O comentário da
Edna - que ela chamou de longo -, no post
Fechando o Círculo, provocou uma sequência ao assunto do silêncio.
Retomo o assunto pelo comentário e para mencionar o último livro de Lya Luft, O Silêncio dos Amantes, que será lançado pela Editora Record neste final de semana e objeto de artigo de Ubiratan Brasil no Estadão de 10 de abril (Caderno 2, p. D-14). A temática dos últimos posts não foi inspirado no livro de Lya Luft, mas no livro de Milton Hatoum. O comentário - e comentários longos têm o benefício de incitar o debate, coisa que adoro, pois o blog passa a ser um diálogo e não um monólogo - coincidiu com o recente lançamento, o que revela uma preocupação com o tema. É a arte discutindo a vida.
O trecho transcrito no Estadão parece repetir exatamente o que sugeriu a Edna - e antecipo que concordo. Eis o trecho de Lya Luft:
"Sem que eu soubesse, as coisas não ditas haviam crescido como cogumelos venenosos nas paredes do silêncio, enquanto ele ficava acordado na cama, fitando o teto, como branco dos olhos reluzindo na penumbra. Se eu o interrogava, o que você tem amor? ele respondia que não era nada, estava pensando no trabalho. A gente sabia que era mentira, ele sabia que eu sabia, mas nenhum de nós rompeu aquele acordo sem palavras. Nunca imaginei o mal que o roía. Era impossível qualquer coisa tornar a morte algo melhor do que tudo tínhamos. Isso era o que eu achava. Ele também falava pouco no passado, a infância numa cidadezinha do interior, o monte de irmãos, os pais morrendo cedo, ele responsável pelos menores. Haveria ali, com uma raiz venenosa, alguma coisa tão triste que o levava a querer morrer?"
Cogumelos venenosos nas paredes do silêncio é uma belíssima imagem para o silêncio que corrói, que desarma, que mina o relacionamento. Talvez tenha me precipitado, e só agora possa efetivamente fechar o círculo. Esqueci de falar do silêncio negativo, do silêncio que destrói. De fato, o silêncio, quando se instala num relacionamento, ele tende a ser muito espaçoso, tão espaçoso que afasta os envolvidos.
Vejo duas vertentes deste silêncio. O primeiro é o silêncio causado pela semelhança de pensamento, por pessoas que pensam igual, e que se entendem somente com um olhar. Tive um sócio com o qual conseguia conversar somente olhando. Eu sabia o que ele estava pensando e isto sempre funcionava muito bem em negociações e reuniões. Exatamente por pensarmos igual, acomodamo-nos. O comodismo se instalou e ocupou seu espaço minando as frequentes conversas. Um certo dia, a coisa estourou. Confesso que não tinha visto a situação desta forma tão racional até refletir sobre o silêncio para escrever este post.
Uma outra forma, mais comum num relacionamento afetivo, é o silêncio que decorre de subestimar o parceiro. Um deixa de dar valor ao que o outro fala, deixa de escutar, deixa de pedir a opinião. As decisões deixam de ser conjuntas e passam a ser meramente informadas. As tentativas de vencer esta barreira, de falar sem ser ouvido, tendem a cansar um dos envolvidos e o silêncio adentra a relação sem ser convidado. Com a rotina, o silêncio se alastra e vai criando raízes, novamente afastando os parceiros. É a falta de comunicação a que Lya Luft se refere como problema abordado em seu novo livro.
Um tema que pode ser visto na realidade de tantos casais. Um tema que é objeto de livros e de crônicas - inclusive neste blog. Um tema que vai continuar a nos intrigar e despertar reflexão. E esta reflexão para ser feita, exige o silêncio, mas o silêncio bom!