segunda-feira, 4 de abril de 2011

Lady Macbeth na versão russa

Depois de avançar lentamente pela última obra de Dostoiévski que li (Gente Pobre), hesitei em continuar minhas andanças pela literatura russa. Porém, restava apenas um livro dos que havia comprado na excelente Coleção Leste, da Editora 34. As traduções são primorosas e há sempre notas e posfácio, o que em muito auxilia o leitor novato.

O livro derradeiro era Lady Macbeth do Distrito de Mtzensk, de Nikolai Leskov, com tradução de Paulo Bezerra (São Paulo : Editora 34, 2009, 90 pg). Li o livro em uma semana e surpreendi-me com a narrativa ágil de Leskov, apesar do tom pesado e sombrio que ronda os eventos.

Leskov revisita Shakespeare com um toque peculiar russo. No posfácio, Paulo Bezerra explica que "a literatura como arte é um imenso diálogo que se processa em escala universal, e nesse diálogo cada literatura nacional acrescenta peculiaridades de sua história e de sua cultura a temas já representados em literaturas de outros países e em outras épocas, às vezes bem distantes. Assim, ao trazer para universo da literatura russa o tema do famoso drama de Shakespeare, Leskov recria em Catierina Lvovna traços bem semelhantes aos de Lady Macbeth, fazendo-o, porém, à luz da violenta história da Rússia." (p. 86)

Publicado inicialmente em 1865, a obra aborda a vontade humana e a determinação por se atingir um objetivo específico, ou se conquistar determinada posição ou alcançar o poder, ultrapassando e desconsiderando qualquer reflexão de ordem moral acerca da correção de sua conduta. A temática pode ser trivial, mas na mão de um mestre da escrita, o trivial ganha traços de grande obra e ganha notas de atemporalidade. 

Catierina Lvovna é esposa de um velho comerciante. A jovem, entendiada e sem filhos, transforma-se, com o passar da narrativa, de esposa submissa em uma fria assassina.

"Aquele que não quer dar ouvidos a semelhantes palavras, que não acalenta a ideia da morte nem mesmo nessa situação deplorável, mas a teme, esse precisa tentar abafar essas vozes ululantes com algo ainda mais horrendo que elas. Isso o homem simples compreende perfeitamente: então ele dá asas a toda a sua simplicidade animal, começa a fazer bobagens, a zombar de si mesmo, das pessoas, dos sentimentos. Já sem ser especialmente delicado, torna-se excepcionalmente mau." (p.77)

A maldade cria suas raízes no campo fértil de uma jovem e frustrada mulher; as raízes se espalham e contaminam todo o ser, sufocando o bem e deixando emergir uma mulher transformada - e transtornada.O tema é universal e atual, e a leitura desta excelente obra é muito prazerosa.


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Anteriormente já comentamos A Morte de Ivan Ilitch, de Tolstói em dois posts (Tempus breve est! e Um trecho de Tolstói). Outra obra de Tolstói que recomendamos é A Sonata a Kreutzer.

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