terça-feira, 31 de julho de 2012

Trechos Salpicados




"Amar em abstrato é muito mais ágil do que amar em concreto." (p. 35)

"Tanto eu queria agora dar-te o amor total e infantil que tinha para te dar. Racionei-o a vida inteira como a porra de um chocolate de leite - por que vivemos como se o tempo nos pertencesse infinitamente, como se pudéssemos repetir tudo de novo, como se pudéssemos alguma coisa?" (p. 27)

"Olhava para ti e sabia exatamente a cor e a forma do teu pensamento. Ou assim o julgava, o que é a mesma coisa." (p. 73)

"A amizade, história de perdões incessantes." (p. 95) 

"Procuro a amizade que me fez feliz. Dito assim, dá vontade de rir, e não é caso para menos - não se pode ser feliz só com a amizade. Nem só com o amor. Se conseguíssemos ser inteiramente felizes, o que ficaria para desejar?" (p. 89)

Todos os trechos acima foram extraídos do romance Fazes-me falta, de Inês Pedrosa (Rio de Janeiro : Objetiva, 2010). Um pequeno aperitivo para a análise do livro que virá em breve.

terça-feira, 24 de julho de 2012

O tempo e o sentimento de perda



O post anterior trouxe um trecho da escritora inglesa, Jennifer Egan, onde ela afirma que ao rever fotos dos filhos pequenos fica triste, pois nota a passagem do tempo e a passagem do tempo traz ímplicito o sentimento de perda.

Olho a foto acima e não sinto tristeza, nem sou acometido de um sentimento de perda de uma infância que ficou na memória. E na memória ela ficou e permanece viva, tendo contribuído na construção daquilo que hoje sou. Sim, a foto acima é minha e foi tirada por volta dos 2 anos de idade.

Li a frase, marquei-a e trouxe para o blog. Discordo dela, mas arriscaria dizer que as personagens de Jennifer Egan e seus romances devem trazer esta melacolia como pano de fundo. John Banville (O Mar e Os  Infinitos) e Ian McEwan (A Praia), ambos ingleses, tratam do tema com a mesma nostalgia e uma ponta de revolta diante da perda. 

Esta melancolia é um aspecto cultural de alguns povos e encontra-se inserida na postura das pessoas. O fado português é essencialmente um cantar de saudade, de tristeza, de perda. Os ingleses, com seu humor ácido, tendem a seguir esta mesma linha, tão bem sintetizada por Jennifer Egan. O passar do tempo é sinônimo de perda. Pessimismo este tão característico dos países do norte europeu.

O passar do tempo é inexorável. Unstoppable. Iniciada a vida, o cronômetro começa a correr e não há como pará-lo. Poder-se-ia dizer que cada início de dia é um dia a menos na vida, ou um dia mais perto da morte. Prefiro pensar que cada início de dia é um dia a mais que ganhamos e que temos para viver. 

As crianças não conhecem a morte, não compreendem o fim. A ideia de morte vai se imiscuindo no cotidiano de forma sorrateira. É comum terminarmos a faculdade - ou até o ensino médio - com um colega a menos, aquele cujo tempo se expirou e não completou a jornada universitária. Sempre pensei que este escolhido deixa-nos um recado, lembra-nos de nossa finitude e de que a vida é passageira. 

Aprendemos, então, a conviver com a perda. Na fase adulta, compartilhamos a alegria das novas vidas que nascem e a tristeza daqueles que se vão. Parece que tomamos consciência de nossa temporalidade nesta fase, valorizando o tempo com que desfrutamos com os mais velhos e rejuvenescemos diante do sorriso pueril dos pequeninos.

Recentemente, dei-me conta que o número de pessoas pelas quais rezo devido a alguma enfermidade tem aumentado. A lista era pequena, mas foi crescendo, assim como foi crescendo o número de pessoas que conheci e que já morreram. Fulano descobriu um câncer, beltrano vai ser operado do coração, sicrano teve um AVC.

Na velhice, imagino que olharei para os dias passados e agradecerei o tempo que me foi dado. Cada dia, com suas alegrias, tristezas e contratempos. Espero ser grato o suficiente e poder gozar da misercórdia de Deus a perdoar todos os meus inúmeros erros.

