segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

O filhote da propina





Final de ano e a ladainha se repete. Uma infindável lista de generosos e eficientes prestadores de serviço batem à sua porta com cartões natalinos e pedidos de caixinha. Em qualquer padaria, cafeteria, lanchonete e no comércio em geral, pequenas caixas vistosas proliferam nos balcões e ao lado dos caixas. Os nomes podem variar. Alguns chamam de caixinha, livro de ouro, lembrança de natal, bônus, presente...todos, não importa o rótulo que lhe seja dado, são na verdade uma forma disfarçada de propina.

Sim, meus caros, não vou poupar nenhum deles com compaixão ou condescendência. Digo de forma clara: eu não dou caixinha! Acho um absurdo, um achaque, afinal você paga um valor adicional ao que você já pagou para que o serviço seja prestado de forma adequada. É obrigação do funcionário prestar o serviço para o empregador e prestá-lo bem! Se você deixar de pagar o empregador, o funcionário pode perder o emprego e aí você fica livre da caixinha.

A lógica é cruel, mas simples e verdadeira. Dar caixinha é sinônimo de pagar duas vezes pelo mesmo serviço. Se você se revolta com as operadoras de telefonia, com a banda larga que não entrega a velocidade prometida, com o banco que cobra tarifas abusivas, você não deveria dar caixinha.

Pensem um pouco: a caixinha é uma versão em escala micro do caixa 2, da propina da Odebrecht, da Camargo Correa, da Braskem, da OAS... Caixa 2 é toda aquela receita que a pessoa jurídica esconde para não pagar imposto. O prestador de serviço que recebe a caixinha de natal também não vai declarar ao fisco o recebimento, logo, haverá sonegação e você, meu amigo, pode ser considerado cúmplice desta conduta.

Tudo bem, ninguém vai te pegar, mas você já pensou que as duas condutas são análogas? Por que será que condenamos aqueles simpáticos senhores que estão passando uma temporada num aprazível presídio nos arredores de Curitiba e não condenamos o porteiro, o zelador, o manobrista, o entregador de jornal – aliás, profissão em extinção -, o gari, o entregador de água e a lista não acaba nunca.

Talvez eu esteja meio revoltado, talvez esteja me faltando espírito natalino, mas se o momento é de mudança no Brasil, devemos fazer nossa parte. E de minha parte, não dou caixinha para ninguém!

Sugiro que cada pessoa, ao invés de dar caixinha, doe o valor para uma instituição de caridade, uma ONG, uma entidade beneficente, um grupo na igreja. Há várias entidades que precisam de recursos para doar cestas básicas e itens básicos para famílias carentes que realmente precisam. Estes verdadeiramente precisam de uma caixinha de Natal! 


terça-feira, 22 de novembro de 2016

Conto: Olhar Furtivo



OLHAR FURTIVO


Foi ela quem primeiro puxou papo. No mundo conectado por aplicativos, solitários vagam pelos corredores e vitrines do mundo virtual usando seus celulares como instrumentos de caça. Feito o match, ela não tardou a chamá-lo. Ele preferia esta virtualidade, que domava sua timidez sufocante. Se a encontrasse num café, lendo um livro, sozinha, não puxaria assunto. Ficaria com medo, desviaria o olhar constrangido. Poderia ser considerado assédio, abuso, uma conduta inapropriada, não saberia nem como começar a conversar. Um simples "oi" poderia ser tido como ofensivo, ainda mais se ela fosse uma feminista, empoderada, daquelas que luta contra a cultura do estupro, que grita aos quatro cantos "meu corpo, minhas regras", que vê golpe em cada decisão judicial que reafirma a Constituição, que proclama "Fora, Temer", mas no fundo da alma, sente um desejo enorme de não pensar assim.

Foi ela quem soltou o primeiro "oi" e ele respondeu. Ela logou alertou: "sou de esquerda!". Assustou-se, mas aqueles olhos castanhos sorriam-lhe. Engoliu seco e deixou a serenidade tomar-lhe a alma. Ela pensava de forma diametralmente oposta à dele, mas havia algo que aplainava as ideias tão discrepantes. Em meio à ebulição política dos tempos de impeachment, ele foi cauteloso com as palavras. Evitaria temas políticos e tentaria decifrá-la. Marcaram um primeiro encontro.

