a afirmação: "Não precisamos de soberanos com pretensões paternas, mas de democratas convictos." Pense nisso na hora de votar.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

King of Anything, de Sara Bareilles



King of Anything é uma das músicas que compõem o novo álbum de Sara Bareilles. Kaleidoscope Heart foi lançado nos EUA no dia 7 de setembro de 2010 e está atualmente na 19a. posição na iTunes store americana. King of Anything é o primeiro single de trabalho.

Infelizmente o vídeo original só está disponível no Youtube, mas vale a pena ver e ouvir. O making of está disponível gratuitamente na iTunes store. Um interessante jogo de imagem, cor e fotografia.

Trilha sonora para o fim do dia. Ou para começar bem o dia.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O retorno do personagem

"O visitante comeu um biscoito de polvilho e de repente fez a pergunta, Alguma das minhas personangens teria por acaso voltado a me procurar pedindo mais tempo e mais espaço? Fiquei olhando para o prato de biscoitos, Ah! duas ou três já tinham voltado sem disfarces para exigir, Quero mais uma chance porque eu não disse e não fiz nem a metade do que devia fazer! Rosa Ambrósio, atriz decadente e alcoólatra, me apareceu ainda outra tarde, eu me sentei numa mesinha na calçada enquanto tomava sorvete e fiquei vendo aquela gente passar ali defronte. Ela aboletou-se ao meu lado e com sua voz pastosa criticou os passantes, jovens, crianças e velhos que iam desfilando na tarde calorente: Gente visível demais, gente tão solicitante, olha meu cabelo! olha meu sapato! olha o meu rabo! E pode acontecer que às vezes a gente não tem vontade de ver rabo nenhum, ela disse e me puxou pela manga, Então, não vai mais me chamar?...(...)"

(Lygia Fagundes Telles. A Conspiração de Nuvens. Rio de Janeiro : Rocco, 2007, p. 99)

Quando li a crônica intitulada O Visitante, cujo trecho foi transcrito acima, estranhei. Como poderia um personagem voltar e pedir mais tempo ao seu criador? Se há necessidade de mais tempo, então não estaria mal contada a estória? Não seria deficiente a narrativa? Seria o caso de reescrever o que foi escrito? 

A dúvida permaneceu e fiquei intrigado, curioso sobre o processo criativo e a forma como o escritor dá "vida" às suas personangens. A narrativa de Lygia Fagundes Telles marcou-me, ficou gravada num cantinho da memória como um daqueles textos de formação inesquecíveis, como se a esperar um momento preciso para se revelar com clareza e genialidade. Confesso que continuei cético sobre o aparente delírio da escritora, até que outro dia, fez-se a luz.

Escrevi uma crônica em junho deste ano cujo título é Viagem. Inicialmente, pensava em escrever um conto, algo mais longo e o que foi publicado seria a primeira parte. Ele não tinha nome, não tinha rosto, não tinha nada além de dor e sentimentos. 

O fato é que ele me chamou e pediu mais tempo, queria contar sua estória, queria falar-me, queria que eu viajasse com ele e o acompanhasse na viagem. Seria seu porta-voz, seu confidente, seu fiel escudeiro. E assim, a narrativa foi sendo chocada e ganhou corpo. Esta narrativa foi adubada por um desafio e aos poucos, Pedro, este o seu nome, vai me contando sua estória.

E a estória de Pedro vai preenchendo páginas e páginas que quiçá formarão um belo livro. Lygia Fagundes Telles tem razão quando nos ensina que as personagens têm vida própria.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Crônica: Se a noite falasse

SE A NOITE FALASSE

Se a noite falasse, se a noite contasse tudo o que ouve e tudo do que é testemunha, o mundo seria uma grande desordem. A noite assemelha-se à nossa consciência. Ouve pensamentos dos mais singelos, os mais puros e os mais abjetos.

Naqueles momentos em que a cabeça repousa sobre o travesseiro e fazemos, voluntária ou involuntariamente o exame de consciência, ou deixamos o devaneio tomar conta do estado de sonolência, levemente embriagado, a noite é nossa única testemunha. Alerta e onisciente, tudo escuta. 

