sábado, 30 de julho de 2011

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Modelos, títulos e crítica

Há certos títulos de post que não condizem rigorosamente com o conteúdo. Ao longo destes 4 anos, desde que o blog começou, aprendi que certos títulos conquistam o mago Google em suas ferramentas de busca e trazem desavisados até aqui. O marketing faz parte do negócio, mas quero voltar à entrevista de VS Naipaul e sua opinião sobre modelos de escrita, além de aproveitar para abordar os comentários.

Primeiramente, sei que o título não condiz exatamente com o teor do post. Agi deliberadamente na tentativa de instigar o leitor a evitar o modelo pronto, a experimentar, a ousar. Naipaul revela que não teve um modelo de escritor para seguir. Qualquer trabalho realizado do zero exige maior esforço e o ser humano é preguiçoso por natureza, busca sempre o caminho mais fácil. Escrever não é fácil. Talvez seja fácil apenas para o Gabriel Chalita, aquele deputado federal que publica livros com uma velocidade incrível e jamais vista no mundo civilizado. 

Voltemos ao ponto.

Fugir dos modelos é difícil. Tento, por vezes, experimentar novas formas e estilos de escrita. Este blog é um pouco do meu laboratório. A poesia dá ao escritor a liberdade plena de forma. O post Sábado, um pequeno poema, é um brincadeira com as palavras e versos conhecidos. Uma pitada de Vinicius de Moraes, uma pitada de Drummond e surgiu o poeminha. Grandes escritores conseguem exatamente isto: livrar-se de modelos. 

A construção de novas formas e estilos se dá exatamente com a crítica, com o questionamento, com a transgressão linguística. Guimarães Rosa foi um transgressor. Ferreira Gullar é um transgressor. E tantos outros que deixaram sua marca e contribuíram para o enriquecimento da literatura e da arte. Estes souberam jogar no lixo os modelos e seguiram seu caminho, abrindo uma nova trilha na mata fechada. 

O título do último post é uma provocação e deixará revoltado algum infeliz que por aqui passar em busca do caminho fácil para produzir um bom texto. Desculpe-me, mas caminho fácil para produzir um bom texto não existe. O bom texto surge de muito pensar e pensar dá trabalho. Quem sabe não seja este o modelo para a boa escrita: pensar e pensar! Algo que faz muita falta nos dias modernos.



segunda-feira, 25 de julho de 2011

Modelos para a escrita

Sabático: O senhor diz que um jovem escritor francês ou inglês teria encontrado inúmeros modelos nos quais se inspirar. Nascido em Trinidad, o senhor não os teve, o que lhe levou a ser um escritor intuitivo. Foi uma vantagem ou uma desvantangem?

Ambas, creio eu. É uma vantagem ter modelos maiores para inspirá-lo, no entanto de alguma forma eles o limitam. Essa é uma questão muito difícil, mas uma excelente reflexão, sobre a qual não tenho todas as respostas.


(V.S. Naipaul em entrevista concedida a Andrei Netto, no caderno Sabático do Estado de São Paulo, 23 de julho de 2011, p. S5.)

sábado, 23 de julho de 2011

Sábado

SÁBADO

Bom dia
dia bom.
Por quê?
Porque hoje é sábado
E não há pedras no meio do caminho.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Música no Museu

Neymar Dias e convidados no Música no Museu

Resolvi seguir minhas reflexões e partir do mundo das ideias para o mundo da prática. Domingo de manhã de sol e pela primeira vez fui a um concerto no Museu da Casa Brasileira. Localizado na Av. Brig. Faria Lima, 2705, numa área nobre de São Paulo, o museu está instalado no antigo Solar Fábio Prado. Há um enorme jardim no fundo da casa com espaço para as crianças correrem, apreciarem as árvores e algumas esculturas.

O projeto denominado Música no Museu é o prato chefe nos domingos às 11 horas. São espetáculos musicais sob a coordenação de Carmelita Rodrigues de Moraes que "buscam traduzir a diversidade musical". O programa está no site e no mês de julho privilegiam a música instrumental brasileira, mas aspectos regionais. Neste último domingo, houve apresentação de Neymar Dias e convidados, tocando viola caipira. Os eventos são gratuitos e não é preciso reservar lugar, nem pegar senha.