 - Não gosto de italiano. Prefiro algo mais leve no almoço.

Versátil em termos gastronômicos, a culinária pouco lhe importava. Queria desvirtualizar a conversa e deixaria que ela escolhesse o lugar. A curiosidade, tão própria nas mulheres, estava aguçada e começara a montar, peça por peça, o perfil da bela mulher cujo caminho cruzava o dele.

Ela se atrasou. Ele tinha certeza que isto ocorreria. Errara o caminho, avisou pelo celular. A espera tem sempre o condão de aumentar a expectativa. Tentou manter-se calmo, composto, sereno, domando a ansiedade.

Quando ela chegou, apressada, desculpando-se pelo atraso, ele sorriu, "não tem problema, não tinha mesa, sentei faz pouco" - uma leve mentira para amenizar o atraso. Começou a narrar que havia subido a Consolação, ao invés de vir pela Campinas e que o trânsito na Santos estava horrível. Ele observava cada gesto, cada palavra, divertindo-se com as explicações dela como se ele fosse algum dignatário importante, mas para ele, quem fazia o favor de estar ali era ela a compartilhar com ele o almoço.

Deixou-a falar, contando do trabalho, das pesquisas, das viagens. Com olhar furtivo, quando ela mirava pela ampla janela do restaurante, ele reparava nos seus cabelos, no sorriso contido, nas unhas pequenas, nas curvas do rosto, nos óculos que ajeitava com charme natural. Discreta, contida, mas vibrante. Cada palavra era dita com intensidade, uma vivacidade que ultrapassava a mera vibração das cordas vocais e preenchia o ambiente com fogo. A indignação não se media pela frustração com o que destino lhe oferecia, mas em como teria de lutar para mudar o presente e assim construir um futuro muito diverso do atual.

Ela não discursava, falava com fluência e segurança, sorrindo de forma esporádica, com um toque melancólico. Talvez cética fosse a palavra mais adequada a descrever o estado de espírito dela. Estava desacreditada do que acontecia no país. Esbravejou contra a professora que lhe roubara o projeto de pesquisa sem a menor cerimônia e ele notou o desgosto disfarçado pelo discurso de fatalidade.

- Coisas do mundo acadêmico! - desabafou.

Percebeu que sentia enorme prazer naquele diálogo, em ouvir cada narrativa, cada reclamação, cada crítica, cada comentário. Manteve-se receptivo, mas muito reservado. Deixava o olhar ser seu único instrumento invasivo. Quando ela ajeitou os cabelos longos, perdeu-se por alguns segundos contemplando o ombro esquerdo desnudo, quando a blusa escorregou e revelou um pouco mais da pele. Imaginou a textura, o cheiro, a temperatura, mas logo se recompôs do devaneio que claramente seria inadequado a este encontro. Ao menos no primeiro encontro, pensou.

Na despedida, na calçada movimentada, barulhenta, poluída da metrópole, olhou-o nos olhos e disse com firmeza:

- Não vai sumir!

E abraçou-o, delatando o grito silencioso de fragilidade, a súplica que tentara esconder, mas que a mão acariciando as costas dele denunciavam. O enlace dos braços lhe dava um confortante sentimento de segurança, carinho e afeto que ele deixara transparecer e agora confirmava com o demorado abraço. A solidão se esvaia e o vazio era preenchido.

