"Uma palavra carinhosa é capaz de aquecer três meses de inverno"
Provérbio Japonês
Uma lista de locais para entrega de doações está disponível no UOL.
Para contribuições em dinheiro, transcrevo a informação do blog do Reinaldo Azevedo:
"A leitora Cris, freqüentadora deste blog, faz-me um pedido justo: que divulgue os números das contas correntes abertas pela Defesa Civil de Santa Catarina para receber doações. São eles:
Banco do Brasil – Agência 3582-3, Conta Corrente 80.000-7
Besc – Agência 068-0, Conta Corrente 80.000-0.
BRADESCO S/A - 237 Agência 0348-4, Conta Corrente 160.000-1
O nome da pessoa jurídica é Fundo Estadual da Defesa Civil, CNPJ - 04.426.883/0001-57."
No rosto sisudo, desenha-se um arco invertido. Os cantos dos lábios curvam-se diante da leitura de algumas palavras, qual meia lua no céu profundo e negro. Palavras singelas, mas carregadas de ternura. A tensão natural dos músculos dissipa-se de forma inesperada. O sorriso se alarga. Transforma-se em gargalhada contida. Ri sozinho. Relê aquelas palavras e imagina o sorriso distante que provoca uma onda de alegria. Na metrópole cinza, a aquarela tinge tudo com cor e formas inesperadas. Traços largos do pincel. Cores vivas e vibrantes contrastam com a poluição, o trânsito, o caos diurno da paulicéia em início de dia.
O sorriso transporta para longe aquele motorista. Solitário no carro, o som do riso preenche todos os cantos do veículo. Desliga o rádio e deixa o riso como trilha sonora para começar um dia. Um dia que dá seus primeiros passos de forma surpreendente. Um dia que se inicia inspirado por alguém que dividiu com ele a alegria. E o sorriso belo e cativante. Não há distância, nem obstáculo para um sorriso. Ele viaja pelas ondas do espaço, como uma semente levada pelo vento e vem a pousar no seu rosto. O rosto de um homem sorridente e contagiado pelo feitiço de uma semeadora.
A reportagem é da coluna Avant-Première do caderno de Fim de Semana do Valor Econômico. Quem assina é João Bernardo Caldeira e Robinson Borges. Comento no final.
"Cor-de-rosa
A visita aos museus paulistas é um programa majoritariamente feminino. É isso o que constata uma pesquisa do Observatório de Museus e Centros Culturais realizada em 13 instituições de São Paulo. O levantamento mostra que 62% de seus visitantes são do sexo feminino. No Rio, entretanto, um estudo similar identifica que em alguns museus o público masculino chega a ser superior ao feminino.
Fala garoto!
Dos 13 museus de São Paulo investigados pelo Observatório, o Museu de Arte Moderna (MAM) foi o que recebeu público mais jovem, com maior presença de visitantes entre 15 e 19 anos (18,4%) e de 20 a 24 anos (27,7%).
Canudo
A pesquisa verificou ainda que os visitantes de museus têm escolaridade acima da média da população em geral: 79,9% têm ensino superior completo ou incompleto, sendo 14,2% deles com pós-graduação. Na Região Metropolitana de São Paulo, apenas 17% da população têm superior incompleto ou completo."
Sintetizando: quem vai a museu em São Paulo é quem tem maior nível de escolaridade, e por conseqüência, maior poder aquisitivo. Isto pode ser visto como um diagnóstico interessante: há necessidade de maior divulgação dos museus para o público de escolaridade mais baixa. Importa não só divulgar, mas também criar visitas guiadas para explicar mostras e exposições. Muitas pessoas sentem-se inibidas de visitar um museu porque acham que não vão entender o que ali se encontra. A divulgação e a informação poderiam inverter os percentuais de visitantes encontrados na pesquisa.
Outro ponto que parece óbvio: quem tem mais conhecimento e informação, busca sempre mais conhecimento e aperfeiçoamento. Pessoas com nível superior completo ou incompleto são mais curiosas e destemidas na busca de cultura. Trata-se do "consumidor" tradicional de cultura, em todas as suas versões. É este o público que lê, que ouve música, que visita exposições de arte, que vai a museus.
