CADEIRA NA JANELA
Puxo a cadeira para bem perto da janela, onde possa observar
o movimento da rua. A sala escura com as luzes apagadas. Sinto-me esmagado pelo
mundo, sufocado por uma realidade que me visitou de forma repentina. Estava
inebriado, entorpecido por um olhar que me abraçava com um carinho jamais
sentido e toda vez me perguntavas a razão de te olhar em silêncio completo. As
lágrimas não vêm. Secaram ou hibernam na confusão de pensamentos, aguardando o
momento exato da erupção, do desmoronamento, da queda.
Avisto um carro laranja no posto de gasolina. O que isto
importa? Nada, mas distrai-me o olhar perdido. O que importa chorar na solidão
da noite? Ninguém me verá, ninguém saberá, ninguém se importará. Parece que o
mundo moderno afasta, isola-nos em cubículos, em caixas que costumamos chamar
de apartamentos. A dor alfineta meu
coração. Ouço tua voz com a entonação delicada e atenciosa a pronunciar meu
nome. O coração aperta mais uma vez. O
carro laranja ainda está no posto de gasolina. Um helicóptero sobrevoa a avenida.
O vizinho dá um grito de gol e comemora. Nem sei quem joga e também não me
importo. Ninguém se importa comigo, porque haveria de importar-me com jogadores
de futebol que ganham fortunas para brincar como crianças e correr atrás de uma
bola.
Não liguei o rádio. Nem o iPod. Nem o celular. Minha trilha
sonora é composta pelos ruídos da cidade que inicia seu recolhimento noturno,
cansada, em câmara lenta a cidade se aquieta. Agora há um carro verde no posto
de gasolina. Reclino a cabeça apoiando-a no encosto da cadeira. Fecho os olhos
e respiro fundo. A pressão sobre meu peito rouba-me o ar. Respiro lenta e
profundamente. Se eu tiver um enfarte agora, ninguém se importará. Se eu morrer
agora, ninguém se importará. Se hoje fosse meu aniversário, ninguém se
importaria. Se a felicidade existisse, ela também não se importaria comigo.
Será que Deus se importa? Será que ele existe? Ou será que ele também já
desistiu de mim?
O carro verde deixa o posto e uma viatura de polícia para
diante da loja de conveniência. Não há mais nenhum carro no posto. A avenida,
quase vazia. Não sinto fome, apesar da
hora e de não ter comido nada. Ela sentiria fome. Mas ela não está aqui. Estou só, como tantas e
tantas outras vezes. Os policiais conversam diante da viatura e comem um
lanche. Meu estômago ronca e pede alimento. Ignoro-o. Quem se importa em perder
tempo com alimentação num momento destes? Nova pontada no peito, agora, um
pouco mais forte. Respiro fundo. Tusso forte para aumentar a circulação
sanguínea. Disseram-me, uma vez, que isto ajudava. Não tenho a menor ideia se
funciona, mas começo a suar frio e percebo que o físico se rende ao
psicológico. Curvo-me com a dor. A respiração se torna difícil, a dor aumenta e
caio desfalecido no chão.
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