Seu beijo não tem a pressa dos amantes fugazes. É lento,
terno, pausado. Seu beijo tem gosto de uma manhã de sol, de um suculento
pêssego aveludado, de uma taça de vinho que parece ingênua, mas explode em mil
sabores na boca a arrepiar cada pelo do corpo.
Seu beijo explora com paciência e leveza, os lábios unidos e
a língua a bailar usando o palco do céu da boca, tudo coreografado e suave, sem
trancos, sem a voracidade dos jovens que parecem querer saltar a primeira
barreira de uma corrida para logo cruzar a linha de chegada em menos de 10
segundos, sem se deter o tempo
necessário no primeiro capítulo. Para ela, o beijo é um livro inteiro.
Não há pressa. Ela se detém, me conduz por lugares imaginários,
me acalma, me alegra, me seduz. Suas mãos passeiam pelos meus cabelos, meu
rosto, meus ombros, meu pescoço.
Seu beijo me enleva como ondas em dia de calmaria que
abraçam o corpo solto no azul do mar. Calmaria aparente, pois há ebulição de
sentimentos e desejos e quereres.
Seu beijo congela o tempo, a realidade, a vida. Sei que
estou vivo, sei que não sonho, sei que não fui abduzido, pois sinto meu coração
a dar cambalhotas no peito a cada malabarismo da língua no picadeiro.
Seu beijo provoca com a sutileza de uma leve brisa.
Seu beijo tem gosto de vida, tem gosto de quero bem, tem
gosto de carinho. Não há a intempestividade alucinante da vida moderna, mas a
calma de um entardecer no campo, a alegria de contemplar uma plantação de girassóis
em plena florada, a eternidade da penumbra de uma igreja vazia no meio da
tarde, a loquacidade do silêncio de dois corações que se encontram e não
precisam de palavras.
Seu beijo é venenoso.
Depois de inoculado pelo veneno do beijo dela, todos os dias
adormecia tendo o gosto do beijo dela como última lembrança a embalar seu sono.
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