Dizem que a capacidade de surpreender-se diante de coisas novas é sinal de uma alma jovem. Pois bem, fiquei encantado com o espaço, a música e as pessoas que ali estavam. São Paul tem este lado mágico de oferecer incontáveis opções culturais, basta procurar. 

Sou um curioso e gosto de degustar coisas novas. Gosto de agregar com novas experiências, sejam elas musicais, literárias, visuais ou gastronômicas. No fundo, tudo contribui para o aumento do arsenal para escrever, mas também abre novos horizontes. A música tem o condão dar asas a imaginação, de incrementar a memória com associações e imagens mentais. 

Ao escrever o último post, percebi que precisa ouvir algo novo e mostrar aos pequenos - meus filhos - que há muita diversidade musical e que a cultura enriquece o ser humano. Eles reclamaram no início, mas no final gostaram no programa diferente.

Fica a dica e trata-se de um programa para todas as idades, não só para adultos. 

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Audiência

Audiência s.f. (...) 3. Sessão de tribunal na qual se ouvem as partes, as testemunhas e julgam-se as causas.

(Dicionário Escolar da Língua Portuguesa. Academia Brasileira de Letras. 2ª. ed. São Paulo : Companhia Editora Nacional, 2008.)


Curioso como uma palavra faz parte de nosso cotidiano e de repente, num dia qualquer sem mais nem menos, esta palavra revela-se com todo seu sentido. Participar de audiências é da rotina do advogado. Na maioria das vezes, pouco se ouve, pouco se discute e pouco se concilia. Muitas audiências são inúteis e servem para cumprir uma exigência processual. Ontem foi diferente. 

Um sujeito, com deficiência visual, ajuizou uma ação reclamando danos morais por não ter conseguido assistir a um show musical como esperava. Durante quase meia hora, tentei convencer o autor da ação a fazer um acordo. Ele não aceitou e insistiu que tinha direito a ser indenizado pelo dano moral que lhe fora causado - ou pelo menos ele acha que sofreu um dano moral.

Saí com a clara sensação de que o autor é uma pessoa revoltada com sua deficiência, uma pessoa que tenta se aproveitar de sua condição, fazendo-se de vítima. Há tantos exemplos de superação e de força de vontade que levam seres humanos a realizar todo seu potencial independentemente de sua condição física ou financeira. São inúmeros os exemplos que inspiram e que provocam mudanças positivas nas pessoas de sua convivência. A lista seria infindável. Batalhas contra o câncer e outras doenças, pessoas que sofrem acidentes, deficientes com feitos heróicos nos esportes e na produção científica. Para estas pessoas, o obstáculo é parte do caminho, mas jamais uma barreira.

Mas o autor insistia que não havia conseguido VER o show de música. Ora, música não é para ser vista, mas ouvida, assim como uma audiência é uma sessão onde o juiz ouve as partes. Não há necessidade da visão para se realizar o ato, nem há necessidade da visão para apreciar integralmente a música.

Ao final de minhas tentativas frustradas para chegar a um acordo, concluí que o autor da ação não sabe o verdadeiro escopo da música, cuja beleza não é visual, mas sonora, e esta sonoridade é alimento intenso para o espírito. Pobre do sujeito que não compreendeu a essência desta arte.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Dias frios

Dias frios têm sido estes das recentes semanas que parecem até congelar a inspiração, escondida debaixo de cobertas bem quentinhas, sem querer sequer botar o nariz para fora. Não sei se é a inspiração que se esconde ou se são os dias mais curtos, o céu cinza, os rostos sisudos e quase cobertos por cachecóis, gorros e chapéus. Dias quase tétricos, onde a luz solar faz falta. Mas parece que este ano está mais frio. Ou o frio parece mais constante.

Parece. Sim, reforço a subjetividade da impressão, pois a memória em temas climáticos é falha e imediatista. 

