segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Uma face do Brasil


Poucos minutos depois de chegar em Sobradinho, lembrei-me de Graciliano Ramos. O táxi passou por uma escola pública, fez o retorno e virou numa avenida que tinha a aparência de via principal. Algumas quadras adiante e cheguei ao fórum. Prédio de dois andares, com boa aparência, nada novo, mas com boa conservação. Lugares novos sempre trazem consigo uma curiosidade, uma expectativa. Entrei, fui dispensado de passar pela revista e pelo detector de metais, e caminhei pelo corredor central do fórum. E Graciliano Ramos me acompanhava.

Nas cadeiras, mães com crianças de colo, idosas, alguns poucos casais. Todos tinham algo em comum: buscavam algum direito ou batiam às portas da justiça para fazer valer sua cidadania. Uma vara exclusiva para tratar de violência doméstica. Não consigo presenciar tais cenas e permanecer indiferente.

Desde que comecei a escrever, percebi a importância de observar, de ficar atento ao drama humano que nos cerca, que poderia passar despercebido, afinal estava ali a trabalho e tantas e tantas vezes já fui em fóruns em diversos recantos do país. Sobradinho tinha uma aura triste, uma cidade refém, um pequeno distrito de periferia como tantas outras. Ser cidade satélite de Brasília parece ter relegado Sobradinho à sina de cidade dormitório, sem perspectivas, com pouca atividade, com poucos recursos. A ideia de cidades satélite parece ser uma forma de esconder a pobreza, algo que sempre vi como contraditório na concepção da Brasília de Oscar Niemeyer, um comunista que não conseguiu manifestar seu ideário nas suas obras e projetos. Por que esconder a pobreza?

Sentei-me numa das cadeiras e fiquei a observar rostos, ouvir conversas entrecortadas, xingamentos a companheiros que fugiram e deixaram de pagar pensão, crianças sem amparo, idosos esquecidos pelo Estado que lhes deveria garantir tratamento digno de saúde. Lembrei-me de Graciliano Ramos.

Graciliano Ramos foi um escritor brasileiro engajado, comprometido com a causa social. Ainda que não  compartilhe de sua visão política, admiro sua percepção do drama humano tão presente em suas narrativas, tais como Vidas Secas e São Bernardo. Li esta última obra pela primeira vez no ensino médio - e para variar -, discordei da maioria dos meus colegas que odiaram o livro. Gostei muito do estilo de Graciliano e da estória. O drama humano retratado sem cortes, com tons fortes e pinceladas precisas. 

Ninguém vai a Sobradinho para fazer turismo; ninguém vai a Sobradinho a passeio. Fiquei com a impressão de que seus moradores sonham em sair de Sobradinho um dia, para nunca mais voltar.

domingo, 11 de agosto de 2013

Dia dos Pais


- Pai, posso ler uma história para você?

A pergunta foi lançada por meu filho, logo após tomar banho e enquanto aguardava o horário do jantar. Havíamos chegado ao hotel fazenda naquela tarde, estava cansado da viagem e queria usar o tempo para iniciar um novo livro que levara comigo. A resposta negativa foi a primeira que me veio, porém, quando comecei a responder negativamente, algo me fez mudar de ideia. Rapidamente a resposta foi transmudada em positiva quando saiu pela minha boca.

De posse de seu livro, leitura obrigatória de férias, ele pôs-se a ler sentado na varanda do chalé. O livro era divertido e a percebi o prazer na leitura na entonação dada. Que história é essa, de Flavio de Souza (Companhia das Letras), narra histórias conhecidas, contos de fada, mas explica para o leitor como há versões para as histórias e como elas se transformaram ao longo do tempo.

Minha filha, que também sentou-se para ouvir o irmão ler, abraçou a discussão, pois estava lendo As Aventuras de Pinóquio, de Carlo Collodi (Cosac Naify). Nossa pequena tertúlia literária tratou de como os livros são mais ricos do que as adaptações cinematográficas, de como os contos de fada são adaptados de acordo com a cultura local e por aí fomos. 

Observava mais do que falava, apenas provocando e instigando a discussão. A conversa era prazerosa e fiquei feliz de ter respondido positivamente. Este era um daqueles momentos de interação pais e filhos que permanecerão guardados na memória com orgulho de notar o crescimento das crianças. 

Percebi - e percebo isto a cada dia com mais clareza - que ser pai é um ato de servir. A paternidade, com toda a sua beleza e riqueza, com todas as dores e conflitos, com todas as suas frustrações e momentos de rigor, resume-se na generosidade de servir. Há um quê transcendental neste esforço - por vezes silencioso e despercebido -, e a cada gesto amealhamos mais uma moeda no tesouro celeste. 

A riqueza de ser pai está no sacrifício que nos torna  pessoas melhores e na recompensa de servir com amor incondicional os filhos que nos foram confiados. 

Um feliz dia dos pais a todos!