Na noite, planejam-se os crimes mais horrendos, os assassinatos, os roubos, os latrocínios, a violência hedionda, os embriagdos que descontrolados agridem mulheres indefesas, que disparam armas de fogo, que empunham armas brancas e dilaceram a carne de um inimigo - ou de um amigo.

Na noite, o pobre apaixonado é tomado de coragem e bravura, pronto a declarar-se, a declamar o mais belo poema de amor sem titubear, gaguejar ou fugir do olhar da amada. O coração parece não conhecer o medo e a timidez, mas apenas a alegria de dar vazão às palavras que brotam do coração. 

Na noite, há silêncio, há calmaria. Todos dormem, menos eu. Observo atento o que meu interior quer me dizer. Escrevo e anoto. Para quando o sol rair, quando se fizer, reler o que pensado, e sóbrio, tentar encontrar a coragem perdida para abraçar o mundo e simplesmente falar. E fazer. E viver.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Marina Colasanti ganha Prêmio Jabuti 2010

A escritora Marina Colasanti foi escolhida como autora do melhor livro de poesia de 2010 e conquistou o Prêmio Jabuti. Seu livro Passageira em Trânsito foi mencionado neste blog e algumas poesias transcritas, apenas como aperitivo e provocação ao leitor. Sei bem que poesia não agrada a todos e que sua compreensão pode depender do momento, mas a poesia faz bem à alma.

Os resultados foram divulgados no dia 1o. de outubro pela Câmara Brasileira do Livro.


Romance
1º) 
Se eu Fechar os Olhos, Edney Silvestre (Record)
2º) 
Leite Derramado, Chico Buarque (Companhia das Letras)
3º) 
Os Espiões, Luis Fernando Veríssimo (Objetiva)
Contos e crônicas
1º) 
Eu Perguntei pro Velho se ele Queria Morrer (e Outras Histórias de Amor), José Rezende Jr. (7Letras)
2º) 
A Máquina de Revelar Destinos Não Cumpridos, Vário do Andaraí (Dimensão)
3º) 
Paulicéia Dilacerada, Mario Chamie (Funpec)
Poesia
1º) 
Passageira em Trânsito, Marina Colasanti (Record)
2º)
 Sangradas Escrituras, Reynaldo Jardim Silveira (Star Print)
3º) 
Lar, Armando Freitas Filho (Companhia das Letras)
Biografia
1º) 
Nem Vem que Não Tem: Vida e Veneno de Wilson Simonal, Ricardo Alexandre (Globo)
2º) 
Padre Cícero: Poder, Fé e Guerra no Sertão, Lira Neto (Companhia das Letras) e Euclides da Cunha: Uma Odisséia nos Trópicos, Frederic Armony (Ateliê Editorial)
3º) 
Bendito, Maldito: Uma Biografia de Plínio Marcos, Oswaldo Mendes (Leya)

Com esta seleta lista, não há razão para embarcar no feriado sem uma boa leitura.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Uma neófita na política

Deparei-me com este vídeo do debate dos candidatos a Governador do Distrito Federal. Em tempos de debates mornos e sem graça, este vale a pena ver.



Uma curiosidade: o Delegado Protógenes Queiroz (PC do B) só foi eleito graças ao votos obtidos por Tiririca na coligação. Eis a coerência e seriedade de Protógenes. No mesmo partido está Netinho de Paula, que ontem revelou todo seu bom humor e simpatia no CQC. Só não esmurrou o Rafinha Bastos porque ele é maior que o Netinho.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A voz das urnas

Sei que estou abusando da temática política neste blog, mas peço a paciência do leitor. Os temas literários retornarão em breve. Até que fui comedido nestes últimos dias, pois tinha pensado em escrever um longo texto prevendo o segundo turno. Tinha minhas razões que acabaram sendo expostas em conversas, mas não se transformaram em um texto organizado. Meus interlocutores sabem que acertei.

