Deixo as palavras voarem soltas e o vento as levará para longe.
Pousarão sobre um galho de árvore do lado de fora de tua janela a te observar.
Pacientemente, elas aguardarão, até que seu olhar se volte a elas.
Então quiçá as receberá com um sorriso, e elas alcançarão seu destino.
quarta-feira, 30 de junho de 2010
Microconto - IV
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Renato
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terça-feira, 29 de junho de 2010
Crônica: Viagem
VIAGEM
As duas malas grandes repousavam no hall do elevador como dois cães amestrados aguardando o dono. Ele voltou para dentro do apartamento, conferiu se as janelas estavam fechadas, os aparelhos eletrônicos desligados da tomada. Parou diante de um porta-retrato numa mesinha no canto da sala. O olhar fixou-se na foto. Sentiu um arrepio, o coração apertado. O tempo parecia congelar, o ruído da rua silenciou-se.
Pegou o porta-retrato com as mãos trêmulas. Duas lágrimas escorreram-lhe pelo rosto regando a barba levemente grisalha. Esboçou um sorriso aflito. “Por que ela tinha ido?”, perguntou-se.
A foto trazia duas pessoas sorrindo, vibrantes, celebrando a vida num momento único, repleto de sentido profundo, de algo intangível, mas dotado de uma força inexplicável. Ele nunca conseguiu entender o que aconteceu entre eles. Ela um pouco mais jovem; ele maduro, mas bem apessoado. Nunca foi capaz de descrever o que sentia. Tentou repetidas vezes conversar com seu terapeuta sobre ela, mas entrava em transe, tomado por um estado de espírito que o inebriava a ponto de impedir que o sentimento fosse descrito de forma clara e lógica, afinal sentimentos não são lógicos, argumentava ele. O aspecto físico era relegado a um segundo plano, pois sentia uma forte atração que superava apenas sua beleza e charme.
Desde que a conheceu, cicatrizes foram fechadas e curadas. Chegou a afirmar que conhecia o amor pela primeira vez na vida, depois dos 40 anos. Esquecera das traições, das mágoas, da solidão, da vergonha. Perdera o medo de falar, de olhar, de sorrir e de presentear. Seu mundo passara a ser nutrido por ela. Falavam-se todos os dias e viam-se em quase todos os finais de semana. Sempre que possível, encontrava uma forma de fugir para a cidade dela e retardava a volta para ali permanecer. Bastava-lhe estar com ela, conversar com ela. Tudo caminhava bem, até que um dia...
As lágrimas ficaram mais volumosas. A dor da lembrança da morte não havia sido superada. O corpo inerte, a tez pálida e fria sem viço, os olhos cerrados levaram para sempre um brilho que incendiava sua alma, o cabelo penteado, as mãos cruzadas com um anel que ele a presenteara.
Recolocou o porta-retrato na mesinha de canto. Estava com a barba por fazer, algumas rugas a mais e feridas reabertas. Foram dois anos e quatro meses. Ele contabilizava o tempo como uma fortuna que tratava com zelo e depositava diariamente no cofre. Cada dia, cada palavra, cada sorriso representava juros e rendimentos. Ela lhe proporcionara tudo. Ela se fora. Sentia uma necessidade de reviver o primeiro encontro, de reavivar a memória e sepultá-la de forma definitiva.
Fechou a porta do apartamento, abriu a porta do elevador, pegou as malas e partiu para o aeroporto.
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Renato
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sexta-feira, 25 de junho de 2010
Cala boca Galvão!
Tudo começou como um trending topic no Twitter no dia da estreia do Brasil na Copa do Mundo. Ganhou o mundo e a curiosidade dos estrangeiros. Então, veio algum piadista que inventou uma estória, um post num blog, um vídeo no Youtube - que ilustra este post -, e pronto, "criou-se" uma verdade jornalística.
Inventaram um pássaro chamado Galvão e a brincadeira ganhou a capa da Veja e a imprensa mundial.
O brasileiro é mestre em fazer piada, costuma levar tudo na brincadeira e, muitas vezes, isto é negativo, revela um traço conformista e acomodado e pouco indignado de nosso povo. Mas o mais impressionante deste caso é analisar como as mídias sociais permitem disseminar informação de forma muito rápida e eficaz e com amplo alcance geográfico. Uma ferramenta poderosa, que pode ser usada para o bem e para o mal.
