terça-feira, 10 de abril de 2012

A pedra no meio do caminho



Ele estava com a curiosidade aguçada e pediu minha ajuda para que lhe guiasse na livraria até o setor onde encontraria o bendito poema. Ficou desconfiado de que o curto poema sobre a pedra no meio do caminho era invenção minha. Vasculhamos todos os livros de Drummond no setor de poesia, mas infelizmente não encontramos um exemplar de Alguma Poesia, o primeiro livro do poeta.

Deparamo-nos com algo maior: uma obra inteira dedicada ao estudo do poema buscado. Uma Pedra no meio do caminho - Biografia de um poema, de Eucanaã Ferraz (Instituto Moreira Salles, 2010) é uma homenagem e o reconhecimento da genialidade do poeta. Genialidade que se manifesta na facilidade de dizer o simples, de escrever com leveza, de falar com todos e a todos.

Rafa sentou-se numa confortável poltrona da Livraria da Vila e leu o poema. Este pai não conteve a admiração de ver um menino de 8 anos de idade lendo poesia, e memorizando-a com uma única leitura, pois logo em seguida recitou o poema para a irmã. O pequeno leitor compreendeu apenas parte do que o poeta quis dizer - penso eu -, mas deixou-se levar pela escrita poética, pelo ritmo das palavras que dançam ao redor da pedra no meio do caminho.

Sempre haverá uma pedra no meio do caminho. Desistir é uma opção, mas apenas para os fracos. Pedras há de montes. Pequenas e grandes, diárias e semanais, cotidianas e esporádicas. Chamemo-las de pedras, espinhos, "abacaxis", "pepinos" ou qualquer outro nome. As contrariedades são diárias e constantes, algo inerente à vida. Não apenas na vida moderna e urbana, mas na vida. Quem mora na zona rural não tem água quente, alguns não têm energia elétrica e por aí podemos desfiar uma longa ladainha. Eles também têm pedras no meio do caminho.

Algumas pedras não são contornadas. Impedem a passagem. Algumas pedras são carregadas conosco ao longo dos anos e pesam, cansam, fatigam. 

É preciso ultrapassar a pedra, com paciência e perserverança, para poder olhar para trás e dizer com o poeta, saudoso e vitorioso por não ter desistido diante da pedra no meio do caminho:

No meio do caminho tinha uma pedra 
tinha uma pedra no meio do caminho 
tinha uma pedra 
no meio do caminho tinha uma pedra. 

 
Nunca me esquecerei desse acontecimento 
na vida de minhas retinas tão fatigadas. 
Nunca me esquecerei que no meio do caminho 
tinha uma pedra 
tinha uma pedra no meio do caminho 
no meio do caminho tinha uma pedra.


(Carlos Drummond de Andrade. Alguma Poesia, 1930)
 

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