O eleitor jogou água no choppe e acabou com a festa da arrogância da líder nas pesquisas. O discurso de Dilma, após o encerramento da apuração, revela claramente que ela sentiu o golpe. Ela nunca havia disputado uma eleição e perder faz parte do jogo democrático. Visivelmente abatida, Dilma falou à imprensa mas não conseguiu esconder o desapontamento e o clima de velório. Veja o vídeo:



Aliás, Brasília é realmente uma cidade mística e estranha. Na mesma eleição, o Distrito Federal reuniu as condições climáticas perfeitas para a proliferação de fantoches políticos como nunca antes na história deste país. Weslian Roriz e Dilma Roussef são exemplos desta espécie nova espécie humana. Se Gepeto morasse em Brasília, não precisaria fazer um pedido à fada madrinha, bastaria contratar um bom marqueteiro e Pinóquio ganharia vida. E um bom cargo político.

Enquanto fiquei contente com a sapiência do eleitor paulista que recusou Netinho de Paula, não posso dizer o mesmo da eleição do Tiririca. Para não ficar tão isolado e envergonhado, o eleitor carioca elegeu Garotinho para a Câmara Federal. Agora teremos palhaço e plateia; ou vice-versa.

Conforme nossa previsão, Tirirca foi eleito. O Delegado Protógenes Queiroz também foi eleito. A Mulher Pera, apoiada por Eduardo Suplicy, teve a candidatura impugnada e ficou sem votos. Outros oportunistas que procuravam um emprego também não se elegeram, o que deixa um fio de esperança.

Algo que ficou muito claro com o mapa de votação para presidente foi a divisão do país. No Nordeste, 22% dos eleitores recebem o Bolsa-Família. O voto de cabresto ainda impera. Esta a razão para o sucesso de Dilma naquela região.

Por fim, eu daria qualquer coisa para estar no Palácio da Alvorada e ver a cara da Dilma e do Lula quando perceberam que haveria 2º. Turno. A “alegria” de Dilma contrastou com a “tristeza” de Marina Silva. Humildade faz bem e o eleitor deu um pouco de esperança para aqueles que acreditam no voto.


quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Memória faceira

Fui tomado de uma singela leveza ao caminhar ao lado de enormes paredes espelhadas que refletiam meus passos firmes e certeiros, levemente lépidos. A memória faceira, arteira como ela só, escureceu o céu claro, encobriu o sol, trouxe gotas de chuva e o clima frio daquela tarde em que passei pelo mesmo local, alheio ao que me cercava, pensamento distante e sorriso largo estampado no rosto. A chuva, o frio, os pés molhados e gelados, o terno amarfanhado. Nada – absolutamente nada – poderia entristecer-me naquele dia. Estava feliz, leve, enamorado. Sorrateira, a memória faceira conduziu-me pela mão até o passado e a leveza antes sentida, retornou a se hospedar no meu âmago, espantando a amuada fisionomia que teimava em se instalar no meu pobre ser.

Memória que brinca como uma menina cheia de energia, que rodopia, salta e dança, alegre e rutilante. Menina que brilha e contagia com sua energia, sua vibração, seu doce sotaque. Volto a ser criança guiado pela memória viva e que descortina diante de meus olhos o túnel do tempo na vívida impressão do passado repetido no momento presente. Sorrio e sorvo a leveza que reveste meu ser. 

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Bola de cristal eleitoral

Os eleitores de São Paulo, quero crer que por ingenuidade ou traquinagem, mas penso ser por burrice e ignorância, devem eleger Tiririca para Deputado Federal. Tudo indica que ele será um dos 5 candidatos mais votados. Assim como Enéas e Clodovil foram grandes puxadores de foto, Tiririca é um candidato fabricado em laboratório – assim como Dilma Roussef – e serve para tentar eleger alguns candidatos que não se (re) elegeriam, como Valdemar Costa Neto e José Genoíno. Torço para estar errado, mas minha bola de cristal, em temporada eleitoral, não costuma falhar.


