Poderia ser um penico, daqueles de ágata branco e com borda
preta, igual ao que existia na casa de minha avó e em tantas casas de avós e
fazendas pelo interior do Brasil. Um penico que, depois que as crianças
cresciam, era usado para brincar na banheira para o desespero de minha avó que
achava inconcebível usar o penico como baldinho ou como pequena bacia para
derramar água sobre os cabelos. Penico
que perdeu seu uso com o tempo e virou objeto de decoração, com tom nostálgico
de um passado onde o tempo parecia ter outro ritmo, onde a interação das
pessoas era feita de forma direta, sem o intermédio de aplicativos e pequenos
aparelhos eletrônicos.
Poderia ser um penico só para você. Um penico para que você
despeje tudo que quiser, jogue todo o lixo, todo desabafo, todo o choro, toda a
raiva, todo e qualquer excremento que queira se livrar e lançar fora. Meus
ouvidos poderiam ser um penico e quem sabe, de tanto lixo, seria capaz de
perder a paciência com você, de me irritar e desencantar. Passaria a te evitar
e você descobriria que o amigo não existia.
Mas há um sério risco em ser penico, há o outro lado da
moeda. Lixo pode ser transformado em adubo e adubo pode servir para fertilizar
jardins e terra estéril. E da terra improdutiva, após fertilizada, podem nascer
flores e árvores para acolher pássaros a cantar. E o que era resíduo expurgado
por você, posso transformá-lo em flores e sorrisos. Há o risco do penico se
tornar belo e indispensável. E há riscos que vale a pena correr!
* * * *
NOTA: Quando escrevi este texto e fui procurar uma foto para ilustrá-lo, descobri que o google só retorna a busca para "pinico". Bem, fui ao dicionário com minha ortografia posta em xeque e confirmei que "pinico" não existe. A grafia certa é "penico". Então meu caro leitor, se passar por aqui, lembre-se que "pinico" não existe, ou melhor, só existe como uma forma forma popular de referir-se ao verbo "pinicar" (1. picar com o bico; 2. provocar comichão; 3. beliscar, cutucar).
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