A saudade lhe pesava como asas de chumbo num passarinho,
cravado no chão, tolhido de todo o direito de voar, de fugir do caminhar rotineiro.
Achava que a saudade havia sido curada com o tempo, mas num momento avassalador,
fora tomada de um peso enorme, maior do que ela. Não tinha saudade do passado,
tinha saudade do futuro, daquilo que nunca seria, e esta é a saudade que mais
machuca. A saudade do passado parece tão bela e lírica quando passeia num fado cantado
por uma voz afinada em alguma tasca de Lisboa, ou no Porto, ou qualquer recanto
onde se serve um bom vinho português e assa-se o bacalhau. A saudade do que
poderia ter sido, daquilo que ela achava que deveria ser, mas nunca foi e que
nunca será, exatamente esta saudade que lhe invadira a alma naquela manhã.
Ela sabia a causa de tudo isto e aquilo lhe incomodava. Como
poderia ainda sentir algo por ele depois de tantos meses, vinte e nove para ser
exata, pensou sem se levantar da cama. Aquele sonho viera em péssima hora,
adentrara seu sono tranquilo, um ladrão na calada da noite, e sua paz fora
roubada. Não que a paz fosse profunda e sincera, mas ela se enganava achando
que havia conquistado a paz de coração finalmente. E alguma vez o coração fica
em paz?, perguntou-se. Virou para o lado e viu que o relógio marcava 7:45. Já estava
atrasada, mas que importava, quem se importaria com seu atraso, com a ausência
de seu sorriso, com a aparência de que tudo estava bem. Não conseguiu conter algumas
lágrimas que desenharam um traçado retilíneo em sua pele macia e sedosa. Apesar
dos anos, era uma mulher bonita, mas que se deixara aprisionar numa saudade
futura.