O problema central é que o suposto voto de protesto em Tiririca nada mais é do que um voto em favor de pessoas que não tem escrúpulo com o uso do dinheiro público, não tem compromisso com o eleitor e sequer sabem o que é uma Constituição. São manipuláveis, venais e sem qualquer convicção política. Este tipo de candidato – há vários assim – não contribui para a melhoria do país e não valoriza a ética na política.


Há algum tempo este blog profetizou que Protógenes Queiroz, o ex-delegado da Polícia Federal responsável pela Operação Satiagraha que prendeu Daniel Dantas e outros, sairia candidato a Deputado Federal. Dito e feito. A vidência do blog funcionou, está lá no útlimo parágrafo deste post de 2 anos atrás. Acho que ele não se elege, mas é candidato pelo mesmo partido do Netinho de Paula (PC do B) e daí você, meu caro leitor, já pode tirar suas conclusões sobre a seriedade do partido.


Na mesma toada, e falando de Netinho de Paula, ele deve ser eleito Senador e pode deixar Marta Suplicy de fora. A esperança de alguns é que Aloysio Nunes consiga fazer uma boa atropelada na reta final e desbancar Marta. Os petistas estão assustados com a subida de Netinho de Paula e de Aloysio Nunes.


Se Netinho de Paula e Marta Suplicy forem eleitos, teremos 3 senadores representando São Paulo que poderiam nos finais de semana interpretar uma peça de Nelson Rodrigues. Eduardo Suplicy, ex-marido de Marta, tem mais 4 anos de mandato e completa o trio.

Os três são personagens rodriguianos. Marta é madame da sociedade que diz defender os pobres e oprimidos, uma feminista convicta e que faz dupla de chapa com um pagodeiro que tem em seu passado um histórico de agressões a mulheres – e repórteres. Eduardo Suplicy apenas assiste a tudo e se encanta pela Mulher Pera, sugerindo o voto nela. Tudo beira o surreal, mas daria uma excelente trama no melhor estilo do universo rodriguiano.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Poesia: Esparadrapo



ESPARADRAPO

De uma única vez,
arranquei o esparadrapo.
Gesto firme,
decidido.
Rasgou-me a pele,
doeu por um minuto.
Não mais.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Em defesa da Democracia

Hoje será realizado em São Paulo um ato a favor do controle da imprensa no Sindicato dos Jornalistas. No Rio de Janeiro, no Clube Militar, haverá um debate a favor da democracia e da liberdade de imprensa.

Veja a que ponto chegamos no Brasil: "jornalistas" defendem a censura e controle sobre a imprensa e os militares defendem o Estado de Direito, a Democracia e a liberdade de imprensa.

Isto tem nome: governo do PT. Esta é a cara do PT. Se estiver conosco e pensar com o partido, ótimo, caso contrário deverá ser extirpado. Qualquer semelhança com Fidel Castro, Hugo Chávez e aquele barbudinho do Irã não é mera coincidência.
Se você não concorda com o que estão fazendo com o Brasil, assine o Manifesto em Defesa da Democracia.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A visão "curta" da liberdade de imprensa


A imagem que ilustra este post foi retirada do blog Seja dita a verdade. Trata-se de um blog, assim como tantos outros, que retratam a versão oficial e defendem o governo. Há vários jornalistas que afirmam ser imparciais, mas na verdade são bancados por estatais e outras formas indiretas de custeio pelo governo. Se você é amigo do chefe, ganha um patrocínio. Se você é independente, você é inimigo.

Para a militância oficial do governo, a imprensa é chamada de PIG - Partido da Imprensa Golpista. Toda denúncia ou crítica feita ao governo é retratada como "factóide eleitoral", "intriga da oposição", mentira, conspiração das elites. Curioso que quando meios de comunicação "idôneos" como a revista Carta Capital criticam algum integrante da oposição, estes militantes aplaudem.

