sexta-feira, 13 de junho de 2025

Conto: Rabiscos mentais

 


Conto: Rabiscos mentais


Talvez eu goste de você mais do que deveria. Talvez nem deveria ter deixado me interessar por você, deveria ter me apegado a defeitos, a detalhes negativos, àqueles pontos que incomodam e desfazem qualquer encanto.

Acho que o cigarro era para ser um destes eventos para torcer o nariz. Lembro que você me disse que fumava com certo temor da minha reação, como se eu fosse torcer o nariz e fazer cara feia. Mas ouviu de mim que eu também fumei e gostava de fumar. Contive-me, mas quase emendei um “acho sexy fumar”. Engoli as palavras e calei-me. Naquele dia, após o almoço, enquanto caminhávamos pela rua, você acendeu um cigarro e eu fiquei apenas a observar. Enquanto te ouvia, minha imaginação viajava para um recanto distante, só nós dois a fumar e a brincar com as piruetas da fumaça do cigarro. Entrei numa realidade paralela somente perceptível a mim. Acho que fui discreto o suficiente para que não percebesses o que se passava nos recantos da mente.

Tentei fazer uma lista mental de pontos negativos, mas todos os quesitos eram positivos. Custei a achar algo que me incomodasse. Terminei com um conjunto vazio.  Acho que o sentimento turva o raciocínio, desfoca, neblina que cai espessa e impede a visibilidade clara. O coração parece saber navegar, mesmo com neblina intensa e sem qualquer visibilidade. Segue seguro e firme, ainda que por vezes pareça hesitar, sempre adiante, derrubando as barreiras e justificando cada atitude.

Havia leveza e alegria no ar e tudo causado pelo teu sorriso. Em tempos que se fala tanto em energia e conexão, parece que tudo se encaixou e a energia gerada era carbono free. Estávamos prontos para encarar a era das novas fontes energéticas? Brincadeiras a parte, o caminho ainda se revelaria longo e cheio de percalços, se é que existe caminho a trilhar. Caminhar sozinho pode ser tortuoso e queria que a jornada não fosse solitária.

 



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