terça-feira, 27 de março de 2012

Conto: Sonho Mudo


Sonhei com você esta noite. De novo. Não canso de me espantar com a frequência com a qual sonho com você; ou melhor, com a constância que vens me visitar no silêncio da noite. Mais do que me espantar, gosto de tuas visitas noturnas, na calmaria da madrugada, quando todos repousam, alguns rodopiam na cama digladiando com a poderosa insônia e outros apenas dormem sem lembrar do que sonharam.

Eu sonho. Lembro dos meus sonhos e muitas vezes te conto o filme que esteve em cartaz na minha exclusiva sala de cinema. Estiveste em cartaz com filmes mudos, poucas vezes em branco e preto, e muitas vezes sorrindo, chamando-me, alertando-me de algo que não notara quando desperto. 

No mais recente curta - ou talvez longa, não sei ao certo, pois o tempo parece ser muito efêmero nos sonhos -, o silêncio perdurou. Estávamos numa mesa com outras pessoas. Era um jantar num restaurante ou bar. Por debaixo da mesa, cutucou-me com seu pé. Não era uma carícia sensual ou sedutora, mas um toque, uma "cutucada" para me alertar da sua presença. Talvez quisera chamar minha atenção; talvez quiseste me afastar de outras conversas ou outras pessoas na mesa; talvez manifestara um discreto e delicado ciúme. Não sei ao certo. Sei que me chamava com o toque do seu pé por debaixo da mesa, a dizer-me que queria minha atenção, que olhasse para você e fosse agraciado com aquele sorriso tão seu, com a forma de dizer-me mil coisas apenas com o brilho do teu olhar. 

O sonho deve ter sido realmente curto, apenas uma cena, mas rica em detalhes, vibrante. Acordei sentindo tua falta, sua ausência. E alguma vez acordei ao seu lado? Não importa que fisicamente jamais tenha compartilhado o mesmo leito contigo, mas mentalmente sempre me recolho ao teu lado. E quando vens me visitar na temperatura amena da madrugada, desperto ao teu lado, com o pensamento vivo e o espírito sorrindo docemente.

Nestas horas, tenho a certeza de que o físico é pouco para o desejo da alma humana. O físico pode viver de aparência, de disfarces, de enganos. O interior não se deixa enganar. O inconsciente revela de forma sincera o sentimento e o que nutro por ti. Sonhos podem até ser aparentemente mudos, mas são na realidade eloquentes e convincentes. Quando dou voz aos meus devaneios inconscientes, quando compartilho aqueles momentos de delírio, a mudez do sonho evapora e a música de fundo invade o filme com uma trilha sonora poderosa e constante. 

Sonhar não custa nada, brada o samba e sobre os sonhos não temos controle. Ah, mas como é bom sonhar contigo! E peço que o universo sempre conspire para que suas visitas secretas continuem a alegrar minha pequena sala de cinema. Mudo ou com som, não importa; importa a protagonista do filme.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Morre o inquieto Antonio Tabucchi


Antonio Tabucchi era esperado na FLIP 2011.  Desistiu de comparecer em repúdio ao fato do Brasil ter rejeitado a extradição de Cesare Battisti, italiano condenado por crimes comuns, mas que o Supremo Tribunal Federal entendeu como perseguido político. A decisão de Tabucchi revela sua coerência e fortes posições políticas. A decisão foi criticada por alguns, mas para quem conhece a obra de Tabucchi, fica muito fácil compreender sua atitude.

Tabucchi morreu ontem em Lisboa, aos 68 anos, depois uma batalha contra o câncer, como noticiou o Estadão

O tempo envelhece depressa foi sua última obra publicada no Brasil e comentada neste blog no início de 2011 (o post pode ser lido aqui). Nesta coletânea de contos, Tabucchi trata da memória, da passagem do tempo, do envelhecimento, do perdão. Contos que indicam o cosmopolitismo e multiculturalismo do escritor, algo facilmente notado nesta última obra.

Antonio Tabucchi é um dos escritores italianos atuais mais importantes. Era professor de literatura e ao deparar-se com um poema de Fernando Pessoa, encantou-se. Estudou português para poder ler e apreciar a obra do poeta em sua língua original. Além de escritor, crítico e ensaísta, traduziu a obra de Fernando Pessoa e Carlos Drummond de Andrade para o italiano.


quarta-feira, 21 de março de 2012

Receituário para ler poesia


A poesia deve ser lida em dia de sol, mas também pode ser lida em dia de chuva.

A poesia deve ser lida em dia de céu azul, numa tarde quente de verão, preguiçosa, numa varanda ou à beira-mar. Mas também pode ser lida num dia frio de inverno, à beira de uma lareira aconchegante, enrolado num cobertor. Ou quem sabe numa manhã fresca de outono ou num dia primaveril.

A poesia deve ser lida em companhia de uma xícara de café, ou de chá, ou de mate gelado, ou de um licor bem doce, ou de um vinho especial, ou de whisky ou de água, ou sem qualquer bebida e acompanhamento.

A poesia deve ser lida sóbrio, ou embriagado.

A poesia deve ser lida com espírito elevado, repleto de alegria e felicidade; ou quando se está na fossa, triste, deprimido, amuado, calado. O silêncio é um bom convite para ler poesia, mas a festa e a música também combinam com versos soltos.

A poesia deve ser lida sempre. Dependendo do espírito, do dia, do ambiente, ela terá uma mensagem própria. As palavras falarão e te farão sorrir ou chorar. A poesia sempre fala, como um longo e demorado abraço que mais parece um beijo. Por vezes, ela grita, basta ter ouvidos. Mas geralmente fala ao âmago, à alma recolhida no silêncio, contemplativa, aberta. A poesia torna a vida mais doce, mais colorida. A poesia revela e traduz a beleza da vida.

No dia 14 de março comemorou-se o dia nacional da poesia. Experimente, pegue um livro de poesia, abra aleatoriamente e leia. Deixe os versos falarem. Poesia se lê guiado pela alma!

quinta-feira, 8 de março de 2012

No dia da mulher


O homem é o rascunho de Deus; a mulher, a arte final.

Parabéns a todas as mulheres maravilhosas que transformam os nossos dias e noites!

quarta-feira, 7 de março de 2012

Manhã paulista



Sol nascendo num dia de final de verão, o diário espetáculo gratuito da natureza.

domingo, 4 de março de 2012

Oficina Literária de Contos e Crônicas


Ainda dá tempo de fazer a inscrição em mais uma turma do Terapia da Palavra. Solte a criatividade e dê asas às suas palavras. 

quinta-feira, 1 de março de 2012

Brasil abestado


Responda rápido: qual a função do Ministério da Pesca?

O leitor inteligente provavelmente responderá algo como desenvolver a indústria pesqueira no país, incentivar a aquicultura comercial, apoiar os pescadores no período do defeso ou outras épocas de proibição legal da pesca e por aí vai. 

Todas as respostas acima estão erradas. O Ministério da Pesca e da Aquicultura foi criado para servir de moeda de troca para conquistar apoio para o governo. Em outras palavras, é um belo cabide de emprego concebido pelo ex-presidente Lula. Ontem o cabide foi preenchido por um novo ocupante, o senador carioca Marcelo Crivella. Sua primeira declaração sobre a intimidade com o setor foi: "Não sei colocar minhoca em anzol." 

Crivella conhece bem a multiplicação dos pães e dos peixes, agora vai tentar realizar o milagre da multiplicação dos cargos públicos, algo que não é milagre nos últimos 9 anos de governo lulista.


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Continuando nosso tour pelo Brasil abestado, o atual ministro da Educação mostrou toda sua sensibilidade e vontade de trabalhar ao declarar perante o Senado que "o MEC não tem culpa de o Brasil ser tão grande e tão diverso." (a notícia inteira pode ser lida aqui e os comentários do Reinaldo Azevedo aqui

A desculpa esfarrapada de Mercadante não me surpreende. Ele é um daqueles pseudo intelectuais do PT que só se destacou porque a maioria dos seus companheiros não chegou ao ensino superior. Mercadante é um mestre em falar besteira. A frase é de uma estupidez inigualável e uma justificativa para não fazer nada, além de confissão de sua incapacidade para resolver o problema - ou ao menos tentar.

O MEC, sob a batuta de Fernando Haddad, reformulou a legislação do ensino superior no Brasil, com claro retrocesso e centralização. Os cursos de especialização indenpendentes com autorização da Secretaria de Ensino Superior foram proibidos. O MEC obriga agora os cursos de especialização a estarem vinculados a uma faculdade que ofereça cursos de graduação. A miopia é gritante. Graduação é muito diferente de especialização (pós-graduação lato sensu). Por trás desta suposta política democratizante, está um lobby de donos de faculdades fracas, verdadeiras indústrias de diplomas, mas que formam pessoas com nível fraco, basta ver os resultados dos exames da OAB.

Mercadante não tem política para educação, não conhece o setor e não tem proposta. Colocar tablet na mão de professor não resolve o problema. O problema é salário e capacitação para o professor. Professor motivado reflete na melhoria de desempenho dos alunos.

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Por fim, o maior representante do Brasil abestado, o Deputado Federal Tiririca lançou-se como candidato à prefeitura de São Paulo. Preciso dizer algo!

Quero ver um debate entre Chalita, Tiririca, Fernando Haddad, Celso Russomano e Serra. Ah, ia me esquecendo, tem a Soninha também, mas ela vem de bicicleta.