Há uma perigosa visão curta, limitada, autoritária por parte destas pessoas. Já escrevi sobre isto antes e voltarei ao tema enquanto for necessário, enquanto houver o risco de ter minha voz calada por líderes que não sabem respeitar a democracia e uma visão diferente da deles. Se dependesse de Lula, todos os brasileiros seriam petistas, não haveria necessidade de eleição e todos adulariam o líder supremo. Algo como é feito com Fidel Castro e Hugo Chávez.

Lula, no dia 18 de setembro, em comício em Campinas, voltou a atacar a imprensa. A OAB - que demorou para acordar - e a ANJ divulgaram nota de repúdio, que pode ser lida aqui.

Os ataques têm sido reiterados e partindo de fontes diferentes. Na semana passada, foi José Dirceu. Agora Lula voltou à carga. E tem gente no PT que ainda tenta sustentar que Lula não é contrário à liberdade de expressão. Em outras palavras, tentar dizer que Lula não disse o que disse.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Crônica: Uma Data


UMA DATA

Gosto de lembrar de datas especiais. Não precisa ser aniversário, Natal, Páscoa, Ano Novo, nem precisa ser comemorado por todos. Gosto especialmente daquelas datas que têm significado somente para mim, e talvez para mais alguém. Datas especiais, mas secretas. Datas que não perdem o significado num único dia, não se exaurem. Elas transformam de forma tão profunda que seus efeitos se prolongam e estão presentes constantemente.


Estão discretamente encobertas, como raízes que se espalham, ou escuras como túneis que atravessam montanhas, ou altaneiras como pontes que cruzam o mar ou um pequeno riacho. Um dia especial deixa a marca do sorriso que é lembrado num momento de escuridão e perplexidade, num momento em que tudo – e todos – parecem se esquecer.

Uma data inesperada, que poderia ser um dia rotineiro, mas que foi um dia em que os olhos brilharam de outra forma, onde o coração não bateu, mas dançou, num dia em que o sorriso não foi um simples sorriso, mas um convite, uma abertura da alma.

Datas que trazem vagarosas saudades, uma leve chama que nunca se apaga, cujo óleo da lamparina é infinito, que permanece acesa e fulgurante, ainda que seja tímida. O tempo pode passar, podemos envelhecer, as estações se sucedem, algumas rugas desenham-se na pele, o silêncio pode se instalar, mas aquela data tem a força da juventude. Hoje é um dia destes. Um dia do qual não me esqueço. Um dia do qual jamais esquecerei.



segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Ferreira Gullar e a poesia - II

Mais um trecho da conversa de Ferreira Gullar com os editores da Dicta & Contradicta:

"D&C: Uma aventura prazerosa ou dolorosa?"

"Prazerosa, é claro. Quem diz que dói escrever um poema mente. Não tem nada disso. T.S.Eliot dizia: 'Escrevo para me libertar da emoção'. O poema é cura, não doença. Escrevo para ser feliz,  para me libertar do sofrimento, não para sofrer. É a alquimia da dor em alegria estética. Mesmo quando a coisa é doída, amarga, naquele momento a transformo no ouro que é o poema. O prazeroso é não saber o que vai acontecer. É claro que há o rigor, pois a criação e a crítica são simultâneas. Há sempre uma escolha. Criar é sempre criticar, mas não sei de onde vem. É como digo: 'A Divina Comédia podia nunca ter sido escrita ou ter sido escrita diferente da maneira como foi'. Há um lado que é a necessidade, que é o que eu vou fazer. Por exemplo, se quero falar sobre uma pêra, não estou falando sobre uma praia, e isso condiciona o que vou dizer. Mas como o discurso da poesia não é lógico, não é previsível, então começa a aventura, e o que me acode, que vem através das palavras, está condicionado por certos fatores, como o sujeito que me falou algo na rua ou um trecho de um romance que li à noite. Há sempre uma relação de acaso e necessidade que determina o poema."
(número 05, Junho 2010, p. 16)

Difícil acrescentar algo ou comentar sobre esta passagem da entrevista. Mas vou destacar alguns aspectos da lição do grande poeta:
- o poema surge do acaso;
- o poema é uma aventura: sabe-se o ponto de partida, mas não se sabe o ponto de chegada;
- escrever é um exercício de felicidade;
- a escrita é transformadora, transforma a dor e algo belo.

