terça-feira, 18 de fevereiro de 2020
Trechos: Das terras bárbaras, de Ricardo da Costa Aguiar
"Afinal, se um anjo tinha sucumbido ao peso do orgulho, da inveja e da cobiça, o que esperar de nós, carne fraca? O anjo caído era uma vítima que merecia minha compaixão, eu o reconhecia em mim. Estudante, mudei essa imagem do Mal, transmutei-o em uma bela figura filosófica. Passou a ser a ausência do Bem, como o escuro é a ausência da luz. Passou a ser o lado animal dos homens, pronto a sucumbir sob a razão e o espírito. O Mal era inerte, uma sombra adormecida que se afastava na presença de tudo o que é puro. foi no calor de Maruery que o conheci como de fato ele é, viscoso e grudento. Ali eu o vi de perto, fétido e deformado, rouco e irracional."
(Ricardo da Costa Aguiar, Das terras bárbaras, São Paulo : Tordesilhas, 2019, p.112-3)
O romance de estreia de Ricardo da Costa Aguiar foi uma grata surpresa. Texto requintado, trabalho cuidadoso nas citações de latim que se espalham pelo texto. Além de ser ótima leitura, o romance ainda nos incrementa a cultura.
O romance traz duas estórias em paralelo: um jovem diplomata e sua busca pelos antepassados e um jovem jesuíta que parte da metrópole para a colônia, e na colônia se depara com sua queda, causado ou não pelo anjo caído.
Chamou-me mais atenção os detalhes com que a narrativa retrata a viagem de Lisboa a Salvador, depois a vida na colônia, a capital Salvador no seu esplendor, a pequena São Vicente e a subida da Serra do Mar até Piratininga e Maruery (hoje Barueri, e que outrora foi uma grande aldeia indígena). O escritor desvela toda sua cultura histórica e ensina enquanto entretém o leitor com uma trama bem costurada.
No final, o livro se torna um pouco previsível, mas não tira o mérito da obra. Vale a leitura.
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