"Desde cedo, devíamos ter aulas de paciência. Paciência para com a vida, para com o corpo, para conosco, para com os amigos, para com os desconhecidos, para com os colegas, para com os pais, para com os filhos, para com os irmãos, para com os mestres, para com os nossos algozes, sem esperar que os cabelos grisalhos afinal nos venham dizer que é preciso suportar de ânimo sereno os infortúnios e os contratempos.
Um velho amigo, Victor Hasson, costumave me dizer, segurando na ponta dos dedos um imenso charuto:
- É a vida que nos amansa.
E avermelhava-lhe a brasa, soprando-a com delicadeza.
O certo é que, por entre advertências e experiências, acabei por firmar no meu espírito, para uso exclusivo, aquilo a que chamei de teoria do saldo. Na hora do infortúnio ou do contratempo, convém verificar, de pronto, o que foi que nos sobrou. Há sempre um saldo em nosso favor. E é para esse saldo que devemos voltar nossa atenção reconhecida. Se sofremos um acidente e estamos vivos, a vida é o saldo. Porque sempre há um saldo. A sabedoria consiste em dar com ele, para agradecer a Deus o que nos restou.
E isso, que aprendi à minha própria custa, deveria ser ensinado a meninos e meninas, na escola primária."
(Josué Montello. Diário do Entardecer. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1991, p. 215)
Trecho escrito em 2 de maio de 1969 em um dos volumes dos Diários de Josué Montello. Sábias palavras de um homem que passou pela vida e refletiu sobre ela. Há um caráter otimista e cheio de esperança nestas palavras, algo muito adequado para um ano que se inicia e para aqueles que se deparam com dificuldades, contrariedades e abismados com notícias das tragédias que assolaram o Haiti e tantas cidades brasileiras.
Não somos pacientes conosco. É da índole humana querer as coisas de forma mais rápida, quase imediatista. O passar do tempo nos revela que é preciso ter paciência. Paciência não significa imobilismo, inércia, mas saber que a vida tem um fluxo, um ritmo e caminha no ritmo próprio. Há dias com surpresas fantásticas; há dias com notícias tristes; há dias desagradáveis, e há dias felizes. O que importa, porém, é chegar ao final do dia e ter a certeza de que o novo dia que virá, trará novas expectativas e esperança.
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