Não sou crítico literário, mas apenas um leitor que se delicia com literatura e procura um melhor conhecimento do ser humano através dos livros. Trago aqui um trecho de A Morte de Ivan Ilitch, de Tolstói, que comentei brevemente no post anterior. Este trecho é só um aperitivo para que o leitor se interesse pela obra.
"A maioria dos assuntos de conversa entre marido e mulher, sobretudo a educação dos filhos, levava a questões sobre as quais havia lembrança de dissensões, e a cada momento podiam deflagra-se brigas. Sobravam apenas uns raros períodos de paixão, que às vezes assaltavam os esposos, mas que duravam pouco. Eram ilhotas, às quais eles atracavam por algum tempo, mas depois novamente se lançavam ao mar da hostilidade oculta, que se manifestava no afastamento entre eles. Esse afastamento poderia magoar Ivan Ilitch, se ele não julgasse que tudo devia ser realmente assim, mas ele já considerava esta situação não só normal como também o objetivo da sua atuação na família. O seu objetivo consistia em livrar-se cada vez mais dessas contrariedades e dar-lhes um caráter de inocuidade e decência; e alcançava-o passando cada vez menos tempo com a família, e, quando não conseguia evitá-lo, procurava garantir a sua situação com a presença de pessoas estranhas. (...)"
(Tradução de Boris Schnaiderman. São Paulo : Ed. 34, 2006, p. 26)
A amargura deste relato, a distância e a solidão permeiam toda a vida de Ivan Ilitch. Tudo isto se desenvolve com amigos de aparência e culmina com uma doença que o levará à morte.
Poderíamos dizer até que espiritualmente, Ivan Ilitch já morreu. Antes que a vida deixasse seu corpo, já era um morto, entregue e abandonado, sem forças para lutar e reencontrar a alegria. Encontra uma companhia sincera em de seus criados, que o acompanha nas noites e no sofrimento. Alguém que o ouve, que lhe tenta amenizar o sofrimento. Os outros "amigos" não tem mais interesse em conviver com Ivan Ilitch. E ao saberem de sua morte, começam a confabular sobre qual deles irá assumir o cargo público de Ivan Ilitch.
Tolstói traça uma realidade sombria, onde não há espaço para amizade sincera, para um amor vibrante, mas somente interesses e egoísmo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário