SONHEI CONTIGO
Sonhei com
você nesta noite. Assim começava o email dele, sem saudação inicial, sem um “oi”
ou “bom dia”, qual uma mensagem de texto
enviada pelo celular onde sabe-se exatamente quem é o destinatário e nomes são
omitidos. Ela leu a frase e notou que a mensagem sucinta seria um teste para
medir a rapidez na resposta dela, ele contando os minutos e atualizando o email
para ver se ela responderia logo com a indagação típica instigada pela
curiosidade: “o que você sonhou? Conte-me!” Ele dominava o discurso de um jeito
sutil e discreto, deixando que ela só percebesse que agia exatamente como ele
queria após já ter praticado o ato. Não era manipulador, mas um profundo observador
do agir feminino. A resposta era intuitiva, ou melhor, a pergunta era quase
automática, ele não poderia deixá-la em suspenso, deixando correr solta a
imaginação que já rascunhara um roteiro com os dois abraçados, aos beijos, talvez
enrolados na cama cobertos apenas por um lençol branco, numa cama grande com vários
travesseiros, a luz da manhã penetrando nas frestas da persiana delatando que o
sol já brilhava num domingo – ou de algum dia de semana em que haviam perdido o
horário e preferido se entregar um ao outro sem dar bola para o mundo ao redor.
Desta vez,
porém, ele a surpreendia. Dava um spoiler e contava tudo. Poucas linhas, mas
suficientes para narrar o que lhe havia mais cativado no sonho. Ela continuou
lendo e ele então passou a descrever um longo abraço, onde as palavras estavam
ausentes, mas os corações batiam ritmados, qual um dueto regido por um maestro
invisível, seus braços fechavam o arco onde ela permanecia envolta, cuidada, de olhos fechados, respiração serena, a pele
arrepiada e uma paz interior a tomar-lhe todo o ser. Em quatro linhas apenas,
ele a deixara com um largo sorriso desenhado, as bochechas levemente
ruborizadas e uma pequena lágrima a escorrer dos olhos marejados. A vida e seus
pequenos momentos de felicidade.