sexta-feira, 27 de abril de 2012
Microconto - X
- Como você me descreveria? - perguntou ela com um aspecto timidamente curioso e ansiosa para ouvir o que ele diria.
- Você é um claro enigma! - afirmou poeticamente sem notar a confusão estampada no rosto da moça.
terça-feira, 24 de abril de 2012
Crônica: Tela de cinema
Tela de Cinema, RLBF |
Fez-se silêncio. Não a ausência de som e ruído externo, mas um mergulho contemplativo, quase um transe que o fazia ignorar tudo ao seu redor. Alheio ao burburinho em plena Avenida Paulista, no meio da manhã, estava tomado de uma nostalgia estranha, inexplicável. Ansiava por algo desconhecido, sentia uma vontade de embriagar-se nas lembranças, nas imagens da memória. Repassar e reviver. Retornar ao ponto inesgotável de alegria, uma sucessão de momentos únicos.
O tempo deveria ser congelado de modo que pudesse mirar e admirar seu rosto, em estado de graça, quase uma reverência sagrada, quase uma adoração servil.
Uma nostalgia saudosa que lhe deixara confuso. Sentia o prazer da lembrança e a dor da saudade. Queria fotos, queria sons, queria sentir o perfume, o toque da pele, o leve roçar dos cabelos no seu rosto, o olhar discreto e disfarçado pelas curvas dela, pelo decote a revelar um pequeno indício dos seios, vibrando ao descobrir parcialmente a asa tribal da bela tatuagem que adornava seu corpo, pelo cantar de sua risada, pela explosão de alegria e de entusiasmo ao falar, pela manhã preguiçosa conversando e ouvindo música. Desejou o impossível: a materialização do passado no momento presente! A ausência trouxe-lhe a ferida do vazio, qual tela de cinema límpida e alva, despida de qualquer vida, passiva a observar os espectadores. O filme que tanto imaginara já tinha acabado. E não seria exibido novamente. A única cópia destruída. Restava-lhe, apenas, reavivar a memória e vivenciar um sonho no delírio do transe urbano.
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sexta-feira, 20 de abril de 2012
Epígrafe - XV
"Eu não me lembrava de ter posto dentro do volume o recorte da Lux. Teria comprado o livro, num dos sebos da Rua São José, com ele ali? É possível. Cedo ainda, como se estivesse mal desperto, pensei em falar para o [Manuel] Bandeira. E nisto me lembrei de que o velho amigo, o querido poeta, o exemplar companheiro, que sempre acordava emo eu em hora extremamente matinal, está recolhido ao Mausoléu da Academia, desde o ano passado.
Foi ele quem me faz achar o artigo? E por que não, se o mistério faz parte da condição humana?"
(Josué Montello. Diário do Entardecer 1967-1977. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1991, p. 229)
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terça-feira, 17 de abril de 2012
Livro infantil: porta de entrada para um mundo mágico
Pipa |
No dia 18 de abril comemora-se o Dia Nacional do Livro Infantil. A data escolhida foi instituída para homenagear Monteiro Lobato, talvez o mais marcante escritor infanto-juvenil brasileiro. Suas obras dialogam com o universo da criança e do adolescente. A homenagem é justa e a data muito relevante para passar em brancas nuvens. O Brasil ainda é um país de analfabetos e de poucos leitores. Refiro-me àquela pessoal que não escreve direito, que não compreende os textos e que lê pouco. Afinal, quem pouco lê, mal escreve. A consequência é direta. O remédio para adultos letrados e lidos é despertar o gosto pela leitura na criança.
Em abril de 2010, fiz um post com o título Criando Leitores. Afirmava que leitores são desenvolvidos, instigados, criados. Ninguém nasce lendo. Ninguém nasce virtuoso. A virtude é adquirida com a repetição de um determinado ato, até que a prática deste determinado ato transforma-se em hábito. O mesmo ocorre com a leitura. É preciso ler junto, ensinar a ler, ensinar a apreciar o livro e descobrir o livro com um grande companheiro em momentos de diálogo interno. O exemplo é fundamental para que isto ocorra. Se os pais não leem, os filhos não lerão.
Outro dia, um amigo deixou o seguinte comentário no Facebook: "Semana de provas e tenho que fazer meus filhos estudarem. Qual o melhor caminho: prêmio ou dinheiro?". Não sou psicólogo infantil, mas diria sem medo de errar que a metodologia está completamente errada. A resposta para mim é disciplina, é compreensão por parte da criança de que o estudo é sua profissão e o estudo é sua missão e tarefa. Em outras palavras, estudar é obrigação da criança. Não digo que é fácil - tenho minhas lutas com meus filhos neste campo também -, mas tenho a preocupação de demonstrar-lhes a importância deste momento e da relevância do estudo em suas vidas.
O mesmo pode ser transposto para a leitura. Basta separar alguns minutos por dia, sentar-se com o filho e ler juntos. O exemplo arrasta!
Cabe também uma breve ressalva: é preciso escolher o livro e ajudar a criança a ler bons livros. Há muita porcaria publicada e vendida por aí. Um livro ruim pode 'deseducar' e pode agravar problemas com ortografia e gramática.
Se você não sabe por onde começar procure qualquer livro da Ruth Rocha, uma escritora brasileira que sabe contar uma excelente estória para as crianças. E para fazer-lhes companhia, por que não reler alguma obra de Monteiro Lobato? Sairá rejuvenescido com a volta à infância e com um vocabulário mais rico. Não perca tempo e lembre-se: o livro infantil é o ponto de partida para formação de bons leitores.