O tempo é professor que ensina, ainda que a contragosto, com a realidade fria; aplaina o ego exaltado com a tomada de consciência de nossa condição e treina-nos na humildade; não aceita desaforos e desperdícios, cobrando a responsabilidade daqueles que o desprezam. O tempo foi criado de forma sábia para que os nossos olhos não fiquem grudados apenas no terreno, mas que aos poucos saibamos erguê-los para o sobrenatural. A vida tem seu tempo exato. Não nos cabe avaliar e julgar se vivemos pouco ou muito; vivemos o suficiente.

Não vejo o passar do tempo como perda; vejo o passar do tempo com alegria de poder crescer, aprender, vivenciar e até sofrer. A perspectiva da vida retratada em fotos e em memórias é uma prova de que a vida não é perda, é ganho, e o tempo um presente divino.



segunda-feira, 16 de julho de 2012

Epígrafe - XVI


"(...) Meus filhos são saudáveis, engraçados, e minha vida é muito mais fácil agora que eles cresceram. Ainda assim, sempre que vejo fotos de quando eles eram bebês, fico triste. Há sempre uma sensação de perda quando percebemos a passagem do tempo, mesmo quando nada foi perdido."

Jennifer Egan, em entrevista ao Valor Econômico, Eu& Fim de Semana, 13, 14 e 15 de julho de 2012, p. 26.

Discordo da visão melancólica e pessimista da escritora inglesa. E você, leitor, o que acha?

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Mensagens



(c) RLBF



Nada como almoçar sozinho e ficar brincando com os saquinhos de açúcar na hora do café.

33:33


O relógio de rua marcava 33 horas e trinta e três minutos. Claramente defeituoso, algo costumeiro na cidade de São Paulo. Para muitos um simples erro, um defeito, um descuido da manutenção do mobiliário urbano; para mim, um convite a imaginar, inspiração urbana para uma realidade imaginária, uma provocação criativa.

terça-feira, 10 de julho de 2012

O fim do Mercosul? - I



A diplomacia prima pela cautela e pela análise ponderada dos fatos de modo a evitar decisões precipitadas e gerar conflitos que podem evoluir para confrontos bélicos.  A recente crise do Paraguai descambou para a bagunça em grande parte por culpa da atrapalhada chancelaria brasileira. Ou seria a rapidez na tomada de decisão mera cortina de fumaça para o alcance de outros fins?

Em artigo publicado no do dia 7 de julho de 2012, no Estado de São Paulo, Sergio Fausto revela que a aparente punição do Paraguai teve segundas intenções. A aparente preocupação democrática do Brasil foi só uma cortina de fumaça para interesses secundários.

Escreveu Sergio Fausto: “A questão não é só de política externa. Vale ler o artigo assinado pelo secretário-geral do partido [PT], Elói Pietá, publicado no site oficial da legenda logo após o impeachment de Lugo: A chamada do artigo é eloquente: ‘Mesmo com toda a sua força e grandeza, o Brasil também sofreu as tentações de um golpe do Congresso Nacional contra o Presidente Lula”.  Sobre o “neogolpismo das elites” o secretário-geral explica: “As elites ricas, onde hoje não controlam o Executivo, voltaram a ter no Parlamento Nacional seu principal ponto de sustentação institucional. Além disso, através da poderosa mídia privada, seu principal ideológico e voz junto do povo, elas continuamente instigam a opinião pública contra os governos populares”. 

A decisão brasileira de punir o Paraguai para premiar a Venezuela é tributária dessa visão de mundo. Uma é inseparável da outra.” (p. A2, sábado, 7 de julho de 2012).

A lógica é clara e cristalina. Bastava não se precipitar diante dos fatos que a conclusão se torna óbvia. Encontram um fato secundário (o impeachment de Lugo) para justificar a suspensão do Paraguai do Mercosul por meio de uma ginástica jurídica (cláusula do Tratado de Assunção que exige a manutenção da democracia nos países Membros), para justificar a acolhida ao companheiro Chávez e seu regime democrático que impera na Venezuela. A artimanha rasgou o Tratado de Assunção, revelou mais uma trapalhada da diplomacia brasileira e lançou ao ostracismo o Paraguai. A ordem jurídica vigente no Mercosul também foi violada pelas manobras dos companheiros, numa conduta pouco democrática, para ser, no mínimo, diplomático.