A pesquisa mostra que a disponibilidade de cultura existe para toda a população, mas muitos se desinteressam por ela. Uma ampla campanha de divulgação nas escolas públicas, por exemplo, poderia atrair um novo público aos museus, que por sua vez, teria sua curiosidade aguçada. Este "despertar" da curiosidade pode conduzir o jovem a continuar seus estudos e buscar mais informação. A democratização da cultura tem uma contribuição fundamental na criação de um círculo virtuoso de aumento da escolaridade da população brasileira.
VIA APPIA, de Cecília Meirelles.
Pedras não piso, apenas:
- mas as próprias mãos que aqui as colocaram,
o suor das frontes e as palavras antigas.
Ruínas não vejo, apenas:
- mas os mortos que aqui foram guardados,
com suas coragens e seus medos da vida e da morte.
Viver não vivo, apenas:
- mas de amor envolvo esta brisa e esta poeira,
eu também futura poeira noutra brisa.
Pois não sou esta, apenas:
- mas a de cada instante humano,
em todos os tempos que passaram. E até quando?
(Canções. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2005, p. 78-9)
Abraço a brisa da vida, envolvendo-a com amor e transformando cada instante em algo humano. Este "algo" humano que se manifesta em coisas singelas, em pequenos momentos de compreensão – ainda que não se expresse a necessidade de um abraço ou de um colo -, em gestos e sorrisos, em toques no ombro, em abraços apertados, em sorrisos desinteressados, em beijos no rosto, em segurar as mãos sem contar os segundos ou minutos, em correr atrás de uma borboleta, em levantar uma criança do chão para que ela posse ver mais longe, em agradecimentos desnecessários, em lágrimas que escorrem despertadas por aquela música – ou aquele texto -, em sonhos que nos visitam nas horas mais silenciosas...
O humano é dimensão da nossa dignidade única e incomparável. O humano está na nossa essência, que muitas vezes olvidamos ou afogamos. "Pois não sou esta, apenas: / - mas a de cada instante humano, / em todos os tempos que passaram. E até quando?" Somos a soma destes incontáveis instantes humanos, capazes de mudar uma vida e todas as outras que tocamos com nossa humanidade.
"O destino costuma estar na curva de uma esquina." (p. 188)
"Mas os anos passaram em paz. Quanto mais vazio está, mais rápido o tempo passa. As vidas sem significado passam ao largo como trens que não param na estação." (p. 354)
(A Sombra do Vento, de Carlos Ruiz Zafón.)
Vazio. Desprezo. Esquecimento. Todos estes sentimentos poderiam descrever a solidão, sem, porém, captar toda a sua dor. A solidão é árida como um deserto, fria como uma paisagem gelada, invisível como o ar. A solidão é um punhal que se aprofunda na carne a cada movimento, a cada dia, a cada gesto. A solidão transforma o silêncio em algo ensurdecedor, como se a música mais odiosa estivesse ligada no mais alto volume. A solidão definha, amarfanha, corrói todo o ser.
O vazio trazido pela solidão leva a um caminhar sem rumo. Passamos a ser passageiros sentados num banco do ônibus indiferentes à paisagem que nos rodeia e entregues ao destino que o condutor nos traça. O ponto final da jornada pode chegar quando o ônibus pára; ou podemos despertar do transe ao olhar para fora da janela do veículo e captar um brilho. Uma luz que emana de um olhar de um transeunte, de alguém que ao acaso encontra-se na curva de uma esquina. O destino nos arrebata e fulmina de morte a solidão.
O campo árido, regado pela chuva, rejuvenesce e brotam os primeiros sorrisos que dissipam a solidão. Drummond, com toda sua lucidez de interpretar a vida e os sentimentos, escreveu:
"Onde não há jardim, as flores nascem de um
Secreto investimento em formas improváveis."
Formas improváveis trazidas pelo destino. Um sorriso. Um pingo de luz notado num olhar sincero. Uma palavra carinhosa. Um simples cumprimento que nos valoriza, que nos revela que somos notados e importantes. Um sotaque aparentemente irritante se transforma em música para os ouvidos. Música que mexe com alma. Voz que mexe com o coração. Palavras que seduzem. Risos que inebriam, contagiam, que se multiplicam em dias, meses, anos...momentos inesquecíveis, rememorados nas horas de escuridão e aflição.
A solidão se dissipou. Tudo obra mágica de alguém que estendeu a mão e conduziu-me para fora do ônibus. Tudo obra de um coração precioso, de uma alma iluminada, de uma semeadora de sorrisos.
Certa vez recebi um cliente indiano em São Paulo. Ele vinha ao Brasil pela primeira vez e perguntou-me se havia violência religiosa no Brasil. Respondi de forma negativa. Aquela pergunta fez-me pensar na questão social brasileira e suas características peculiares. No Brasil, convivem em paz judeus e muçulmanos, católicos e protestantes, brancos e negros, além de toda uma gama enorme de imigrantes que adotaram este país como sua morada. Não estou negando a existência de violência ou preconceito nas várias camadas sociais brasileiras, mas a violência existente nas grandes cidades é semelhante à que existe em toda grande cidade do mundo.
Se voltarmos aos anos 1960 e 1970, período mais intenso da ditadura militar, notaremos que o modus operandi da ditadura era diferente da que existiu em outros países latino-americanos. No Chile e na Argentina, os tempos de ditadura foram muito mais agressivos e violentos do que no Brasil. Muitos foram torturados e mortos pelos respectivos regimes. Brasileiros morreram no período da ditadura, mas em número significativamente menor do que nestes outros países. Foi uma época negra da história que foi cicatrizada com a Lei de Anistia.
A Lei de Anistia, ampla e irrestrita, permitiu indenizar as famílias das vítimas, apaziguou ânimos e fechou feridas. O tempo encarregou-se de tornar a cicatriz quase imperceptível, sem necessidade de uma cirurgia plástica. Passados 30 anos, alguns ministros do atual Governo tentam reabrir estas feridas. Trata-se de um erro grave, de uma postura equivocada que dividirá o país de forma desnecessária.
A tortura é um crime abjeto, hediondo e covarde. Tortura motivada por objetivos políticos tem o agravante de desconsiderar integralmente a liberdade de pensamento e de expressão. Por outro lado, o terrorismo também se enquadra na categoria de crimes hediondos. Grupos armados tentavam derrubar o Governo, e o Governo tentava destruir os grupos armados de tendência esquerdista. A luta armada nunca foi a melhor solução e sempre ocasionou, ao longo da história, inúmeras mortes e perdas. A Anistia visava pacificar este conflito social e virar a página para permitir a construção de um novo tecido social e consolidar uma jovem democracia.
Participei da primeira eleição direta para presidente em 1989. Votei naquela eleição. Votei em todas as outras eleições desde aquela época. Aqueles que hoje defendem a revisão da Lei de Anistia foram eleitos graças ao sistema democrático e pluralista vigente no Brasil. Não foram eleitos a força, nem tomaram o poder com base em armas. Revisitar o passado é reabrir feridas cicatrizadas.
Não se trata de olvidar um período da história; trata-se de analisá-lo com a frieza e a distância que o tempo permite.
O tiro pode sair pela culatra, pois o que propõem Tarso Genro, Ministro da Justiça, e Dilma Roussef, Ministra da Casa Civil, é aplicar penas a torturadores, como se a Lei de Anistia não os atingisse. Ora, se os crimes de tortura são imprescritíveis e a Lei de Anistia não os atingiu, os crimes de terrorismo também são imprescritíveis. Desta feita, seria necessário processar todos aqueles que participaram de ações armadas terroristas, tais como Dilma Roussef, José Genoíno, Franklin Martins, Fernando Gabeira, entre muitos outros.
O parecer da Advocacia Geral da União, que afirmou que a anistia é ampla e irrestrita e aplica-se aos dois lados da luta, foi atacado pelo Ministro da Justiça. Não me surpreendi quando o Presidente Lula resolveu ficar em cima do muro e não manifestar sua opinião. Triste omissão. Como chefe de estado, sua função seria tomar uma posição de liderança e de manutenção da ordem e da união dos brasileiros. Mas, não, ele novamente calou-se diante de tema da maior relevância.