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Renato
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8:40 AM
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segunda-feira, 21 de junho de 2010
Espelho paterno
Sentei-me diante dela na mesa da sala de jantar e, discretamente, passei a observá-la por cima da tela do notebook. Compenetrada, livros, cadernos e estojo organizados e dispostos simetricamente sobre a mesa. Tirou uma folha branca com exercícios de matemática e com um lápis bem apontado, deu vida a números que dançavam sobre o papel branco com uma rapidez e leveza que fiquei surpreso.
Não tardou a terminar a resolução dos problemas e pediu que eu conferisse. Apenas um deles estava errado. Releu o enunciado e descobriu o erro sozinha. Apagou a resolução e refez o trabalho.
Durante pouco mais de trinta minutos, ela ficou imersa na lição de casa, concentrada, mergulhada nos estudos. Questionei-me se, na mesma idade, tinha tanta facilidade com o dever de casa, com a resolução dos problemas, com o estudo do ciclo da cana de açúcar. Conclui que não. Conclui que ela é muito mais inteligente que eu e muito mais dedicada e organizada. Ela não era mero reflexo do pai, mas uma pedra lapidada e apurada.
Depois do jantar, sentou-se no meu colo para me ajudar com o Sudoku do jornal. E disse:
- Gosto de ver você resolvendo estes problemas.
O coração de pai ficou derretido pelo elogio filial.
Ao deitar-me à noite, rememorei estes fatos que devem ter passado despercebidos por ela, mas que ficaram gravados naquela tarde. Momentos assim merecem ser preservados, e são preservados na memória. Ficarão guardados neste blog, e quem sabe um dia, ela os lerá.
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Incentivando a leitura nas crianças
Há muitos estudos sobre a importância da leitura e seus efeitos benéficos ao ser humano. Certa vez li uma reportagem sobre a redução da incidência de Alzheimer em pessoas que tinha hábitos de leitura ao longo da vida em comparação com pessoas que não liam. Outro estudo revela que famílias que incentivam a leitura em jovens colhem resultados positivos, com melhor desempenho escolar e carreiras profissionais mais bem sucedidas, do que jovens que não tem o hábito de ler.
Não conheço nenhum estudo que aponte que a leitura – boa leitura, claro – é prejudicial à saúde ou ao desenvolvimento emocional do ser humano. A grande questão está exatamente em incutir o hábito da leitura constante nos mais jovens. Tratei deste tema outras vezes neste blog, como no post Criando Leitores, e com a proximidade das férias, as crianças com mais tempo livre, resolvi dividir algumas dicas sobre como incentivar o hábito da leitura nos mais jovens.
Esta compilação de sugestões é empírica, decorrem da observação, de tentativas que funcionaram bem, de conversas com outros pais e professores. Convido-os a acrescentarem mais dicas através dos comentários para que possam ser divididas com mais pessoas que têm preocupação semelhante.
1. O Exemplo – criança imita os pais e o bom exemplo é arma mais poderosa para demonstrar aos pequenos o que é bom, qual a conduta a seguir. Se os filhos verem os pais lendo, sem dúvida terão vontade de ler também.
2. Porta de entrada – a leitura deve ser algo divertido e prazeroso. A porta de entrada para a descoberta deste mundo, normalmente, são os gibis. Coloridos, estórias curtas e de fácil compreensão. Uma receita para quem está dando os primeiros passos na leitura. E há versões da Turma da Mônica em inglês e espanhol, uma ótima ferramenta para treinar um novo idioma.
3. Demonstrar Interesse – é preciso saber que tipo de estória seu filho gosta. Basta ir a uma livraria e observar por qual livro seu filho é atraído. Demonstre interesse pelo que ele está olhando e sugira alguns livros para ele folhear. Meninas e meninos são diferentes e assim se dá na leitura também. Não adianta sugerir para um menino de 8 anos a leitura de O Pequeno Príncipe. Não vai dar certo.
4. Ajudar a ler – Ler juntamente com a criança é uma forma de incentivar o leitor e permitir aos pais que compreendam a estória, esclarecendo dúvidas sobre palavras. Alternar a leitura de trechos do livro em voz alta, para os que estão e fase de alfabetização, é uma forma de ajudá-los a treinar a leitura, além de permitir aos pais que passem tempo com os filhos.
5. Auxiliar na compreensão - Ler é um exercício que incrementa o vocabulário, melhora a ortografia, ativa a imaginação e o raciocínio abstrato e contribui na formação do caráter. Para que a absorção da leitura seja plena, é necessário que se compreenda o texto. Uma forma de avaliar se a criança compreendeu o que leu e discutir o texto. Isto pode ser feito com perguntas simples sobre o livro, ou pedindo que a criança conte a estória com suas próprias palavras. Ao fazer isto, a criança revelará se compreendeu o texto, exercitará seu poder de síntese ao fazer um resumo da estória e perceberá o interesse dos pais que valorizam a leitura.