Ferreira Gullar revela algo mágico sobre o processo criativo e que me parece tão atraente aos jovens: escrever é uma aventura, a poesia é uma aventura, que não é lógica, mas bela.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Microconto - VI

- Ela era bonita? - indagou a curiosidade feminina.

- Ela ERA muito bonita. Não é mais. - respondeu com segurança.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Ferreira Gullar e a poesia - I


O poema, para mim, é a grande aventura de como fazer. Costumo dizer em palestras para estudantes que, quando vou escrever um poema, a página está em branco e isso significa que todas as possibilidades estão abertas, são infinitas. No momento em que sorteio uma palavra, reduzo as possibilidades, o acaso é menor. Mas não sei o que vai acontecer, é uma aventura…" (grifo no original)

O trecho acima foi extraído de uma entrevista concedida por Ferreira Gullar à revista Dicta & Contradicta (número 05, Junho 2010, p. 16). 

Ferreira Gullar disseca o seu processo criativo e afirma que o poema tem um ponto de partida: a folha branca; mas o poeta não sabe aonde vai chegar. A razão, o sentimento - ou os sentimentos -, a percepção, a intuição. Tudo guiará o poeta para que coloque as palavras na folha em branco e traduza o etéreo em palavras compreensíveis.

Fazer poesia é uma grande aventura. 

sábado, 4 de setembro de 2010

Crônica: A Parede


A PAREDE


Permaneceu em pé, num canto, durante a maior parte do almoço festivo, ao lado da esposa, deixando que ela falasse e fosse o centro das atenções. Ria discretamente, contido, quase tímido, como se estivesse fora de seu ambiente familiar. 

Fitava as crianças que corriam de um lado para o outro, sem preocupações maiores, sem entender a vida, apenas vivendo o tempo presente. Os adolescentes, com suas namoradas - e namorados - a tiracolo discorriam sobre projetos de vida, sobre cursos, sobre a faculdade, sobre grandes planos de transformação, donos de si e de um conhecimento que pensavam ser detido apenas por eles. Consideravam-se os iluminados, os eleitos para finalmente colocarem o mundo nos eixos, para acabar com a pobreza, a miséria, a poluição, as armas nucleares.

Num outro canto, um jovem casal com mais de trinta anos vigiando atentamente o pequeno rebento que descia hesitante um pequeno degrau. A vida para eles se renovava, venceram a juventude e acalmaram os ânimos idealistas para fincar raízes no solo. 

Na mesa redonda diante dele, os mais velhos já estavam sentados, cansados de ficar de pé, cansados da luta. Alguns ainda vibrantes e sorridentes, outros ranzinzas, feição fechada e séria, reclamavam de tudo: o trânsito, o preço das coisas, o barulho, a juventude perdida. 

A festa comemorava os 75 anos de um primo e a família estava toda lá. Todos reunidos, as várias fases da vida, as várias etapas, o ciclo completo. 

Ele estava aflito com a última consulta no cardiologista. A cirurgia não tinha resolvido o problema de uma das válvulas do coração e iria novamente ao médico amanhã. Sentia-se caminhando lentamente, constantemente, em direção a uma parede. Conseguia avistar a parede e não havia como ultrapassar a parede. Era imensa, intransponível. Para qualquer lado que olhasse, via-se apenas a parede. Seus pés moviam-se a passos lentos, mas sempre rumo à parede.

Uma de suas netas, reparando o rosto sério do avô, veio conversar com ele.

- O senhor não quer sentar, Vovô? Parece cansado. - disse a menina.

- Estou bem, minha filha.

- O senhor está com cara de preocupado. O que aconteceu?

- Vovô vai ao médico amanhã para examinar o coração.

- Não fica preocupado Vovô. Sabe o que senhor deve fazer? Pede para o seu anjo da guarda de ajudar. Ele tem asas bem fortes e vai te ajudar. - disse a menina com toda a ingenuidade infantil.

À noite, ele rezou ao seu anjo da guarda, pediu forças como não fazia há anos. Rezou com fé. Chorou silenciosamente. Dormiu sossegado e calmo, confiante de que quando estivesse diante da parede, alçaria voo e ultrapassaria.


sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Dilma Guerrilheira - O Clipe (Sátira do Jingle)

Algo leve e divertido para embalar o feriado.

E antes que reclamem, eu continuo falando mal e criticando o PT.


terça-feira, 31 de agosto de 2010

Tuitando no busão

Meu carro está no mecânico para consertar uma porcaria de um sensor eletrônico que bombeia o óleo para o motor. Ou pelo menos foi isto que me disse o mecânico ao apresentar o orçamento do conserto. Não entendo nada de mecânica e não ligo muito para carros. Ficar sem carro em São Paulo, porém, pode ser um grande problema.

Infelizmente sou obrigado a usar meu carro diariamente. Preferiria mil vezes poder usar o metrô e contribuir para fazer uma cidade melhor. Preciso do carro para zanzar para cima e para baixo. Sem ele, não me aperto. Sou daquelas pessoas que se vira sem ficar estressado. Com reunião fora do escritório, uma audiência num fórum longe do escritório, o jeito foi confiar no sistema de transporte público de São Paulo. Desde ontem usei táxi, ônibus e metrô, além de um ônibus da OAB que faz a ligação entre a estação Barra Funda do metrô e o Fórum trabalhista, aquele construído pelo Lalau, em um escândalo de corrupção.

E por que o título deste post? Calma, eu chego lá.

Rumo à minha casa, peguei o ônibus depois das 20 horas. Lotação média, algo que logo se tornou lotação máxima. Nos poucos minutos em que tinha espaço para respirar, reparei num rapaz ao meu lado, com pouco mais de 20 anos e que foi tuitando a viagem inteira. Fiquei uns 40 minutos no ônibus e o sujeito estava conectado o tempo todo no Twitter.

Num banco mais adiante, um outro rapaz usava o celular para um jogo eletrônico; outra conversava no aparelho; outra ouvia música.  O celular deixou de ser mero telefone e passou a ser um canal de comunicação com um mundo, uma forma de estar conectado o tempo todo. Em alguns casos há exageros, mas em certas situações é um excelente instrumento de lazer, de trabalho e de divulgação de cultura.

As redes sociais se transformaram num canal de veiculação gratuita para as mais variadas instituições culturais. Através delas, é possível encontrar peças de teatro, mostras de arte, eventos musicais. E muitos destes eventos são gratuitos. Basta saber procurar.

E ainda tem gente que acha que foi um crime privatizar as companhias telefônicas!

sábado, 28 de agosto de 2010

Antes que, de Marina Colasanti


ANTES QUE

Preciso ler um bom poema antes
de dormir
antes que a noite encerre o
diário inventário das lembranças
antes que o sono cale boca e olhar, antes
que o prumo caia
horizontal.
Preciso ler um bom poema antes
que seja tarde
que fique escuro
que chegue o frio.
Ler um bom poema antes que a morte venha
e escreva o seu.

(Passageira em trânsito. Rio de Janeiro : Record, 2009, p. 49)

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

De cara nova



Colarinho puído. Paredes com a tinta descascada. Livros com suas folhas amareladas. Sofá com o tecido gasto e desbotado, quase rasgando. Qualquer um destes exemplos era aplicável ao layout deste blog. Já estava mais do que na hora de fazer uma reforma, um extreme makeover, algo que vinha adiando há tempos. Afinal, este blog já tem 3 anos e meio!


Enfim, estamos com cara nova. Um look mais moderno e atualizado, principalmente do ponto de vista tecnológico. Era preciso incorporar novas funcionalidades e “botõezinhos” a este blog. Agora está tudo unido e conectado às redes sociais e outras formas de comunicação em rede. Fica mais fácil criticar, discutir, reclamar ou elogiar.