- Não vou sumir. - respondeu acolhedor. E ela, depois daquele encontro, mudou-se para a França.


quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Poesia: Entre flores

instagram @rbueloni


ENTRE FLORES

Sobre a mesa, flores
de sobremesa dores.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Quebrando barreiras


O vídeo é extramente ilustrativo e quebra barreiras do pensamento chapado que vem ganhando espaço em mentes obtusas.

terça-feira, 24 de maio de 2016

Águas passadas




Sonhei com você noutra noite. Sentada num canto de uma sala, sorria com um copo de vinho na mão. Mirava-me, silenciosa, mas transparecia uma alegria serena. De longe, olhei-te, sorri de volta, mas não acenei. Não iria tomar a iniciativa de abordar-te e romper teu desejo expresso no passado e de forma tão contundente. Tiveste força para me calar. Eu nunca calei tua voz dentro de mim. E vez por outra, como no acaso de um encontro casual, visitas-me com teu olhar distante e levemente melancólico, um olhar que sempre parecia gritar por socorro. 

Não queimei os poucos retalhos que guardei, não formatei o HD. Na verdade, o HD se autodestruiu, uma daquelas panes inesperadas que levaram junto arquivos, contatos, fotos, textos, memórias. Curioso como uma máquina é capaz de simplesmente apagar anos de trabalho que ali estavam armazenados. Voltei a confiar no meu HD mental, na memória que agora armazena variantes de gambitos, sicilianas e Ruy Lopez. A criatividade se desenrola num tabuleiro, onde tenho um pouco mais de controle sobre o que se passa. Quando algo dá errado, a culpa é só minha e de algum erro de cálculo. A vida tem suas inesperadas mudanças.

Acordei sem sentir saudades. O tempo passou, as águas correram e o sentimento se desfez. Ou talvez esteja apenas adormecido na noite fria que avança.

segunda-feira, 21 de março de 2016

Carlos Drummond de Andrade : Ontem


Pinacoteca de São Paulo, instagram @rbueloni


ONTEM

Até hoje perplexo
ante o que murchou
e não eram pétalas.

De como este banco
não reteve forma,
cor ou lembrança.

Nem esta árvore
balança o galho
que balançava.

Tudo foi breve
e definitivo.
Eis está gravado

não no ar, em mim,
que por minha vez
escrevo, dissipo.

(A Rosa do Povo. 7a. ed. Rio de Janeiro : Record, 1991, p. 58-9)

No Dia Mundial da Poesia, palavras de Drummond para que todos escrevam, dissipem e leiam poesia.

quinta-feira, 17 de março de 2016

Epígrafe - XXXV



"A los quince años me inicié en la enseñaza en una escuela rural, sola, sin familia. En ese ambiente impregnado de tristeza y de silencio empecé a escribir; él me hizo espiritualmente lo que soy. Su influencia definitiva en mi alma."

(Gabriela Mistral. Vivir y escribir. Prosas autobiográficas. Santiago de Chile : Ediciones Universidad Diego Portales, 2013, p. 99)

Este trecho foi escrito  por Gabriela Mistral em 1925. A poetisa chilena nasceu em 1889, em Vicuña, e ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1945. Faleceu em Nova York em 1957.

O ambiente rural é descrito como duro, áspero, triste. Não é nada bucólico, nem leve. O trabalho no campo é pesado. Os alunos, pode-se imaginar, deviam frequentar a escola apenas por alguns anos e depois abraçavam no trabalho no campo para ajudar as famílias. O dinheiro curto. A diversão inexistente. Gabriela Mistral mergulha no mundo melancólico de sua adolescência e transpõe tudo para sua escrita, para sua poesia.

A tristeza, a dificuldade forjam o caráter, lapidam a alma e dão fortaleza àqueles que não sucumbem diante dos infortúnios e dos percalços do caminho.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Chavões


instagram  @rbueloni


Todo carnaval tem seu fim
assim como o amor.

Todo carnaval tem seu fim
diferente de governos corruptos.

Todo carnaval tem seu fim
assim como as estações do ano.

Todo carnaval tem seu fim
diferente dos bons momentos armazenados na memória.

Todo carnaval tem seu fim
assim como as longas férias.

Todo carnaval tem seu fim
diferente da aposentadoria integral do servidor público,
com todas as benesses e vitaliciedade.

