segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Revoada Carnavalesca



Tarde quente e preguiçosa, em que o tempo parecia se alongar de modo elástico, distorcido pelo calor intenso, sol escaldante no céu anil. Até o ruído do vento estava ausente, certamente repousando debaixo de uma sombra. Eu, por minha vez, flertava com uma sesta, refestelado na rede confortavelmente instalada na varanda.



Começo a desconfiar que devo ter algum traço de sangue índio originário de algum ascendente português que aqui aportou em séculos distantes. Talvez um gene que passou por terras do norte do país antes de finalmente se aquietar em terras paulistas. Jorge Amado, João Ubaldo Ribeiro, Josué Montello, autores que não deixam de retratar traços regionais típicos, conduzem seus protagonistas a uma boa rede. Curiosamente, os três nomes começam com a letra J, que muito lembra um gancho sobre o qual se apóia a rede. Mas estou divagando demais e fugindo do assunto.


Dou-me muito bem com uma rede. Adormeço facilmente, e apesar de urbano, desconfio que esta minha facilidade em lidar com uma boa rede deve ser fruto de algum gene introduzido na minha constituição genética por algum antepassado.


Bem, voltemos à rede, ao calor, ao silêncio. Numa tarde de carnaval, observei uma enormidade de borboletas a desfilar. Algumas pequeninas, de leve tom amarelado, bailando pelas floreiras ao redor da varanda, imitando a comissão de frente e convidando a olhar atentamente o que viria. Outras mais alaranjadas com as bordas das asas pretas, uma ala imponente fazendo sua evolução. Uma ou duas maiores com um azul vivo nas asas e que se mostravam quando pousavam nalguma flor, como porta-bandeiras de uma escola de samba. Uma revoada de borboletas para abrilhantar o carnaval.


A natureza dava um espetáculo carnavalesco de cor e vida. Quantas vezes isto já havia acontecido antes, nos tempos de criança, e sequer tinha notado? Tantos carnavais passei neste mesmo lugar e o desfile gratuito havia passado despercebido. Demorei a reparar, mas ainda há tempo. Sempre há tempo para se observar e deixar-se ficar maravilhado com o singelo. A maturidade traz estes presentes. Basta olhar com atenção.

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