6. Apresentar o dicionário – Para escrever bem, é preciso ler. Quantas vezes não ouvimos isto em aulas de redação. Pois bem, para escrever bem também é preciso ter um bom vocabulário e o dicionário tem papel fundamental neste objetivo. Apresente o dicionário ao seu filho, mostre a ele que não se deve ter vergonha ao consultar o dicionário, que ninguém sabe tudo. É confortante para uma criança notar que o pai ou a mãe tem a humildade de consultar um livro quando tem uma dúvida. E mais, este ato é um exemplo que será seguido.
7. O livro como amigo – As grandes livrarias têm espaços especiais para o público infantil, geralmente com poltronas, mesinhas, almofadas, onde elas podem se esparramar e pegar os livros. Passeios a estas livrarias ajudam a criança a se familiarizar com os livros, a ter o livro como amigo. Estas livrarias são uma forma de suprir a falta de bibliotecas públicas adequadas no nosso país.
sexta-feira, 11 de junho de 2010
A beleza da Divina Comédia
A DIVINA COMÉDIA
Canto I
"A meio caminhar de nossa vida
fui me encontrar em uma selva escura:
estava a reta minha vida perdida.
Ah! que a tarefa de narrar é dura
essa selva selvagem, rude e forte,
que volve o medo à mente que a figura.
De tão amarga, pois mais lhe é a morte,
mas, pra tratar do bem que enfim lá achei,
direi do mais que me guardava a sorte.
Como lá fui parar dizer não sei;
tão tolhido de sono me encontrava,
que a verdadeira via abandonei."
(Tradução Italo Eugenio Mauro. São Paulo : Ed. 34, 2009, p. 33-4)
Canto I
"A meio caminhar de nossa vida
fui me encontrar em uma selva escura:
estava a reta minha vida perdida.
Ah! que a tarefa de narrar é dura
essa selva selvagem, rude e forte,
que volve o medo à mente que a figura.
De tão amarga, pois mais lhe é a morte,
mas, pra tratar do bem que enfim lá achei,
direi do mais que me guardava a sorte.
Como lá fui parar dizer não sei;
tão tolhido de sono me encontrava,
que a verdadeira via abandonei."
(Tradução Italo Eugenio Mauro. São Paulo : Ed. 34, 2009, p. 33-4)
Assim começa o texto clássico de Dante Alighieri, no meio do caminho, provavelmente uma alusão à metade da vida, o narrador encontra-se num momento de escuridão, de dúvida, de incerteza. Li A Divina Comédia na juventude; reencontrei-me com o texto novamente no meio do caminho.
Na juventude, a dúvida da meia-idade parecia distante e algo incompreensível, mas ao reler o primeiro Canto, pude compreender a razão do texto clássico ser atual e um clássico atemporal. Jorge Luis Borges afirmava que é um livro que todos devemos ler. Não faz parte dos livros obrigatórios de vestibular e raramente algum jovem o terá lido. Os clássicos ocidentais parecem ter sido desprezados e relegados a um segundo plano, leitura apenas de quem gosta de literatura, de quem encontra na literatura um momento de reflexão silenciosa.
Escrito no século XIV, a Comédia é uma obra magna, magistral. Setecentos anos se passaram desde que foi escrita e tem inegáveis traços de atualidade, como todo bom livro clássico. A atualidade, a universalidade lhe garante o rótulo de clássico.
O caminho da vida tem momentos de escuridão, de angústia, de incerteza. Tema que já inspirou alguns textos que estão neste blog, e tema que aflige a todos nós em momentos diferentes da vida. Qual caminho a seguir? Qual decisão a tomar?
Dante está inquieto pois encontra-se na selva onde a virtude é desprezada, onde a retidão, a ética, a honra são esquecidas; a honestidade desprezada; a aparência elogiada; a ostentação ganha ares de virtude e o ter predomina sobre o ser.
Guiado por Virgílio, Dante inicia uma jornada de reflexão e diálogo, um díálogo com sua consciência, para renascer da jornada revigorado e cheio de esperança.
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quarta-feira, 9 de junho de 2010
Crônica: Raio de Sol
RAIO DE SOL
Um raio de sol irrompe na manhã fria de inverno, e ainda escura, nos estertores do dia nascente, dissipando a penumbra, tocando as gotas de orvalho que repousam sobre as folhas, tingindo o céu com um azul de tom claro.