Todo carnaval tem seu fim
e agora é hora de trabalhar,
pois o ano tem que começar!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Na passarela do samba






O sol ainda ia alto na tarde que avançava com algumas nuvens amendrontadoras a surgir lá pelo lado da zona norte, quando saí de casa rumo a um ponto de encontro num bairro da zona sul paulistana. Um grupo de pouco mais de trinta pessoas abraçaria a aventura de desfilar numa escola de samba, o Grêmio Recreativo Cultural Social Escola de Samba Unidos do Peruche. Eis o nome pomposo e completo de uma agremiação sambística. No nosso grupo,  um holandês, um suíço e paulistanos de origem e rostos variados, a maioria sambistas de primeiro desfile.

Seria meu primeiro desfile numa escola de samba, pela primeira vez a entrar no sambódromo do Anhembi, na passarela do samba. Memorizei o samba-enredo, li sobre o enredo, mas não fui a nenhum ensaio e nem pus os pés na quadra da escola na zona norte. Aceitei o convite, mas avisei que estava com uma agenda complicada para participar de ensaios. Comprometi-me a fazer a tarefa mínima: pagar pela fantasia, decorar o samba-enredo e estar em condições físicas de ajudar a escola. Tinha a doce ilusão de que seria mais um daqueles itens a marcar na longa lista de “1000 coisas a fazer antes de morrer”. Tudo bem, não é a Marquês de Sapucaí, mas é o GRCSES Unidos do Peruche, um integrante do Grupo Especial do Carnaval de São Paulo. Convenci-me de que o desfile contaria como válido para a lista.

No ponto de encontro, o salão de festas havia se transformado num camarim de teatro, nos bastidores de uma companhia mambembe em preparação para o espetáculo. O samba-enredo tocava nos alto-falantes oriundo de um telefone celular. A modernidade auxiliando na preparação. O clima descontraído, divertido, alguns cantando, outros ensaiando e repassando a coreografia de uma das alas. Neste momento, dei-me conta da grandeza da tarefa de organizar um desfile e aquela sensação só iria se aprofundar ao longo da noite que viria. As fantasias, ainda que de material simples, eram bem acabadas e elaboradas com dedicação e amor por todo um enorme grupo de pessoas apaixonadas pela Peruche.

A palavra “Comunidade”, que me lembro de ter ouvido pela primeira vez numa daquelas aulas de Estudos Sociais lá no 2o. ano do ensino fundamental, ganhava vida e vigor, uma nova perspectiva. Em qualquer desfile de escola de samba, talvez comunidade seja o vocábulo mais falado por todos os envolvidos, comentaristas, puxadores de samba, letras de samba, diretores de escola. Há uma sobreposição entre a comunidade e a escola, quase uma confusão de ambas. A escola é a manifestação física da comunidade, uma forma de demonstração do que a comunidade é capaz de fazer, ainda que os recursos sejam escassos e as dificuldades imensas. Descobriria, mais tarde, que ao vestir a fantasia da ala “Boemia”, por alguns momentos, passaria a integrar o exército da comunidade, ainda que na qualidade de soldado mercenário.

Um ônibus partiu às 17:30 rumo à quadra da Peruche. Os neocarnavalescos entoavam o samba com animação, o que mais parecia um ônibus de torcida organizada ou talvez um grupo de jovens escolares em uma excursão. Numa São Paulo sem trânsito, o ônibus foi limitado apenas pelo absurdo limite de velocidade imposto pelo prefeito Fernando Haddad, que – esperamos – inicia seu último ano de mandato.

A parada na quadra era necessária para que nos juntássemos ao comboio de ônibus credenciados com acesso direto ao Anhembi e para que as últimas fantasias fossem ajustadas. Um temporal desabou enquanto esperávamos a partida rumo ao destino final. A espera foi um pouco cansativa e suficiente para reduzir os níveis de adrenalina e amenizar a empolgação do grupo. O clima, porém, permanecia em ebulição. Com a parada da chuva e a temperatura mais amena, era hora de partir para o sambódromo. Passava das 21 horas e o início do desfile estava previsto para as 22:30.