NOTA: Para ler outros posts sobre Monteiro Lobato e literatura infantil, clique nos tags abaixo.
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sexta-feira, 13 de abril de 2012
Museus em alta
A reportagem de Mariana Shirai foi publicada no Valor Econômico (edição de 12 de abril de 2012, p. D5) sob o título "O ano das exposições blockbusters no Brasil" e trouxe uma nota bastante interessante: "No fim do mês passado, a exposição de Escher no Rio foi apontada pela publicação britânica 'Art Newspaper' como a mais popular no mundo (maior média diária de visitantes), com 573.691 visitantes."
O número de visitantes é um indicador muito positivo de que há interesse por cultura no Brasil. Desde que as exposições sejam relevantes e bem montadas, o público comparecerá. Os cariocas deram um exemplo com a frequência avassaladora à mostra de Escher. Não me surpreendo, pois o Rio é mais do que "apenas" uma cidade maravilhosa de praias e paisagens indescritíveis. O Rio é uma cidade de cultura pulsante e viva e o CCBB-RJ é um dos lugares mais encantadores para se visitar.
Recentemente tive a oportunidade visitar a mostra sobre a Índia no CCBB-Rio e no CCBB-SP. A mostra de São Paulo - apesar de teoricamente igual - era mais acanhada por culpa do espaço menor, mais apertado, menos iluminado. Os cariocas são privilegiados de poder desfrutar deste grande espaço cultural.
Volto a insistir no que já discuti em posts anteriores: o brasileiro é ávido por cultura e acorrerá às grandes mostras. O Brasil tem excelentes espaços culturais, basta o cidadão ir atrás. E este ano ainda promete com exposições de Leonardo Da Vinci (1452-1519) e Caravaggio (1571-1610), além de uma grande mostra sobre o impressionismo, com obras de MOnet, Renoir, Van Gogh, Degas e Manet, diretamente do acervo do Museu D'Orsay, de Paris.
terça-feira, 10 de abril de 2012
A pedra no meio do caminho
Ele estava com a curiosidade aguçada e pediu minha ajuda para que lhe guiasse na livraria até o setor onde encontraria o bendito poema. Ficou desconfiado de que o curto poema sobre a pedra no meio do caminho era invenção minha. Vasculhamos todos os livros de Drummond no setor de poesia, mas infelizmente não encontramos um exemplar de Alguma Poesia, o primeiro livro do poeta.
Deparamo-nos com algo maior: uma obra inteira dedicada ao estudo do poema buscado. Uma Pedra no meio do caminho - Biografia de um poema, de Eucanaã Ferraz (Instituto Moreira Salles, 2010) é uma homenagem e o reconhecimento da genialidade do poeta. Genialidade que se manifesta na facilidade de dizer o simples, de escrever com leveza, de falar com todos e a todos.
Rafa sentou-se numa confortável poltrona da Livraria da Vila e leu o poema. Este pai não conteve a admiração de ver um menino de 8 anos de idade lendo poesia, e memorizando-a com uma única leitura, pois logo em seguida recitou o poema para a irmã. O pequeno leitor compreendeu apenas parte do que o poeta quis dizer - penso eu -, mas deixou-se levar pela escrita poética, pelo ritmo das palavras que dançam ao redor da pedra no meio do caminho.
Sempre haverá uma pedra no meio do caminho. Desistir é uma opção, mas apenas para os fracos. Pedras há de montes. Pequenas e grandes, diárias e semanais, cotidianas e esporádicas. Chamemo-las de pedras, espinhos, "abacaxis", "pepinos" ou qualquer outro nome. As contrariedades são diárias e constantes, algo inerente à vida. Não apenas na vida moderna e urbana, mas na vida. Quem mora na zona rural não tem água quente, alguns não têm energia elétrica e por aí podemos desfiar uma longa ladainha. Eles também têm pedras no meio do caminho.
Algumas pedras não são contornadas. Impedem a passagem. Algumas pedras são carregadas conosco ao longo dos anos e pesam, cansam, fatigam.
É preciso ultrapassar a pedra, com paciência e perserverança, para poder olhar para trás e dizer com o poeta, saudoso e vitorioso por não ter desistido diante da pedra no meio do caminho:
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
(Carlos Drummond de Andrade. Alguma Poesia, 1930)
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Renato
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domingo, 8 de abril de 2012
Sequência de Páscoa
1. Cantai, cristãos, afinal:/ “Salve ó Vítima Pascal!”/
Cordeiro inocente, o Cristo/ Abriu-nos do Pai o
aprisco.
2. Por toda ovelha imolado,/ do
mundo lava o pecado./
Duelam forte e mais forte:/ É a vida que vence a morte.
3. O Rei da vida, cativo,/ foi morto,
mas reina vivo!/
Responde, pois, ó Maria:/ No caminho o que havia?
4. “Vi Cristo ressuscitado,/ o
túmulo abandonado,/
Os anjos da cor do sol,/ Dobrado no chão o lençol.
5. O Cristo que leva aos céus,/
caminha à frente dos seus!” /
Ressuscitou, de verdade:/ Ó Cristo Rei, piedade!
(extraído da Liturgia da Missa do Domingo de Páscoa)
FELIZ PÁSCOA! Que seja um momento de renovação e vida nova! Que a renovação seja vibrante e interior, que o espírito fortaleça-se e dê ânimo para perseverar e continuar a boa luta.
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