sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Crônica: Resolução de Ano Novo



RESOLUÇÃO DE ANO NOVO


Cumpriu sua resolução de ano novo e parou de fumar no ano que se foi.  Não era muito simpático a estas resoluções, nem tampouco anotava suas metas, pois geralmente não as atingia. Foi em janeiro, logo no começo do ano, que secretamente estipulou o início das férias para, de uma vez por todas,  sepultar o vício. Tentara outras vezes, mas sucumbiu.

Ele gostava de fumar. Eram momentos de pausa e reflexão, onde contemplava o espiral de fumaça dançando no ar e se desfazendo. Fumava por prazer mais do que por vício. O cigarro se transformara em companheiro, um amigo para os momentos solitários. No final dia, a escada de incêndio era um recanto hospitaleiro e convidativo, quase aconchegante, onde isolava-se do mundo para desfrutar daquele cigarrinho. Não era um fumante chato e implicante. Sentava na área de não fumantes nos restaurantes e trazia consigo aquele aroma típico de fumante, aquela nuvem invisível mas sensível ao olfato. Era um fumante discreto.

Um colega de trabalho vivia insistindo:

- Você precisa largar este cigarro. Faz mal! – lançava a crítica com ar superior.

- Vou parar nas férias. – respondeu, notando a expressão de surpresa no rosto do colega chato.

- Mas... vai parar assim a seco? – indagou com desconfiança e duvidando da força de vontade do fumante.

Ele apenas sorriu. Tinha medo de que não conseguisse, de que sua força de vontade não fosse suficiente, de que a falta de acompanhamento médico e psicológico seriam fatais para seu fracasso, de que a dependência era maior do que imaginava, mas estava decidido.  E agora havia tornado público sua meta. Se fracassasse, seria mais um fumante objeto de piada.

Claro que sentiria falta do cigarro após o almoço, no final do expediente e na mesa do bar. Uma pausa para um cigarro e um café era um hábito arraigado na sua rotina. Iniciou sua empreitada mudando o rotineiro. Postergou o primeiro cigarro do dia. Deixou de fumar nos finais de semana.

Com uma nova proibição de fumar dentro de edifícios, tinha que descer para fumar no fumódromo. Praguejou no começo, mas depois a fraternidade entre os fumantes permitiu um novo rol de companhias. Combinavam os horários para fumar e conversar via MSN ou torpedos. Um novo entrosamento surgiu na recém criada confraria de fumantes da empresa. Gente que ele mal conhecia, e de repente, o vício as uniu. Não deixou, porém, que este grupo o impedisse de atingir seu propósito. Guardou segredo.

Na sexta-feira, véspera das férias, final de tarde, foi ao fumódromo e degustou lentamente seu último tubete de nicotina. O gosto era estranho, amargo, como se seu organismo contribuísse com a vontade de abandonar aquele cilindro de fumo. Na quarta tragada notou que o prazer havia desaparecido, que o gesto se tornara desajeitado, que o aroma o incomodava. Apagou o último cigarro na metade.


Quando voltou de férias, o chato nem reparou que ele havia parado de fumar. Alguns dias se passaram e veio a pergunta:

- Largou mesmo o cigarro?

Diante da resposta afirmativa e contundente, o colega fulminou:

- Cuidado, hein. Dizem que quem larga o cigarro engorda e na sua idade...

- Não tem problema. – respondeu certeiro. – Se engordar, eu volto a fumar para emagrecer.

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