Um raio de sol que corre apressado ao final do dia, pintando o céu com róseos e alaranjados, deitando-se no horizonte, fugindo pelo poente e deixando o palco para a lua amarelada.
Um raio de sol que nos presenteia com sua luz e calor cotidiano, mesmo nos dias escuros, ofuscado pelas nuvens e tempestades, mas que permanece vigilante e paciente por detrás do véu negro, aguardando o momento exato para entrar em cena.
Um raio de sol que não brota de um corpo celeste, nem do espaço, nem das alturas.
Um raio de sol que está ao meu lado, ainda que distante, a irradiar com seus olhos e coração generoso o brilho da vida, a intensidade da amizade, a poesia dos mestres literários, a prosa da rotina, a delicadeza feminina que capta o humor, a sensibilidade para recorrer ao ombro amigo quando necessário, sem medo de demonstrar fraqueza ou fragilidade.
Um raio de sol que dos teus olhos irradiam para apontar o caminho, para aquecer a alma perdida, para tranquilizar e acalentar o coração angustiado, para alimentar a felicidade de compartilhar com ti alguns momentos. Não são necessários todos os momentos. Os momentos que me entrega com o olhar rutilante são inesquecíveis e indeléveis. Cada palavra dita com o olhar, cada sorriso expressado em silêncio, cada lágrima de alegria que irriga minha face, tem o dom de trazer consigo a poesia da vida que se redescobre a cada dia.
Um raio de sol. Assim és tu.
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Renato
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8:30 AM
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segunda-feira, 7 de junho de 2010
Futebol e bola
A Copa do Mundo está prestes a começar e somos tomados de um intenso espírito patriótico e de união. Músicas, livros, exposições, propagandas. Tudo trata de Copa do Mundo. No feriado, meu filho sugeriu que fôssemos ao Museu do Futebol, localizado no Estádio do Pacaembu, em São Paulo. Não conhecia o museu, mas há tempo tinha vontade de dar um pulinho por lá.
É um museu moderno, que faz muito bem o uso das novas tecnologias. Fiquei com a impressão de que se entra numa máquina do tempo, onde as emoções que senti quando criança foram reavivadas, renascidas no momento presente. O futebol é um esporte que permite ao indivíduo sentir a mesma emoção aos 6 e aos 60 anos de idade. A Copa do Mundo, então, acentua ainda mais estas lembranças.
Os grandes locutores são lembrados narrando gols inesquecíveis. Pedro Luiz, Fiori Gigliotti, Osmar Santos. Do rádio, passa-se à imagem colorida da televisão e a Copa de 1970. Lembrei de meu avô, Heitor, que todo domingo no início de um programa esportivo, onde exibiam o quarto gol do Brasil na final contra a Itália, narrava a jogada que culminou com um passe de Pelé para Carlos Alberto marcar. Os momentos alegres e tristes da Copa de 1982. Era criança ainda e chorei copiosamente quando o Brasil perdeu da Itália por 3 a 2, na Espanha. Parecia o fim do mundo para um jovem garoto que jamais havia visto o país erguer uma taça de Copa do Mundo.
As imagens de todas as copas são um exercício de memória, onde se pode nomear os jogadores, e contar aos mais novos como as coisas aconteceram. Nestas salas, a emoção é visível, palpável. Todos comentam em voz alta numa cumplicidade de quem viveu e sentiu emoções semelhantes.
Numa outra sala, mais adiante, a bola. Objeto perfeito, que pode ser feito de tantos materiais, e talvez por isso, o futebol seja tão popular, tão fácil de ser jogado, tão fascinante. A bola traz alegrias, mas não perdoa e castiga aqueles a maltratam. A bola tem vida própria e parece guardar sempre uma surpresa. Desde o grito entalado na garganta, até a lágrima que se derrama quando ela resolve repousar no fundo das redes do time do coração.
O Museu do Futebol capta um pouco da magia do futebol. As emoções ficam por conta do visitante.
É um museu moderno, que faz muito bem o uso das novas tecnologias. Fiquei com a impressão de que se entra numa máquina do tempo, onde as emoções que senti quando criança foram reavivadas, renascidas no momento presente. O futebol é um esporte que permite ao indivíduo sentir a mesma emoção aos 6 e aos 60 anos de idade. A Copa do Mundo, então, acentua ainda mais estas lembranças.
