A meia-entrada foi concebida como um instrumento de acesso à
cultura, permitindo que estudantes pagassem apenas metade do valor dos
ingressos de espetáculos teatrais, musicais, mostras e demais eventos. Como
muitas coisas neste país, algum espertalhão resolveu deturpar a boa ideia e
aplicou a mentalidade cartorial e nefasta que ainda vigora nos ambientes
estudantis brasileiros.
Algumas entidades estudantis avocaram para si a
exclusividade de outorgar o título de estudante a quem lhe pagasse uma taxa
para receber uma carteirinha, e assim poderia pagar meia-entrada.
Esta ideia foi ampliada para os idosos, para os alunos
cursos de pós-graduação, para alunos de curso técnico, professores de todos os
níveis, deficientes e por aí vai. Sou da opinião de que alguns fazem mais jus
ao benefício do que outros, mas é fato que a meia-entrada se transformou em
instrumento de abuso e aproveitamento indevido. É a famosa regra do “levar
vantagem em tudo”, só falta o Gérson e o cigarro Continental (para aqueles que
ainda lembram).
Nunca compactuei com esta excrescência e esta deturpação.
Quando era estudante universitário, só poderia pagar meia se tivesse a
carteirinha da UNE. Por questões ideológicas, preferi pagar inteira a dar um
centavo àqueles sujeitos da UNE, muitos deles hoje em cargos públicos.
O fato de tratar do assunto em nada se relaciona com a
discussão acerca da meia-entrada para jogos da Copa do Mundo. Acho um absurdo a imposição da FIFA e não
questiono a meia-entrada por causa da FIFA; questiono a meia-entrada como um
conceito que foi aplicado de forma exagerada e que, portanto, prejudica a
produção cultural e artística brasileira. A lei que deveria beneficiar a classe
artística, aumentando o número de pessoas com acesso a estes espetáculos, hoje
reduz o faturamento das produções que almejava incrementar. O tiro saiu pela
culatra porque deturparam a finalidade da lei.
Consumidores empunhando o Código de Defesa do Consumidor
revoltam-se contra quotas impostas por produtores. Órgãos de defesa do
consumidor impõem exigências aos produtores e empresários artísticos com
fiscalização rigorosa. Multas são aplicadas e reclamações deságuam nos Procons
espalhados pelo território brasileiro. Tudo isto acarreta o aumento dos preços
dos ingressos e faz com que certos eventos reduzam os pontos de venda para
verificar se o comprador de fato tem direito à meia-entrada.
Talvez o momento seja inoportuno, mas a classe artística
poderia aproveitar a polêmica causada pela imposição da FIFA e rediscutir esta
questão da meia-entrada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário