Sonhei com você noutra noite. Sentada num canto de uma sala, sorria com um copo de vinho na mão. Mirava-me, silenciosa, mas transparecia uma alegria serena. De longe, olhei-te, sorri de volta, mas não acenei. Não iria tomar a iniciativa de abordar-te e romper teu desejo expresso no passado e de forma tão contundente. Tiveste força para me calar. Eu nunca calei tua voz dentro de mim. E vez por outra, como no acaso de um encontro casual, visitas-me com teu olhar distante e levemente melancólico, um olhar que sempre parecia gritar por socorro.
Não queimei os poucos retalhos que guardei, não formatei o HD. Na verdade, o HD se autodestruiu, uma daquelas panes inesperadas que levaram junto arquivos, contatos, fotos, textos, memórias. Curioso como uma máquina é capaz de simplesmente apagar anos de trabalho que ali estavam armazenados. Voltei a confiar no meu HD mental, na memória que agora armazena variantes de gambitos, sicilianas e Ruy Lopez. A criatividade se desenrola num tabuleiro, onde tenho um pouco mais de controle sobre o que se passa. Quando algo dá errado, a culpa é só minha e de algum erro de cálculo. A vida tem suas inesperadas mudanças.
Acordei sem sentir saudades. O tempo passou, as águas correram e o sentimento se desfez. Ou talvez esteja apenas adormecido na noite fria que avança.
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