Os grandes locutores são lembrados narrando gols inesquecíveis. Pedro Luiz, Fiori Gigliotti, Osmar Santos. Do rádio, passa-se à imagem colorida da televisão e a Copa de 1970. Lembrei de meu avô, Heitor, que todo domingo no início de um programa esportivo, onde exibiam o quarto gol do Brasil na final contra a Itália, narrava a jogada que culminou com um passe de Pelé para Carlos Alberto marcar. Os momentos alegres e tristes da Copa de 1982. Era criança ainda e chorei copiosamente quando o Brasil perdeu da Itália por 3 a 2, na Espanha. Parecia o fim do mundo para um jovem garoto que jamais havia visto o país erguer uma taça de Copa do Mundo.
As imagens de todas as copas são um exercício de memória, onde se pode nomear os jogadores, e contar aos mais novos como as coisas aconteceram. Nestas salas, a emoção é visível, palpável. Todos comentam em voz alta numa cumplicidade de quem viveu e sentiu emoções semelhantes.
Numa outra sala, mais adiante, a bola. Objeto perfeito, que pode ser feito de tantos materiais, e talvez por isso, o futebol seja tão popular, tão fácil de ser jogado, tão fascinante. A bola traz alegrias, mas não perdoa e castiga aqueles a maltratam. A bola tem vida própria e parece guardar sempre uma surpresa. Desde o grito entalado na garganta, até a lágrima que se derrama quando ela resolve repousar no fundo das redes do time do coração.
O Museu do Futebol capta um pouco da magia do futebol. As emoções ficam por conta do visitante.
sexta-feira, 4 de junho de 2010
No ritmo da Copa
Wavin´ Flag, de K´naan é o tema oficial da Copa do Mundo de 2010.
quarta-feira, 2 de junho de 2010
Sou amigo do Rei
Oliver Stone, aclamado diretor de cinema norte-americano, chegou ao Brasil no dia 31 de maio, no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Porém, Stone não tinha visto para ingressar no Brasil e foi barrado pela Polícia Federal. A notícia é do Estadão e também foi comentada por Reinaldo Azevedo.
- What do you mean I need a visa? I am here for important meetings and will meet Lula tomorrow! – poderia ter sido a fala de Stone querendo dar uma “carteirada” e imaginando que na verdade, ele vinha a um país onde tudo se resolve com jeitinho.
Foi o que ele fez. Ligou para Luiz Carlos Barreto, que produziu o fiasco “Lula, o filho do Brasil”, que ligou para Celso Amorim, que ligou para o Ministro da Justiça, que ligou para o Superintendente da Polícia Federal em Brasília, que passou um fax para a PF em Cumbica, que liberou a entrada de Stone no Brasil.
A corrente de ligações me lembrou Quadrilha, de Drummond, se bem que neste caso a quadrilha é de outro naipe, e não amorosa.
Stone conseguiu entrar, gravou um depoimento a favor de Dilma Roussef e fez uma palestra na FAAP, em São Paulo, para divulgar seu documentário “Ao Sul da Fronteira” onde aclama Hugo Chávez e outros malucos latino-americanos como libertadores e salvadores do povo. Parece ser um estilo Michael Moore de criticar o poderio dos EUA.
Até aí, respeito a visão política de Stone, como respeito a visão de James Cameron, diretor de "Avatar" e "Titanic", que veio defender a preservação da Amazônia. Curioso que nenhum deles deixa as benesses, os confortos e o dinheiro ganho nos EUA. É fácil dar pitaco no quintal dos outros quando se está confortavelmente instalado numa ampla residência.
Revolta-me a forma como o visto foi concedido, utilizando-se de contatos importantes no governo, algo que qualquer outro cidadão americano não teria acesso e seria retido na área internacional do aeroporto e enviado de volta no primeiro voo. O privilégio concedido a Oliver Stone só porque ele é amiguinho do molusco é inadmissível e retrata bem como este governo trata as pessoas: igualdade só para os amigos; para os inimigos, a lei.
Oliver Stone não tem passaporte diplomático, não está na condição de exilado ou perseguido político. Deveria, então, ter ido ao consulado brasileiro em Los Angeles – nos dias e horário em que funciona o consulado –, pago a taxa exorbitante cobrada e esperado o deferimento de seu visto, como faz qualquer mortal de passaporte norte-americano que queira ingressar no Brasil.
Por que ninguém fala de soberania agora? Por que ninguém se revolta com a carteirada arrogante de Stone?
Porque Oliver Stone é amigo do Rei.
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