Cheguei à conclusão que sou uma pessoa de clima tropical. Gosto do calor, gosto do sol, gosto dos dias longos. Gosto da luminosidade do inverno e do outono, mas prefiro o sol escaldante do verão e do conforto do ar condicionado. Prefiro as roupas mais vibrantes e coloridas ao tons neutros e soturno do inverno. Prefiro dormir com ventilador ligado a me enfiar embaixo de várias camadas de cobertores. Prefiro o frio só como destino de férias. E por curto espaço de tempo.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Barcelona dos cinco sentidos


Palau de la Música Catalana, Barcelona



Até um ano atrás a viagem exigia um escala com troca de aeronave, sendo que a primeira parte durava longas doze horas. Na parte final do voo, para coroar o longo trajeto, minha filha e algumas outras pessoas passaram mal gastando o estoque de saquinhos coletores de vômito do Airbus 340 da Lufthansa com destino a Munique. 

Em solo, o primeiro choque cultural. A passagem pela imigração foi tranquila e sem demoras. As instalações do moderno flughafen são amplas, com muita luz natural e arquitetura arrojada. A sensação de estarmos em outro mundo foi sentida de imediato, além da óbvia língua alemã com a qual não tenho a menor intimidade e cuja sonoridade lembra mais um longo desfiar de impropérios do que uma conversa amena.  No terminal de embarque exclusivo da Lufthansa, não faltavam cadeiras e conforto, nem houve aquela ridícula troca constante de portões de embarque patrocinada pela nossa Infraero em todos os aeroportos brasileiros. Havia jornais do dia distribuídos gratuitamente e uma máquina de café e chocolate quente sem que houvesse cobrança pelas bebidas. Tudo organizado, limpo, bem cuidado.

Desde pequeno, sou fascinado por voar. Adoro voar e adoro passar horas nos aeroportos, explorando, vendo os aviões, observando os passageiros. O trajeto até o destino é para mim uma experiência divertidíssima. Devo confessar, porém, que ultimamente viajar de avião deixou de ser prazeroso e se transformou num suplício, com as poltronas apertadas e pouco distantes, serviço de bordo sofrível e nenhum benefício adicional, como aqueles antigos kits de higiene pessoal que o passageiro recebia no voo internacional. Os tempos são outros e agora dê-se por satisfeito se o voo sair no horário.

Voltando à estrada principal após um pequeno – mas necessário – desvio, decolamos para Barcelona. Uma vista fantástica dos Alpes num dia ensolarado e de céu claro, com sol refletindo dos picos cobertos de neve, fez parte do trajeto. Um dos pequenos ficou maravilhado, enquanto a outra sofria ainda com os efeitos da náusea que lhe afligia.

Barcelona, capital da Catalunha, é uma cidade em constante transformação e ebulição. Disseram-me que vinte dias seria muito e que me cansaria, pois a cidade não oferece tanto assim. Discordo efusivamente e retornaria para mais vinte dias por lá sem pensar duas vezes, ou melhor, fugiria do inverno brasileiro para aproveitar o verão catalão.

Barcelona no verão é invadida por turistas de todos os cantos, principalmente europeus do leste em busca de praia e de um pedacinho do Mediterrâneo, que parece uma grande lagoa salgada, de águas calmas e quentes. A mistura de povos, visitantes e residentes, permite ao turista vivenciar e explorar a vida local naquele canto ao leste da Espanha sem destoar do cenário.

O calor é seco e não incomoda quem opta por caminhar a maior parte do dia. Gosto de explorar as cidades caminhando, observando, com liberdade para parar em lojas, livrarias, bares e restaurantes. Um guia de bolso é elemento indispensável em qualquer viagem, pois chama a atenção para locais que poderiam passar despercebidos. Um prédio histórico, uma praça onde determinado fato ocorreu, um restaurante onde Picasso costumava almoçar e encontrar com outros artistas, um mercado renovado e cujo telhado em formas curvas lembra um campo florido ao balançar do vento. Uma boa pesquisa do destino garante esta imersão completa. Sou daquelas pessoas que gosta de aproveitar o tempo degustando o local, extraindo de cada passeio elementos culturais que vão compor minha bagagem na volta, sorvendo o ambiente urbano que dá o tom característico e único de cada cidade, como uma marca d’água indelével.

