VIA APPIA, de Cecília Meirelles.
Pedras não piso, apenas:
- mas as próprias mãos que aqui as colocaram,
o suor das frontes e as palavras antigas.
Ruínas não vejo, apenas:
- mas os mortos que aqui foram guardados,
com suas coragens e seus medos da vida e da morte.
Viver não vivo, apenas:
- mas de amor envolvo esta brisa e esta poeira,
eu também futura poeira noutra brisa.
Pois não sou esta, apenas:
- mas a de cada instante humano,
em todos os tempos que passaram. E até quando?
(Canções. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2005, p. 78-9)
Abraço a brisa da vida, envolvendo-a com amor e transformando cada instante em algo humano. Este "algo" humano que se manifesta em coisas singelas, em pequenos momentos de compreensão – ainda que não se expresse a necessidade de um abraço ou de um colo -, em gestos e sorrisos, em toques no ombro, em abraços apertados, em sorrisos desinteressados, em beijos no rosto, em segurar as mãos sem contar os segundos ou minutos, em correr atrás de uma borboleta, em levantar uma criança do chão para que ela posse ver mais longe, em agradecimentos desnecessários, em lágrimas que escorrem despertadas por aquela música – ou aquele texto -, em sonhos que nos visitam nas horas mais silenciosas...
O humano é dimensão da nossa dignidade única e incomparável. O humano está na nossa essência, que muitas vezes olvidamos ou afogamos. "Pois não sou esta, apenas: / - mas a de cada instante humano, / em todos os tempos que passaram. E até quando?" Somos a soma destes incontáveis instantes humanos, capazes de mudar uma vida e todas as outras que tocamos com nossa humanidade.
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