A posição esboçada por Tarso Genro e Dilma Roussef indica de forma inequívoca que são políticos que não evoluíram na forma de pensar, com posições revanchistas e retrógradas. Admiro a trajetória de Fernando Gabeira. Hoje Deputado Federal, quase eleito Prefeito do Rio de Janeiro, Gabeira revela lucidez e clareza na forma de analisar a realidade brasileira. O passado é o passado e é preciso olhar para o futuro. Revirar o passado em nada acrescenta para o progresso do país e para o desenvolvimento da sociedade brasileira.
Deixemos as feridas cicatrizadas, sigamos em frente com coragem para enfrentar os milhares de outros problemas mais urgentes e relevantes que afetam os cidadãos deste país.
Parece que o mundo moderno adora rotular as pessoas. Quer sejam categorias criadas por publicitários para vender e divulgar seus produtos a um determinado segmento, ou criativos pesquisadores que adoram inventar moda, sempre aparece uma notícia explicando o surgimento de um novo grupo de pessoas.
"A pesquisa do instituto britânico Future Foundation, feita com mil homens no Reino Unido, mostra que 48% dos entrevistados dizem que ser capaz de cozinhar os torna mais atraentes para as mulheres", publicou a Folha de São Paulo em reportagem de 12 de outubro de 2008. Segundo explica a reportagem, o homem que cozinha passa uma imagem menos machista, menos preconceituosa e mais carinhosa. A explicação psicológica tem lá seu fundamento, mas vejo isto de um ponto de vista diferente.
Hoje em dia, as pessoas estão mais independentes. O homem moderno tende a assumir um papel mais participativo, mais colaborativo nas tarefas domésticas, tanto no aspecto da paternidade, como no aspecto da vida individual. Independência significa saber escolher suas roupas, a cuidar dos filhos, a cuidar de algumas tarefas domésticas. O novo homem age de forma diferente da geração dos seus pais.
Homens que moram sozinhos, por exemplo, tem que lavar e muitas vezes passar suas próprias roupas; vão ao supermercado e preparam suas refeições; cuidam da aparência, sem descambar ou ficar horas na frente de um espelho com cremes. A febre dos metrossexuais parece ter ficado para traz, então agora surgem os gastrossexuais.
Porém, há uma outra característica de gostar de cozinhar. Não se trata de usar a culinária para "fisgar" as mulheres, mas sim de uma atividade manual e sensorial que apetece aos sentidos e relaxa a mente.
Pessoalmente gosto muito de cozinhar. Não só de ir para a cozinha, mas de toda a preparação, da escolha dos alimentos, de planejar um cardápio, de ser criativo, de cortar e lavar os alimentos. Cozinhar é um hobby, um contraponto à atividade intelectual do meu trabalho diário. Cozinhar é um exercício que explora os sentidos e a criatividade de criar de algo inesperado, de surpreender-se com a mistura dos temperos e ingredientes.
Meu avô, sujeito nascido no interior de São Paulo, era um cozinheiro de mão cheia. Quando criança, ele costumava me levar ao supermercado com ele para escolher os ingredientes e depois preparar o almoço. Era um divertimento familiar, um elo de ligação entre gerações. A afinidade, a cumplicidade daqueles momentos ficaram guardadas com carinho. Convivi pouco com meu avô, pois ele morreu quando eu tinha 6 anos, mas aqueles instantes de convívio permanecem vivos na memória.
Rótulos são desnecessários e incabíveis para estas situações. Talvez funcione para os ingleses, mas acho muita invencionice. O homem muita vezes aprende a cozinhar por necessidade e por exigência das condições de vida, onde a mulher trabalha fora, ou então, para aqueles que moram sozinho. Com rótulo ou sem rótulo, a experiência de cozinhar é enormemente prazerosa. E deve ser prazerosa também - principalmente - para quem saboreia os pratos.