Alguns ajustes ainda estão sendo feitos, principalmente na lista de links. Alguns links estavam quebrados e eram direcionados a blogs que foram apagados ou bloqueados. Aos poucos vou fazendo o ajuste fino e incluindo aqueles blogs que porventura tenha esquecido.

Espero que tenham gostado!

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Meu caro anônimo

Curioso como algumas pessoas raciocinam. O que importa é a posição pessoal e não um bem maior, a pluralidade e os princípios democráticos. Vou-me explicar.

Recebi o seguinte comentário do Sr. Anônimo:

"Que interessante, mas acho que você precisa se informar não só com as revista e jornais da grande imprensa. Elas pegaram vc direitinho.Censura? Onde? Aqui? Vc está brincando!Folha de SP, Estadão, Veja, Istoé, são o que há de mais mentiroso que já existiu no país. Este, que vc cita neste post, faz e diz o que o patrão manda, porque é rua, na certa. Tome cuidado com suas leituras, pois imprensa é empresa e visa só lucro e não tem fidelidade alguma com a verdade."



Em linhas gerais, o leitor me chamou de ingênuo e crédulo. Aceito a crítica, mas discordo. Tenho minhas convicções e defendo minhas ideias, assim como você parece defender as suas. Mas há uma diferença gritante entre nossas condutas: eu digo e assino embaixo; você se esconde no anomimato. Poderia excluir seu comentário, mas vou deixá-lo aqui. Sua postura permite que aprofunde ainda mais meus argumentos.

Passemos por cima dos erros gramaticais e fiquemos no conteúdo. Pois bem, meu caro, o que você costuma ler? Carta Capital? Caros Amigos? O Blog do Planalto?

Eu leio o Reinaldo Azevedo e o considero um dos melhores jornalistas deste país. Leio também o Diogo Mainardi, os editorais do Estadão, os artigos do Arnaldo Jabor. De vez em quando, até dou uma passadinha no Twitter da Dilma para saber o que ela tinha para fazer de tão bom na hora de um debate. Se você não sabe, ela estava escutando Pato Fu e recomendando o álbum no Twitter.

Suas palavras deixam transparecer de forma muito clara a sua visão política, à qual respeito. Desde meus tempos de faculdade digladio com pessoas de lógica obtusa e curta, que desconhecem o mundo e ainda separam o mundo entre esquerda (boa) e direita (má). Uma dialética ultrapassada e pobre. Sou compreensivo com estas limitações, meu caro anônimo.

Agora vejamos o que seu grupinho faz com o dinheiro público:

O Blog do Planalto, canal de divulgação oficial do Planalto e das ações da presidência, traz hoje o seguinte post: Estadão e Folha não entendem o humor de Lula. Assistam ao discurso do presidente. Ele ainda sonha com um terceiro mandato. A piada de Lula revela o que ele pensa, o que ele no fundo quer e só não conseguiu porque os meios de imprensa, as "empresas do mal", como meu caro anônimo as denominou, bradaram contra. A imprensa foi fundamental para evitar uma tentativa de rasgar de Constituição Federal.

O Blog ainda menciona artigos relacionados: "Estadão viaja na maionese", "Estadão derrapa na reportagem e ainda reclama das críticas" e por aí vai. Vejam o nível a que chegou a comunicação oficial do governo!

Eu prefiro ler o que EU quiser, do que ler apenas o que o Estado me autoriza. Se estiver errado, a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão garantirão a correção do erro. Se houver dano, cabe ao poder judiciário reparar o dano mediante a provocação do lesado. Mas calar a boca de um jornalista JAMAIS!

Estou cansado de ouvir mentiras proclamadas pelo presidente da república e sua candidata fantoche, uma pessoa despida de ideias próprias, uma pessoa que não diz o que pensa, uma pessoa que não tem capacidade e nem condições de governar este país.

Eu sou contra a censura e não caio nesta baboseira de achar que toda a imprensa é má, que toda a imprensa conspira contra o governo. Estas ideias Chavistas não me agradam e não terão apoio deste blogueiro.

Volte meu caro anônimo e apresente-se! Vamos debater! Assim se constrói a democracia e a liberdade.