No Anhembi, a chegada foi tranquila e agora era necessário localizar o chefe de ala para pegar o costeiro que complementava a fantasia e alinhar na ordem correta de entrada na avenida. A organização novamente me surpreendeu. Os chefes de ala uniformizados com a camisa da agremiação, calça branca e sapatos brancos eram fáceis de localizar. O costeiro era maior do que imaginava. O peso não incomodava, mas era grandioso e ampliava o espaço lateral do corpo não permitindo passar por espaços pequenos sem esbarrar em pessoas. Na área que antecedia a concentração, grupos de iguais se formavam, fantasias de cores variadas e em cada setor uma cor predominava. A ala Boemia trazia chapéus azuis, uma camisa listrada de azul e branco na horizontal, calça branca e um costeiro preto que lembrava uma clave de sol e penas azuis na parte superior. Diante de nós, uma ala toda vermelha e atrás uma ala onde o verde claro era a cor predominante.

Aos poucos, a ala ganhou corpo com todos os integrantes prontos. Diretores de ala checavam as fantasias, ajustavam costeiros, davam instruções preliminares. Então, começamos a andar em direção à concentração. Um diretor passa por entre as alas, vestido de terno azul, falando com voz forte e dando a palavra de ordem: “Superação! Superação Peruche! A palavra é superação comunidade!”. Alguém grita o nome da escola e a massa repete em coro, uma torcida animada, um time pronto para entrar em campo.

A caminhada cessa na área da concentração, onde é possível contemplar a grandiosidade dos carros alegóricos, muito mais belos ao vivo do que retratados na televisão. Os puxadores de samba ainda não iniciaram o esquenta. Um telão mostra que ainda é horário de BBB. Um chefe de ala informa que serão fileiras de 8 pessoas e que é preciso ficar alinhado. Ele cumprimenta um a um, cada integrante da ala, pedindo garra, vontade, que todos cantem o samba, que todos sorriam. Alinhamos como um batalhão de exército, uma tropa pronta para a batalha.  Senti-me um soldado, já vestido de armadura e pronto para lançar-me no campo de batalha, de peito aberto, como aqueles escoses liderados por Mel Gibson em Bravehart (Coração Valente). O sentimento era de pertencimento, ali, naquela hora, você faz parte da comunidade, você é uma peça daquela engrenagem que se chama escola de samba.

O presidente faz um breve discurso, chamando todos para o desfile, convocando seu séquito para dar o melhor de cada um, para lutar na avenida pelo pavilhão da escola. Segue-se o puxador oficial da escola a conclamar todos com o esquenta, a cantar sambas de outros carnavais. Um arrepio percorre toda a espinha. A emoção toma conta e contagia toda a escola que começa a cantar o samba enredo de 2016.

Firma o pandeiro e o tan-tan
Tem samba até de amanhã
E a nação perucheana faz a festa
O meu batuque ecoou
Um lindo canto de amor
A filial chegou


O refrão é repetido e será repetido por dezenas de vezes até o final do desfile. Não sei quantas vezes cantei o samba, mas dois dias depois do desfile, acordo com o samba na cabeça, a ecoar mentalmente no aparente silêncio da pauliceia em dias de carnaval. A bateria e sua batida, o ritmo contagiam de forma única e inebriante. Não há cansaço, ou calor, ou fome que impeçam a entrada no palco com energia total. Uma imensa alegria inunda o corpo e o espetáculo começa. Desta vez, você é o artista, você é o espetáculo, ou parte do grande espetáculo, mas cuja performance é essencial para o todo, para o triunfo da comunidade.

O tempo na passarela é curto. Pouco mais de vinte minutos e acaba. A missão foi cumprida. O cansaço só é sentido depois da dispersão. Só na dispersão você olha para trás e vê um enorme carro alegórico que lhe seguiu por toda a avenida, mas não se olha para trás durante o desfile. Observo por alguns instantes a parte do desfile que não vi, as alas que estavam na parte final da escola, com um sentimento de realização, de alegria e de poder ter contribuído um pouco com a escola e a comunidade.

No ano que vem voltarei.  Agora é aguardar a apuração e torcer. Quem sabe não voltamos no desfile das campeãs?