"Caminhou por Copacabana, parou para comer no bar do primeiro encontro com Lázaro, e passeou na beira da praia até o Forte, murmurando o nome de cada rua, reconhecendo um e outro boteco e restaurante. No caminho de volta foi abatida por uma tristeza atroz: não se lembrava de nenhum amigo. Depois pensou: desconheço a amizade."
(Milton Hatoum. "Barbara no inverno" in A Cidade Ilhada. São Paulo : Companhia das Letras, 2009, p. 87)
O conto de Milton Hatoum é trágico e carrega traços machadianos. O ciúme é retomado e foi o tema central de Dom Casmurro a permear todo o enredo. Pinço um trecho do final do conto, em que Bárbara retorna ao Rio de Janeiro depois de um período de exílio na França. Percebi que muita coisa pode ser extraído deste curto trecho.
Caminhar à beira do mar, mesmo numa orla movimentada, pode ser altamente contemplativo. É possível isolar-se de tudo que nos cerca. É um caminhar solitário e imerso no próprio "eu". A solidão não exige que estejamos fisicamente sozinhos, e talvez a solidão mais cruel é aquela que se manifesta quando estamos cercados de pessoas à nossa volta, mas nos tornamos invisíveis. Ninguém nos vê. Olham-nos, mas não nos veem, não conseguem penetrar no interior pessoal de cada um.
Contemplar não é olhar somente o exterior. A contemplação mais difícil é a interior, e para tanto, basta um cenário que nos convide a contemplação, que desperte aquela voz interior que é calada pelo burburinho exterior.
A amizade, desconhecida por Bárbara, muitas vezes nos surpreende. Na maior parte das vezes, é a amizade que nos proporciona os melhores e mais surpreendentes momentos da vida, que incendia a chama quase extinta, mas que volta a iluminar ao redor com novo vigor. Há poucas vezes – mais doloridas e marcantes – em que a amizade falha. Mas nestes casos, não era amizade, mas mera convivência que se reduz ao utilitarismo.
2 comentários:
Ótimo... Amei.
Ótimo... Amei...
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