A estética arquitetônica é instigante em Barcelona. O olhar fica irrequieto, varrendo o cenário sempre a se maravilhar com algo diferenciado e inovador, saltado da prancheta de um famoso arquiteto. A Igreja da Sagrada Família, os edifícios projetados por Gaudí, o Parque Güell, a Torre Agbar e tantos outros edifícios e construções que marcam Barcelona como um showroom vivo e concreto da arquitetura.

A visão, porém, não é o único sentido a ser agradado pela cidade. O paladar e o olfato também são muito bem tratados.  Nos pequenos bares e restaurantes, uma mistura de aroma de alho misturado com a fumaça de cigarro permeia o ar. Decidira que pararia de fumar nesta viagem e aquele cheiro de tabaco era um pequeno consolo para um – agora – ex-fumante. Os temperos e condimentos ressaltam o paladar dos produtos vindos do mar, verdadeiro banquete para quem gosta de pescados e frutos do mar. Servidos a la plancha, ou seja, cozidos na chapa com alho, cebola, sal e pimenta do reino, chegam fumegantes à mesa sem que o gosto seja mascarado pelos condimentos. E vale lembrar que os preços, com a crise na Europa, deixam qualquer boteco de São Paulo parecendo um roubo diante do preços praticados por lá. A Europa deixou de ter preços proibitivos e passou a ser um destino acessível.

Tapas podem ser encontradas em diversos locais da cidade e são um convite a pular de bar em bar. Saborosas, variadas e criativas, as tapas provocam novas sensações gustativas, brindando o paladar com uma explosão de sabores. Ciutat Comtal é um destes formidáveis lugares. Localizado na Rambla de Catalunya, 18, paralela da Passeig de Gràcia, charmosa avenida onde se localizam as lojas de grifes internacionais, o restaurante fica movimentado o dia todo até altas horas da noite, pois os catalães geralmente jantam após as 22 horas.

No Palau de la Música Catalana, a audição é o sentido premiado. Localizado no Bairro Gótico, próximo ao restaurante Els 4 Gats, frequentado por Picasso e pela classe artística de outrora, o grande templo musical foi construído entre 1905 e 1908 por Lluís Domènech i Montaner. No dia de minha visita, Paco de Lucía seria a estrela da noite. O mais renomado guitarrista espanhol, mestre do flamenco com sua batida peculiar que nos remete a imagens de castanholas e uma donzela a dançar com um vestido em negro e vermelho, faria a primeira de uma série de apresentações. Era a última noite em Barcelona e tive que me contentar com a aquisição de um CD duplo de um show que mais se assemelha a uma generosa antologia musical do artista.

A cidade espraia-se entre as montanhas e o mar e pode ser contemplada por inteira do alto de Montjuïc. Um forte utilizado com ponto de resistência durante a Guerra Civil Espanhola, agora convida o indivíduo a olhar pacificamente, a sonhar e a deixar a imaginação viajar. O vento que sopra acaricia o rosto como a pedir que o visitante não se vá, abraçando-o com afeto e convidando-o a voltar sempre. O tato é contemplado coroando o festival de sensações que uma verdadeira viagem deve proporcionar.

Seria Montjuïc o ponto final da viagem? Não, apenas uma pausa para sintetizar e arrumar na bagagem da memória tudo que foi descoberto e tudo que se enriqueceu nestes dias. Nestas linhas não coube tudo e nem poderia caber tudo. Os sentidos agraciados com a fantástica Barcelona nada mais são do que uma forma de enlevar o espírito e nutrir a memória com uma carga cultural renovadora e inolvidável.

(Convidado a escrever sobre viagens, nasceu este post sobre Barcelona, que visitei no ano passado. Mais sobre posts sobre o tema podem ser localizados nas tags Barcelona e viagem).