sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Crônica: Dia de chuva



DIA DE CHUVA


A chuva contínua, desde a noite do dia anterior, fez com que seu dia começasse de forma pouco interessante. Consumido pela rotina, cansado pelas longas horas das últimas semanas – o que era típico no final de ano -,  amuado pela cobrança no trabalho e pelo aperto de tempo diante dos prazos e metas, a terça-feira começara pouco promissora. Mecanicamente cumpriu o ritual matutino. O rosto espelhava a falta de ânimo; os gestos se arrastavam em câmara lenta; as palavras escapavam-lhe da boca, quase que derramadas, sem qualquer firmeza e contundência. Só em pensar no trânsito daquela manhã, a vontade de  ficar em casa lhe tentou.  

Estoicamente, pensando unicamente no dever, deu início à sua jornada. Não havia motivo real ou concreto para sentir a tristeza lhe dominar. Lembrou das palavras da mãe que costumava dizer que “fulano está triste como dia de chuva”. Dias de chuva eram tristes, macambúzios, sombrios. O tilintar dos pingos não lhe diziam nada, não embutiam a poesia vislumbrada por poetas, nem indicavam um desejo de aconchego no lar ou num cantinho quente e iluminado.  Tolerava os dias de chuva, mas não os queria bem.

A chuva foi o cenário do seu trajeto até o trabalho. Dia cinza de trânsito lento e congestionado. Porém, o calor dera uma trégua e não precisou ligar o ar condicionado do carro, algo pouco usual para o mês de dezembro. Enfim, preferia o sol.

Passou pela portaria do prédio para pegar o jornal e recebeu um envelope pardo do tamanho de meia folha de papel. Pensou ser alguma encomenda de alguém do escritório, mas ao ver seu nome escrito e identificar o remetente, rapidamente seu semblante se transformou. Abriu cuidadosamente o envelope enquanto caminhava pelo hall do prédio, quase tropeçando no cinzeiro perto da porta do elevador. Era um livro! Um livro de poesias e uma pequena mensagem. Leu e releu a mensagem, detendo-se sobre o nome que assinava aquele gesto carinhoso.

O silêncio matutino foi quebrado som de sua voz  agradecendo em voz alta. Falava sozinho. Mesmo sabendo da distância, ele agradeceu com empolgação. Folheou o livro. Deteve-se em um e outro poema. Depois mais um e mais outro. Aquele pequeno envelope pardo havia trazido o sol de que tanto precisava. O sol que sempre se apresentava nestes momentos e que mais uma vez havia espantado a chuva interior.


Nenhum comentário: